Fábio Andrade e Roberto Uebel
No dia 25/11/2025 os Professores do Curso de Relações Internacionais Roberto Uebel e Fabio Andrade participaram do VI Encontro Nacional de Economia Política Internacional (VI ENEPI) – “Ruínas do Velho Mundo: Em Busca de uma Nova Ordem Mundial”.
Os professores apresentaram o artigo “O Nacionalismo Econômico está morto? Vida longa ao Nacionalismo Econômico: entre a fragmentação do multilateralismo e a nova política tarifária dos Estados Unidos”.
O artigo é a peça inicial de um projeto de pesquisa sobre a reconfiguração do Sistema Internacional, em especial, a reconfiguração do nacionalismo econômico no contexto da crise de legitimidade do sistema multilateral. Nesse primeiro trabalho, o principal objeto empírico observado é a resposta do comércio internacional da política tarifária implementada pelo governo Donald Trump em 2025.
As lentes teóricas utilizadas combinam três autores da Economia Política Internacional, Robert Gilpin, Susan Strange e Dani Rodrik. A partir de Gilpin são utilizados os conceitos de Nacionalismo Econômico e da Armadilha Hegemônica, a obra de Strange aporta a análise do poder estrutural e contribuição de Rodrik nos remete ao trilema da globalização.
A hipótese central sustenta que a utilização da retórica nacionalista pela potência hegemônica representou um ponto de inflexão na economia política internacional, deslocando o nacionalismo econômico de uma ferramenta de afirmação soberana dos países em desenvolvimento para um instrumento de poder das economias centrais.
Até o momento, o trabalho conclui que a política tarifária do segundo governo Trump apresenta três dimensões inter-relacionadas: (1) a tarifação estratégica de bens de alta tecnologia; (2) a substituição do multilateralismo por acordos bilaterais e minilaterais; e (3) a instrumentalização das tarifas como ferramenta de política externa e, por que não, de defesa. Tarifas e sanções tornam-se, assim, meios de coerção política, utilizados para punir adversários e recompensar aliados, reafirmando a primazia do poder estatal sobre o mercado global, ainda que conte com o apoio das big techs.
Essa recomposição do protecionismo ilustra o que Gilpin descreve como retorno do Estado ao centro da economia internacional. A hegemonia, longe de desaparecer, é reinterpretada à luz de uma nova estratégia de dominação seletiva. Sob essa ótica, o nacionalismo econômico é um mecanismo de gestão da desglobalização, que permite ao hegemon preservar sua primazia relativa enquanto reduz sua exposição aos riscos da interdependência. Trata-se de uma hegemonia defensiva, mas ainda assim estruturante, que redefine as fronteiras da ordem internacional.
No plano teórico, o fenômeno confirma as previsões de Strange acerca da crise de autoridade nas relações econômicas internacionais. À medida que os Estados Unidos se retiram do papel de árbitro imparcial, as instituições multilaterais perdem relevância normativa e operacional. O vácuo resultante é ocupado por um sistema de poderes estruturais concorrentes, no qual China, União Europeia e Índia buscam afirmar suas próprias esferas de influência e, em menor grau, a própria Rússia. Essa fragmentação multiplica regimes normativos e reduz a previsibilidade, substituindo a lógica de uma governança global por uma pluralidade de ordens parciais, isto é, o que chamamos de fragmentação da multipolaridade.
O nacionalismo econômico no contexto do governo Trump 2.0 expressa uma transformação qualitativa da hegemonia americana. Sob a ótica gilpiniana, ele evidencia a politização estrutural da economia mundial e o retorno do Estado como unidade analítica central. Na perspectiva de Strange, ilustra o deslocamento do poder estrutural das instituições para os Estados e a reconfiguração das esferas produtiva, financeira e cognitiva. Já à luz do trilema de Rodrik, revela o esgotamento da globalização e suas estruturas e a busca por novos arranjos entre soberania, democracia e integração.
O novo nacionalismo econômico, portanto, não é um fenômeno conjuntural, mas um marco da desglobalização seletiva que redefine os contornos da economia política internacional. Ele combina continuidade e ruptura: continuidade, porque preserva a centralidade dos Estados Unidos como núcleo de poder global; ruptura, porque destrói o arcabouço normativo que legitimava essa posição.
