Mudanças no comando do Financial Times

O “Financial Times”, o jornal que se tornou referência obrigatória para uma elite global, anunciou na terça-feira uma mudança na cúpula da redação. Sai Lionel Barber, editor nos últimos 14 anos. Entra Roula Khalaf, sua segunda no comando desde 2016. A mudança é algo mais que uma troca de nomes. Reflete uma tendência na imprensa mundial de referência – a presença de mulheres em postos de comando.
Barber assumiu a redação em 2005 em circunstâncias difíceis. Seu antecessor tentou ampliar o apelo do “FT”, como o jornal é conhecido. Introduziu uma página diária de esportes, ampliou a cobertura da política partidária e de assuntos gerais. Houve a percepção de que o “FT” tinha perdido o rumo, além de circulação e dinheiro. A empresa cortou uma quarta parte das despesas editoriais. Barber juntou as redações das versões impressa e internet e orientou o jornal para um futuro na internet.
O jornal tem mais de um milhão de assinantes, dos quais mais de 800 mil digitais. O “FT” depende cada vez menos da publicidade: 55% da receita vem dos leitores.
Roula Khalaf, que assume em janeiro, será a primeira mulher a editar um jornal onde até um tempo atrás a presença feminina era escassa. O autor destas linhas lembra que, quando trabalhava como correspondente no edifício do “FT” no fim dos anos 1970 e começo dos 1980, havia algumas mulheres jornalistas, mas não na cúpula da redação.
Roula Khalaf nasceu no Líbano, estudou nos Estados Unidos e trabalhou na revista “Forbes”. Seu perfil do corretor da bolsa Jordan Belfort foi levado ao cinema por Martin Scorsese no filme “O Lobo de Wall Street”.
No “FT” desde 1995, ela foi correspondente no norte da África e no Oriente Médio. Como segunda no comando da redação, ela orientou a área internacional, com mais de cem correspondentes. Durante a campanha do Brexit, foi dela a ideia de levar ao Reino Unido os principais correspondentes para sentir o pulso da população e a conclusão de todos eles, contrariando as pesquisas, foi que o sentimento era para sair. Ela também aumentou a diversidade da redação e o número de leitoras.
A nomeação reflete uma tendência: o comando feminino nas publicações mundiais de referência. O jornal londrino “The Guardian” tem uma mulher no leme, Katharine Viner; assim como “The Economist”, Zanny Minton Beddoes, e “El País”, Soledad Gallego-Diaz. “The New York Times” e “Le Monde” também tiveram a redação chefiada por mulheres – Jill Abramson e Natalie Nougayrède, respectivamente, que por uma incrível coincidência foram demitidas no mesmo dia.
A escolha de Roula Khalaf é ainda mais significativa por ter disputado o cargo com quatro homens de muito prestígio dentro do FT. Seu desafio será aumentar o crescimento digital principalmente nos EUA, tendo “The Wall Street Journal” e “The New York Times” como principais concorrentes.
O legado de Barber inclui a difícil transição da mudança de controle do jornal. Desde 1957 era propriedade da Pearson, então um conglomerado de empresas de primeira linha. Com o tempo, a atenção do grupo foi orientada para o negócio da educação, e o “FT” parecia um estranho no ninho. A Pearson manteve a independência da redação, mas nos últimos anos não fez os investimentos necessários. Em 2015, o jornal foi vendido por US$ 1,3 bilhão ao grupo editorial japonês Nikkei, interessado na experiência digital do “FT”.

https://valor.globo.com/empresas/noticia/2019/11/13/uma-mulher-no-comando-do-ft-biblia-da-elite-global.ghtml

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