Líderes do varejo desinflam, voltam ao básico e focam público tradicional para sobreviver

Embaladas pela alta no consumo em seus canais digitais durante a pandemia de Covid-19, grandes empresas do varejo no Brasil e no mundo aproveitaram seus bons resultados para expandir, adquirir outras empresas e marcas e investir mais em inovação. Assim, conseguiram ampliar o seu público e engordar os números de seus balanços.

O período que seguiu a pandemia, contudo, mostrou-se completamente desafiador, com guerra na Ucrânia afetando a oferta de commodities, esfriamento da economia chinesa, problemas na cadeia global de suprimentos, inflação elevada e alta nos juros. Nessa situação, as varejistas patinaram até entender que teriam que voltar ao modelo básico de negócio, o famoso “back to basics”, para sobreviver.

Esse resgate da essência de cada negócio é uma tendência global, mostrou uma pesquisa recente da consultoria internacional de lideranças Russell Reynolds Associates. O levantamento entrevistou 50 presidentes de líderes do varejo no mundo, como Electrolux, Nestlé, Diageo e Kimberly-Clark.

Apesar de as empresas continuarem investindo no digital, agora estão deixando a inovação para o segundo plano.

“Eu fiz um projeto com um cliente há pouco tempo no Brasil, que chegou e comentou comigo: ‘Eu quero um líder de tecnologia. Mas sabe aquele cara superestratégico, que pensa no futuro, que está antenado lá fora, que vê o que está acontecendo? Não quero ele. Eu quero um cara pé no chão, que vai na loja e faz ela funcionar'”, relatou à Folha Henrique Carneiro, sócio-diretor da Russell Reynolds.

Esse movimento de retorno ao tradicional pode ser notado nas novas estratégias divulgadas por líderes do varejo no Brasil.

Um dos casos mais exemplares é o da Casas Bahia. Em setembro, em meio a um período crítico de resultados ruins e forte queda nas ações, a empresa, que à época se chamava Via, decidiu retomar o antigo nome e o slogan —”Dedicação total a você”.

Pouco tempo depois, a empresa anunciou que se voltaria ao seu público tradicional e ao negócio que deu origem ao grupo, focando a venda de móveis, eletrodomésticos e eletroeletrônicos.

Várias outras categorias que estavam presentes no site da companhia —como artigos para festa, decoração, perfumaria e cosméticos, pet shop, alimentos e bebidas— deixaram de ser compradas e vendidas pela empresa. Elas continuam no site, mas apenas com a venda de terceiros, os “sellers”.

A companhia foi uma das que mais perdeu em valor de mercado na Bolsa desde o auge das varejistas na pandemia, segundo levantamento feito a pedido da Folha pelo consultor de informações de mercado Einar Rivero, em meio às desconfianças dos investidores com o setor atualmente.

As únicas empresas que não foram afetadas ou cresceram em valor de mercado no pós-pandemia são as marcas voltadas a um público com poder aquisitivo maior, já que a inflação e os juros altos quase não impactam o poder de compra desse tipo de consumidor.

Outro exemplo recente do retorno ao tradicional é a Tok&Stok. Há pouco mais de cinco anos a companhia implementou um plano de expansão, que poderia ter dado certo se não fosse a virada provocada pela Covid-19.

Com os eventos recentes que abalaram o setor, a rede de móveis e decoração viu seu endividamento crescer, os pedidos de despejo chegarem, o crédito acabar e a crise do varejo quase derrubar a empresa fundada em 1978.

Em junho, seus sócios fizeram um aporte de R$ 100 milhões e conseguiram renegociar R$ 350 milhões em dívidas bancárias. Dois meses depois, uma das fundadoras da companhia, Ghislaine, voltou à presidência da Tok&Sok, cargo que ocupara até 2017. “Agora, a gente quer trazer a empresa de volta”, disse ela recentemente em entrevista exclusiva à Folha.

Segundo a executiva, o DNA da Tok&Stok tem loja física com cenários prontos, coleções sazonais e parcerias com designers brasileiros e estrangeiros.

https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2023/11/lideres-do-varejo-desinflam-voltam-ao-basico-e-focam-publico-tradicional-para-sobreviver.shtml

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