Análise do Núcleo de Estudos e Negócios em Oriente Médio (NENOM) da ESPM Coordenador: Professor Gunther Rudzit
O Oriente Médio passou por profundas transformações estratégicas neste último ano, e, infelizmente, como sempre, devido a guerras. Para compreendermos o motivo de tanta mudança, é necessário entender que a região vivenciava a chamada Nova Guerra Fria, um embate por liderança regional entre Arábia Saudita e Irã. Com isto, se formaram duas alianças, e, consequentemente, os sauditas, com apoio americano, vinha se aproximando dos israelenses, já que ambos veem os iranianos como maior inimigo. Este é o contexto que levou aos Acordos de Abraão de 2020 entre Israel, Bahrein, Emirados Árabes Unidos, Marrocos e Sudão.
Quando estava para se concretizar o mesmo processo entre israelenses e sauditas, o Hamas fez o ataque terrorista de 07 de outubro de 2023, a fim de impedir esta aproximação. A participação de Teerã nesta ação é discutida até hoje, mas, como maior financiador do grupo, assim como do Hezbollah no Líbano e dos Houtis no Iêmen, ficou muito difícil afirmar que não era, no mínimo, co-responsável.
É por isto que efetivamente tivemos uma guerra regional, inclusive com a primeira vez iranianos e israelenses atacando seus territórios com mísseis balísticos. E o resultado foi o enfraquecimento do Irã.
E o efeito foi que Israel saiu fortalecido como nunca antes. O Irã construiu essa rede de aliados não estatais a fim de conseguir ameaçar os israelenses indiretamente, sem ter a necessidade de parecer como se estivesse agindo agressivamente. Por isto que Teerã armou o Hezbollah com aproximadamente 150mil foguetes e mísseis, o que, em caso de uma guerra, conseguiria sobrecarregar as famosas defesas antiaéreas israelenses. Mas, com os ataques bem planejados, as forças israelenses conseguiram eliminar a cúpula da organização, os comandantes das unidades de mísseis, e a maior parte do arsenal.
Da mesma forma aconteceu com os Houtis no Iêmen, que foram fortemente enfraquecidos e agora têm pouca capacidade de atacar o território de Israel.
E por fim, o Hamas saiu muito enfraquecido. Apesar de nas cenas de libertação dos reféns israelenses membros do grupo aparecerem uniformizados e bem armados, a capacidade operacional para realizar outro ataque em grande escala a Israel, está degradada por muito tempo.
Por fim, o Irã saiu mais enfraquecido não só por ter praticamente perdido seus aliados, como sua capacidade de construir mísseis foi severamente destruída, assim como foi humilhado por ter uma bateria antiaérea S-300 destruída bem no meio do seu território.
Contudo, esta vitória estratégica israelense teve um custo político alto. O governo saudita mudou de postura ao longo desta guerra, e, se antes Riad dizia que a normalização das relações com Israel estava somente postergadas, nos últimos meses de 2024 as críticas à guerra em Gaza foram crescendo. Por fim, o próprio príncipe Mohammad bin Salman, o sucessor e de fato governante do reino, chegou a dizer que a guerra era um genocídio, o que demonstra que as negociações foram definitivamente enterradas.
Agora é esperar para sabermos se o presidente Donald Trump conseguirá retomar as negociações como ele já disse que tentará. Por isto, a região do Oriente Médio passou por profundas mudanças estratégicas em 2024, mas a perspectiva é de que a instabilidade crônica continue afetando o mundo todo via preço do petróleo.
