Ser responsável por uma variedade de produtos – de ketchup a amaciante, passando por sorvete e material de limpeza – já é uma grande missão. Fazer esses produtos chegarem a mais de 200 mil pontos de venda em todo o Brasil, sem ruptura de estoque ou prazos mais longos do que o necessário, é um desafio ainda maior. Mas essa é apenas uma das muitas responsabilidades da Unilever, gigante multinacional que confia não só em alianças estratégicas, mas também no poder dos dados e da tecnologia para organizar sua distribuição em um país de dimensões continentais.
“A tecnologia mudou completamente a forma como entendemos e gerimos a distribuição, especialmente quando ela envolve parceiros. Antes da chegada do big data, era um desafio acessar e consolidar informações do pequeno varejo de forma integrada e eficiente”, ressalta Rafael Andreatta, diretor de Business Intelligence da Unilever no Brasil. Segundo o executivo, o cenário começou a mudar em 2019, quando a companhia passou a organizar um hub de dados próprio para otimizar o planejamento do negócio, inicialmente com foco no fluxo entre vendas e produção.
“Com a construção de um data lake e o aumento do conhecimento sobre big data, passamos a centralizar informações e realizar análises aprofundadas. Hoje, nossos times de vendas e os distribuidores têm acesso a um painel que apresenta indicadores-chave de desempenho”, explica o executivo da Unilever. Nesse painel, estão disponíveis dados como oportunidades de expansão de mix de produtos, sugestões de produtos adequados ao perfil de cada loja e até mesmo a classificação de pontos de venda por diferentes fatores, incluindo porte, perfil de consumo e potencial de mercado.
“É um trabalho bastante personalizado”, diz Andreatta, enfatizando ainda que distribuidores e atacadistas têm papéis diferentes na cadeia de distribuição da empresa – enquanto os primeiros possuem o papel de desenvolver uma categoria de produtos, os atacadistas têm a função de aumentar a capilaridade. “São formatos distintos de parcerias com atuações complementares para atender os diferentes tipos de varejo existentes no Brasil hoje”, afirma.
Colaboração
Para tal ecossistema funcionar, porém, foi necessário que todos os pontos da cadeia de distribuição – indústria, distribuidores e atacadistas, varejistas – até a chegada do produto na casa do consumidor ressignificassem suas relações, trocando dados e informações. “O varejo já compreendeu que algumas indústrias utilizam dados não só para otimizar suas operações, mas para desenvolver o mercado como um todo. A dinâmica tradicional entre fornecedor e comprador deu espaço para uma abordagem mais colaborativa, pautada por desenvolvimento de categorias e pela experiência do consumidor final”, reitera Andreatta.
Outro ponto importante nesse alinhamento é a presença de empresas capazes de munir a Unilever com dados que antes não estavam disponíveis – caso da Scanntech, plataforma de tecnologia que mensura a venda na boca do caixa em mais de 450 redes varejistas em todo o Brasil.
“A parceria com a Scanntech trouxe um avanço significativo na captura de dados. Agora, podemos analisar o que o varejo vende diretamente ao consumidor final, com uma cobertura estratégica robusta. É uma evolução tecnológica que nos permite não só acompanhar a performance em tempo real, mas também antecipar demandas e criar estratégias mais eficazes para o desenvolvimento do negócio”, diz o diretor de Business Intelligence da Unilever no Brasil.
E se inicialmente o uso de dados auxiliava a Unilever em estratégias de lançamentos de produtos mais eficientes, hoje o poder das informações permite que a multinacional responsável por marcas como Hellman’s, Omo, Knorr ou Kibon consiga ser mais assertiva em diferentes campos. Entre os exemplos citados por Andreatta, estão o planejamento de ciclo de inovações, baseadas nas preferências do consumidor, e também o sortimento de produtos em cada loja e até a ruptura de estoque.
“Hoje, a indústria consegue entender o histórico de grandes rupturas e planejar melhor o volume de produtos em cada loja, indo desde recomendar o espaço de uma gôndola, mudar a quantidade do pedido ou até mesmo redesenhar a cadeia para que ela aconteça de forma mais ágil, com pedidos fracionados”, diz o executivo. “Vale lembrar que a ruptura é a perda extrema, onde tanto indústria como varejo e consumidor perdem.”
Visão além do alcance
Um dos aspectos mais interessantes sobre o uso de dados, porém, é o fato de que, conforme o tempo passa, os modelos de compreensão do mercado se tornam cada vez mais poderosos. Para Rafael Andreatta, isso significa que a tecnologia só tem a auxiliar a Unilever. “Devemos ter uma abordagem cada vez mais preditiva nos próximos anos. Hoje já analisamos tendências e identificamos possíveis gargalos, mas o futuro promete um nível de precisão ainda maior”, afirma o executivo. Segundo ele, será possível prever com antecedência as flutuações na demanda, ajustando a cadeia de produção e distribuição de maneira proativa.
“Poderemos identificar a falta de um produto antes que isso ocorra, permitindo produção, distribuição e chegada ao varejo de forma muito mais ágil, garantindo a disponibilidade no ponto de venda antes que o consumidor sinta qualquer impacto”, projeta o diretor da Unilever. Na visão do executivo, novas tecnologias como a inteligência artificial devem transformar profundamente a experiência de compra dos consumidores, em jornadas mais fluidas e orgânicas.
Para chegar a esse futuro, porém, Andreatta ressalta que a colaboração entre varejo, indústria e intermediários no compartilhamento de dados é fundamental. “Só com uma visão end-to-end, da compra do consumidor até a produção da indústria, é que poderemos evoluir nossa gestão para criar acesso a ofertas personalizadas, com base em preferências e necessidades, mudando não só a experiência de compra, mas também a forma como os produtos chegarão a quem precisa”, finaliza.