Resultados da Amazon e WPP evidenciam dilema das agências de publicidade

Amazon e o WPP anunciaram seus resultados do último trimestre. Enquanto o WPP comunicou que iria reduzir suas perspectivas de crescimento de receita, a Amazon mostrou forte crescimento de seus lucros com publicidade. 

A Amazon arrecadou US$ 12,06 bilhões em receita de serviços de publicidade antes mesmo do lançamento do Amazon Prime Video com anúncios, previsto para 2024. A receita de vendas de anúncios aumentou impressionantes 26% em relação ao mesmo trimestre de 2022 (US$ 9,548 bilhões) e 13% em relação ao trimestre de abril a junho de 2023 (US$ 10,683 bilhões). No período reportado, 8% das vendas líquidas totais da Amazon no trimestre vieram de anúncios. 

Já no WPP, a receita geral do terceiro trimestre, excluindo os custos de repasse, caiu 5% em relação ao ano anterior, ficando em US$ 3,4 bilhões. Segundo a empresa, em uma base comparável, que exclui variações cambiais, as vendas caíram 0,6%. A queda é explicada pela desaceleração da economia chinesa e pela redução do investimento de empresas de tecnologia em publicidade. 

Mas a Amazon não foi a única big tech a crescer em vendas com publicidade no trimestre. A Alphabet, dona do Google, e a Meta, dona do Instagram Facebook, também surpreenderam positivamente no período. A avaliação geral é de que, à medida que os investimentos no setor de publicidade retornem com a aceleração da economia americana, as big techs serão as grandes beneficiadas. 

Na outra ponta, as ações do WPP já caíram mais de um quinto neste ano, levando a especulações entre analistas de que a empresa poderia se tornar alvo de uma aquisição. As ações chegaram a cair 5% após o anúncio na quinta-feira, mas se recuperaram ao longo do dia. 

Rivais como a Interpublic S4 Capital também reduziram as previsões de faturamento neste ano alegando gastos menores dos clientes. 

O que explica o sobe e desce de big techs e agências 

A exemplo do que já acontece com os gigantes de mídia, o WPP e demais conglomerados de publicidade se veem diante de um desafio imenso: concorrer com as big techs ao mesmo tempo em que são altamente dependentes delas. 

Empresas de mídia tradicional como DisneyWarnerParamount Globo concorrem com Amazon, Google e Apple por assinantes no streaming, por publicidade e até na compra de conteúdo (filmes, séries e campeonatos esportivos), aumentando o preço para todos. Por outro lado, as empresas de mídia se veem obrigadas a gastar cada vez mais com as big techs que proveem as soluções de tecnologia para streaming e publicidade. 

O WPP e demais gigantes de publicidade não têm streaming, mas sofrem com a queda da verba na TV tradicional, historicamente a principal fonte de receita do setor. Além disso, as agências precisam investir cada vez mais em tecnologia para criar e gerir as campanhas. Porém, as gigantes de tecnologia também estão entre os principais clientes das grandes agências globais. 

O WPP já havia alertado no meio do ano que seus resultados deveriam cair com os cortes de investimentos de empresas de tecnologia. “Isso piorou um pouco à medida que o ano avançou”, disse Mark Read, CEO do WPP, em conferência com investidores na quinta. O executivo disse ainda que os gastos dos clientes de tecnologia caíram 13% no terceiro trimestre, apesar do crescente interesse pela IA. “Embora haja muitos lançamentos de produtos, não há muita atividade de marketing”, disse. 

Na semana passada, o WPP anunciou a fusão da Wunderman Thompson VMLY&R, criando a VML. A nova agência prevê cortar mais R$ 600 milhões por ano em 2025. 

IA e o desafio de investir em tecnologia 

A IA se tornou uma espécie de calcanhar de Aquiles do WPP e do setor de publicidade. Se por um lado a novidade não estimula investimentos em campanhas das big techs, por outro se tornou uma necessidade inescapável nas agências. O problema é que as tecnologias de IA são caras e demandam grandes bases de dados que somente as big techs detém. 

“Comparado com os concorrentes, a WPP tem dependido muito dos serviços criativos e tem sido lenta na criação de seus próprios produtos de tecnologia e análise de dados”, escreveu Matthew Bloxham, um analista sênior da Bloomberg Intelligence, em uma nota na quinta- feira. 

As agências são cada vez mais dependentes das gigantes de tecnologia, a exemplo dos grupos de mídia. Os cortes de custos com a VML, por exemplo, devem ser convertidos em investimentos de tecnologia. 

Na prática, a corrida de agências e da mídia tradicional rumo à digitalização virou um ótimo negócio para as big techs, já que elas são as principais vendedoras de tecnologia de nuvem, essencial para o streaming, mas também para as soluções de IA generativa e dados em geral usadas pelas agências. 

Ou seja, os conglomerados de mídia e os de publicidade se tornaram diferentes faces da mesma moeda. Ambos correm e gastam fortunas em tecnologia para se reinventarem antes que sejam devorados pelas insaciáveis big techs. Acuadas, empresas tradicionais também precisam lidar com o dilema de investir mais naquilo que os trouxe até aqui (conteúdo e criatividade) ou naquilo que os levará adiante (tecnologia). 

Quem não é empresa de mídia ou publicidade pode se confortar com o fato de ser uma oportunidade de “otimizar” os investimentos em publicidade, exigindo preços mais baixos das já pressionadas agências e grupos de mídia. Mas vale lembrar que a qualquer momento uma big tech também pode entrar no seu mercado. Então, é bom torcer para que uma das gigantes de tecnologia não se torne sua concorrente direta, ou ao menos que isso demore o máximo possível. 

https://valor.globo.com/opiniao/guilherme-ravache/coluna/resultados-da-amazon-e-wpp-evidenciam-dilema-das-agencias-de-publicidade.ghtml

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