Por Gianpaolo Dorigo, Professor do Anglo Vestibulares
A – Estratégias da ilusão
A esquerda é dotada de visão arguta, e costuma brandir as armas da crítica como ninguém, a ponto de o próprio ato de brandir as armas da crítica ser considerado por si só um gesto de esquerda. A direita muitas vezes evita o debate, mais interessada que está em usufruir do status quo, e dessa forma o pensamento crítico acaba sendo quase monopolizado pela esquerda. É aqui que pode surgir uma estranha forma de alheamento da realidade: certos grupos, por simples falta (ou muitas vezes) do diálogo tornam-se irremediavelmente descolados da realidade, debatendo, fechando-se e dando voltas em torno de si próprios. O resultado é a elaboração das estratégias da ilusão, diretrizes para a ação política completamente descoladas do mundo.
B – Parole, parole
Quando o discurso se faz na rua ou sobe o palanque (ou se manifesta em blogs), ele costuma deixar de ser preciso, e muitas vezes morre vítima do reducionismo mais sórdido e do maniqueísmo mais tolo. O fenômeno ocorre por toda parte, do totalitarismo à democracia formal. Sem amarrá-los no mesmo feixe, observo a instrumentalização do discurso nos dois sistemas.
C – Violência gera violência
Ao iniciar um ato de violência, a resposta imediata inevitavelmente será a violência. A descida rumo aos instintos mais primários resulta em uma infantilização brutal, que acaba se manifestando em discussões tão bizantinas quanto pueris sobre “Quem começou primeiro” [sic]. No dia em que o filho morre nos braços da mãe, faz-se necessário parar e pensar se a violência vale a pena. “Mas, esperem um pouco, no sistema em que vivemos, já há filhos morrendo e fome nos braços das mães !”. A saída me parece bem mais complexa do que quebrar vidraças.
D – Estratégias da ilusão II
O capitalismo estimula valores como competição, individualismo e lucro, bem como a realização do sucesso através da posse de objetos materiais, e do mais mágico de todos os objetos: o dinheiro. Nesse contexto, a corrupção é uma tentação permanente no sistema. Partindo dessa constatação e fazendo uma leitura rasa do materialismo marxista, muitos concluem: basta mudar a organização material da sociedade (sua ordem socioeconômica) que o universo de valores também irá mudar. O mecanicismo simplista por trás dessa concepção é evidente, e três ou quatro modalidades de organização socioeconômica alternativas praticadas a partir do século 20 provaram o tamanho do problema e a apontaram para a persistência da corrupção, sob novas roupagens. Referência: modelos soviético, chinês, albanês. Khmer ? Chavismo?
Volto às sociedades complexas. O bom Max Weber observava, argutamente, a criação de amplas estruturas burocráticas necessárias para efetivar a produção e a distribuição, bem como a administração de sociedades populosas e centros urbanos gigantescos. Privadas ou públicas. Oras, abolindo-se a atual organização socioeconômica e descartando-se os modelos históricos alternativos fracassados, alguém me diz como sobreviver como 7 bilhões de pessoas no planeta, sem as tais organizações burocráticas gigantescas, essas sim, corruptíveis na sua própria essência ?