Marcus Nakagawa
Os efeitos da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26), em Glasgow, na Escócia, foram sentidos em muitas empresas e organizações mundo afora. A importante reunião realizada no começo do mês de novembro sob o lema “Unindo o mundo para enfrentar as mudanças climáticas” acabou trazendo mais força para o movimento de Zero Carbon e para os investimentos ESG e de energia verde. Muitos outros temas avançaram, como o do mercado de carbono e a busca pelo fundo de “perdas e danos” para que os países desenvolvidos que mais emitem carbono “reembolsem” os países em desenvolvimento ou não desenvolvidos que estão sofrendo diretamente com esta emergência climática.
Um ponto importante foi a forte cobertura pelos veículos jornalísticos de todo o mundo, inclusive no Brasil, em alguns casos, com transmissão ao vivo de discursos e debates. Esta visibilidade apresentando todos os pontos de vista foi muito importante e acabou virando pauta em vários espaços empresariais, governamentais e na academia.
Porém, alguns ativistas colocaram que este foi o encontro do greenwashing. O termo cunhado para lavagem verde de produtos e serviços ganhou a conotação de mentira ambiental também para as promessas de alguns governos e empresas. Um dos argumentos é que as metas, muitas vezes estipuladas, não vinham em companhia de um estudo científico e um planejamento de ações de como estes números serão alcançados. Muitas ações sugeridas por alguns países acabaram não indo no cerne do problema, mas sim na periferia das questões críticas expostas. Fazer esta governança global com interesses diversos não é simples. Um bom exemplo é o da Índia e China que, juntas, pressionaram para que o discurso sobre a “diminuição” do uso de carvão e de outros combustíveis fosseis fosse mais aceito do que falar sobre acelerar a “eliminação” deste uso. Pode parecer uma questão semântica, mas, a Índia, por exemplo, argumentou que ainda precisa do carvão para diminuir a pobreza do seu país. Um tema bem alarmante neste momento pós-pandemia.
Esta governabilidade global também influenciou muito as corporações que estiveram em massa no encontro. Grandes empresas brasileiras e multinacionais enviaram seus CEOs e executivos da área para debater os posicionamentos e confirmar suas posições em relação ao aquecimento global. No Brasil, estas empresas mostraram suas metas particulares de emissão dos gases de efeito estufa por meio de anúncios em jornais, rádios e TVs. Além disso, os executivos postaram vários conteúdos interessantes em suas redes sociais diretamente de Glasgow. Uma atitude super relevante para que todos os stakeholders que precisam entrar nesta pauta comecem a entender ou, pelo menos, perceber a importância e urgência.
Estamos avançando nesta temática da sustentabilidade empresarial aqui no nosso país desde os anos 90 e acelerado com a vinda da onda ESG por meio dos investidores nestes últimos anos. Todavia, ainda temos que ser mais transparentes, princípio importante do tema da governança. Um estudo da PwC Brasil com o Instituto Brasileiro dos Auditores Independentes (Ibracon), denominado “Divulgações de ESG no Ibovespa” , analisou vários relatórios de sustentabilidade divulgados em 2020. No documento, a pesquisa mostra que 43% das empresas da Ibovespa não checaram seus dados de ESG nestes relatórios. Outro ponto do estudo foi mostrar que muitos dos dados acabam sendo questionáveis por não serem auditados por empresas independentes. Das 67 empresas que emitiram o relatório só 30% tinham auditorias terceiras e 27% foram assegurados por assessorias ou outros frameworks.
Outra pesquisa, lançada agora no final de novembro de 2021, mostra o avanço do ESG no país. O Grupo Report analisou as 187 empresas elegíveis para o índice de Sustentabilidade Empresarial da B3 (ISE B3), sendo que 110 publicaram o seu relatório sobre o ciclo 2020. E o mais preocupante é que 34 delas, ou seja, 32,4%, nunca elaboraram ou não divulgaram o seu relatório anual. E apenas 51,3% respondem ao CDP, a maior base de dados ambientais sobre empresas do mundo que possuem tópicos específicos como: mudanças climáticas, florestas e segurança hídrica.
O processo de aprendizagem das empresas para estas questões climáticas precisa acelerar. A COP26 mostrou que cada vez mais precisamos de transparência, dados, metas e planos para não cairmos em promessas vazias, o tal do greenwashing. Se conseguimos fazer todas estas análises profundas com as questões financeiras, por que não com as questões ambientais, sociais e de governança?
Sobre o autor: Marcus Nakagawa é professor da ESPM; coordenador do Centro ESPM de Desenvolvimento Socioambiental (CEDS); idealizador e conselheiro da Abraps e da Plataforma Dias Mais Sustentáveis; palestrante sobre sustentabilidade, empreendedorismo e estilo de vida. Autor dos livros: Marketing para Ambientes Disruptivos, Administração por Competências e 101 Dias com Ações Mais Sustentáveis para Mudar o Mundo (Prêmio Jabuti 2019).