Novas marcas para velhas conhecidas

O ano passado, em que todas as atenções estavam voltadas para a pandemia, foi fértil para a gestação de novas marcas. Os brasileiros, neste ano, começaram a ser apresentados a novos nomes de empresas velhas conhecidas. 

Na semana passada, a BR Distribuidora, de 50 anos, passou a se chamar Vibra. Em julho, a septuagenária Duratex apresentou o novo nome da holding, Dexco. Duratex continua como uma das marcas controladas, além de Hydra, Deca, Portinari e Duraflor, entre outras. 

Na Vibra, a marca BR, criada nos anos 1970 para os produtos da Petrobras, não desaparece. Vai continuar a batizar 8 mil postos de combustíveis. Da mesma maneira, as lojas de conveniência BR Mania. O nome Vibra vai aparecer mais em contatos institucionais com investidores, fornecedores e clientes. 

Adotar novos nomes para marcas conhecidas do consumidor final é uma aposta ousada. É o caso do tradicional McDonald’s, que no Brasil decidiu estampar nas fachadas de suas lanchonetes a marca Méqui, o modo brasileiro de pronunciar seu nome. O vice-presidente de marketing da rede no Brasil, João Branco, diz que os donos da marca, nos Estados Unidos, se surpreenderam com a decisão, tomada pela operação brasileira há dois anos, mas acabaram aceitando e gostaram dos resultados. 

Em Minas, a fachada virou Mequin, em Recife, Mecão. Mas o McDonald’s Brasil ressalta que não mudou de nome. A empresa responde à Arcos Dourados, masterfranqueada para a América Latina, e obedece aos padrões estabelecidos nos EUA. 

O Méqui já tem desdobramentos. Na internet se multiplicou em “méquizap”, “méqui sem fila”, “méqui delivery”. Deu origem também à “mequizice”, campanha que mostra consumidor misturando sorvete e batata frita e outros jeitos de consumir os produtos da companhia. “Estreitamos mais os laços afetivos das pessoas com a marca”, diz Eduardo Simon, responsável pela campanha quando CEO da DPZ&T. Simon, que recentemente formou a agência Galeria, lembra que foi preciso muita conversa entre agência e McDonald’s. 

No caso da transformação de BR em Vibra foi um ano e quatro meses de encontros virtuais entre a agência Tátil e o conselho da ex-subsidiária da Petrobras. 

“Tornei-me um encantador de conselhos”, brinca Fred Gelli, fundador da Tátil e criador da nova logomarca e do novo nome, junto com a agência Africa. Ele conta que só conheceu pessoalmente os diretores da antiga BR na quinta-feira da semana passada, dia da apresentação do novo nome para os funcionários e investidores. 

“Foram 250 nomes levantados a princípio e duas rodadas com os últimos cinco ou seis nomes finais, até chegarmos a Vibra”, lembra. 

“Gostamos muito do resultado”, diz Leonardo Burgos, diretor de marketing e desenvolvimento de negócios da Vibra. “Queremos nos distinguir da Petrobras, mas somos pai e filho, e vamos deixar claro que somos agora uma distribuidora de energia, não só dona de postos de combustíveis”. Em fevereiro, a companhia anunciou a compra de 70 na Targus, comercializadora de energia elétrica. 

No plano estratégico, que será anunciado na próxima semana pelo CEO da Vibra, Wilson Ferreira Júnior, ex-presidente da Eletrobras, a empresa sinalizará novos avanços na área de energia renovável, segundo Burgos. Gelli quer ajudar a empresa a avançar nesse campo. “A recepção foi muito boa”, lembra, “muitos funcionários faziam um V de Vibra com os dedos, coisa que ninguém tinha previsto”. 

“Todo o processo de mudança foi feito por vídeo conferência por causa da pandemia”, diz o designer, descendente dos primeiros desenhistas de móveis do Brasil, fundadores da Casa Gelli, em Petrópolis, Rio de Janeiro. 

Para ele, o processo de transformação na empresa foi bastante complexo, porque muita gente não queria abandonar a marca BR, com 50 anos de tradição. Agora uma sociedade anônima, a Vibra tem milhares de donos: 68 mil pessoas físicas e 2.600 investidores institucionais entre os acionistas, nenhum com mais de 10% das ações, segundo o último balanço. 

A nova marca mantém o BR discretamente no meio da palavra Vibra. “O BRA é importante”, sublinha Gelli, “não queremos perder a tradição, mas agora o protagonismo é das letras V e A”. Elas é que se combinam para formar o novo logotipo em zig-zag, como as linhas de um eletrocardiograma ou sismógrafo. 

O designer explica que era importante também passar para o novo nome uma característica humana e brasileira, que é a vibração. Esse aspecto é ressaltado em ritmo de samba no comercial de apresentação assinado pela Africa. 

Aaron Sutton, que coordenou dentro da agência tanto o processo de transformação da BR quanto o da Duratex, diz que gostou do novo nome Vibra: “Traz um tom de otimismo e esperança na modernidade para este momento que a gente vive”. 

No caso da Dexco, segundo ele, a mudança de nome vem no embalo do crescimento da empresa durante a pandemia. “Muita gente reformou a casa, mudou-se, a residência mudou de significado para muita gente e o setor de materiais de construção teve um boom”. 

“Havia muita confusão do que era a holding Duratex e do que era o produto de revestimento. A nova marca já nasce grande, como uma Ambev dos materiais de construção”, diz. 

Seu novo slogan é “Viver ambientes”, apresentando a nova empresa como fornecedora dos materiais necessários para a casa e apontando também para a preservação do meio ambiente. 

É outra constante no posicionamento das novas marcas, um dos pilares da sigla ESG, que norteia as empresas atualmente. E de Enviroment, meio ambiente, S de Social e G de governança. 

Dono da Tátil, criador o símbolo da Rio 2016, Gelli lembra que sua agência recusa projetos que considera descompromissados com o meio ambiente. 

Sua empresa é parceira internacional da Coca-Cola, no projeto “Zero Waste”, ou seja, um futuro sem resíduos. “Não podemos ser xiitas e querer uma pureza inexistente, prefiro ajudar as mudanças que queremos de dentro das empresas”, afirma Gelli. 

Futuro é o objetivo da nova marca da Odebrecht, Novonor. “Junção de Novo com Norte, no sentido de direção e da bússola, como explica o fundador e diretor de branding e estratégia da Keenwork, Luis Castellari, responsável pelo rebatismo da Odebrecht. 

Ele não teve tanto tempo quanto Gelli para criar a nova marca e o novo logo. Apenas quatro meses. “Foi bastante desafiador”, diz “e um dos processos mais sensíveis em que já trabalhei.” 

Castellari lembra que com o nome e a logomarca é preciso mudar a cultura da empresa, no processo de “rebranding”. E nem sempre dá certo. Ele lembra o caso da GAP, marca de roupas dos Estados Unidos, que foi obrigada a voltar atrás na mudança de seu logotipo em 2010, por causa da reação dos consumidores. 

Não podemos apagar o passado da empresa, porque ele está lá, mas queremos ressaltar uma nova fase, com destaque para a qualidade da nossa engenharia, comentou um porta-voz da Novonor que liderou o processo, junto com a agência Keenwork. 

Todas as subsidiárias da ex-Odebrecht receberam novas placas sem o sobrenome dos fundadores: como OEC, OR, Ocyan, OTP, Vexty e Horiens e Enseada. A família Odebrecht continua, entretanto, sendo a maior acionista. 

O lançamento da nova marca coincide com o fim do monitoramento do Departamento de Justiça americano, que estava desde 2017 com observadores dentro da Odebrecht e com o acerto de contas com a maioria dos credores. 

Outras empresas citadas na Operação Lava-Jato também mudaram de nome: OAS virou Metha; a Camargo Correia, Mover. Algo semelhante ao que ocorreu com grandes auditorias depois da crise do Lehman Brothers em 2008. Ernest Young passou a se apresentar como EY e a PricewaterhouseCoopers como PwC. 

A Arthur Andersen, outra das grandes auditorias americanas, abandonou seu nome em 2001, na crise da empresa Enron, de quem era auditora. Adotou o novo nome Accenture, depois da condenação da energética por fraudes. 

No Brasil, uma tentativa de mudar que não deu certo ocorreu em dezembro de 2000. Sob a justificativa de facilitar a internacionalização, Petrobras se transformaria em PetroBrax. Protestos de parlamentares, funcionários e populares fizeram a empresa voltar atrás. 

https://valor.globo.com/empresas/noticia/2021/08/27/novas-marcas-para-velhas-conhecidas.ghtml

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