Plano americano mostra novo caminho para retomada

Para a década que se seguiu à crise financeira de 2008/2009, muitos analistas apontavam que a política monetária se tornara a “única via possível”. Com os governos preocupados em reparar seus balanços patrimoniais enquanto as receitas de impostos desabavam depois da crise, sobrou para os bancos centrais a tarefa de tentar estimular a economia por meio de dinheiro barato e programas não convencionais de compra de ativos. O gigantesco pacote de estímulo aprovado nos EUA porá fim a esse regime. O alcance da mudança se estenderá para muito além das fronteiras dos EUA. 

As últimas previsões da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) são de que o programa de gastos do governo do presidente Joe Biden – que equivale a 8,5% da renda nacional dos EUA -, juntamente com a rápida implementação dos planos de vacinação, elevará a renda mundial em 1% neste ano. 

A organização estima que o PIB global se expandirá em 5,6% neste ano. A previsão anterior, de dezembro, apontava alta de 4,2%. 

Uma economia em expansão nos EUA significa que a demanda vai “se espalhar” para o resto do mundo, especialmente para seus vizinhos mais próximos (México e Canadá), assim como para as economias voltadas para a exportação no leste da Ásia e na Europa. 

Para as economias avançadas, as implicações de um crescimento mais rápido nos EUA são quase inteiramente positivas – ao aumentar o potencial de exportações e encorajar o sentimento de “disposição ao risco” que impulsiona o investimento. 

No entanto, um superaquecimento dos EUA – se a demanda maior por bens e serviços levar a restrições de capacidade e a uma inflação mais alta – poderia precipitar a elevação das taxas de juro em todo o mundo. Investidores apostam que o Fed (BC americano) ou será obrigado a aumentar as taxas de juro para deter a pressão inflacionária ou se sentirá à vontade para remover estímulos quando a economia retornar a algo próximo do pleno emprego. 

Os membros do conselho do Banco Central Europeu já estão preocupados com a possibilidade de que isso possa elevar o custo do crédito – o que reduziria a eficácia de suas iniciativas de estímulo em uma região onde a política monetária continua a ser de longe a maior forma de estímulo. 

Países mais pobres que enfrentam problemas para tomar crédito nas próprias moedas terão mais dificuldades para se ajustar. O aumento dos juros reverterá alguns dos fluxos de capital que têm financiado economias frágeis. 

Cargas mais altas da dívida do setor público significam que para muitos países pobres o aumento das taxas se fará sentir tanto por déficits governamentais quanto em conta corrente. O aumento dos preços das commodities – empurrado pelas iniciativas de estímulos da China e dos EUA – ajudará os exportadores, mas será um problema a mais para os importadores. 

Em última análise, porém, a combinação de políticas é um avanço com relação à dependência da política monetária do período pós-2008. Se a OCDE estiver certa sobre o impacto do programa de estímulo de Biden – e há boas razões para pensar que está -, uma economia americana mais forte ajudará a impulsionar a recuperação mundial. Isso seria ainda melhor se o mundo não tivesse mais que depender de apenas uma fonte de estímulo e outros países ricos fossem igualmente ambiciosos. 

https://valor.globo.com/mundo/noticia/2021/03/11/plano-americano-mostra-novo-caminho-para-retomada.ghtml

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