Inflação dos cliques? Preço da publicidade dá um salto

Há uma escalada da inflação dos cliques nas buscas de palavras-chave na internet no país. Esse avanço eleva os gastos das empresas em publicidade digital e ganhou força especialmente após 2021. Isso tem chamado a atenção de varejistas, indústrias e empresas de serviços por afetar diferentes marcas e produtos de palavras pesquisadas na intermet. 

Em um mercado maduro como os Estados Unidos, o custo por clique no Google subia 18%, em média, no quarto trimestre, em relação a igual período de 2020. No Brasil, esse aumento chegou a 80% em dezembro, batendo em 100% na “Black Friday” e no Natal. 

Companhias dizem que essa pressão nos gastos vem do forte aumento da busca por espaço para ações publicitárias na internet, após o on-line atingir cerca de 12% das vendas do varejo brasileiro. O espaço publicitário “premium”, em redes sociais e em plataformas de busca, ficou menor. Em buscadores como Google e Yahoo, por exemplo, a área nobre é a primeira ou a segunda página da pesquisa feita pelo internauta. 

O maior volume de recursos de fundos de investimento em plataformas de comércio e o avanço dos “marketplaces” (shopping centers virtuais) asiáticos pesam nessa conta. A demanda por anúncios publicitários eleva os valores gastos em sites de busca, que vendem espaço em sistema de leilão, onde quem dá o maior preço por uma palavra-chave aparece primeiro na pesquisa do consumidor. 

A Raia Drogasil é uma das empresas que sentem a inflação digital. “Do quanto eu pagava em uma palavra e o quanto eu pago hoje, o preço subiu 30% na pandemia”, diz Vitor Bertoncini, diretor de marketing da rede de farmácias. “No leilão de palavras, quanto mais gente anuncia, mais vai ficando caro”, diz. “É diferente de uma lógica de ganho de escala das mídias tradicionais, onde quanto mais você investe mais tem descontos”. 

 “Empresas de comércio eletrônico e varejo de moda chinesas têm investido fortemente na região. Como são leilões, o custo é variável, mas tem subido”, diz Flavio Levi, diretor da Winclap na América Latina. Shopee, Aliexpress e Shein são algumas das maiores nesse segmento de moda. Além disso, a entrada de capital estrangeiro em plataformas on-line, como a Olist, e as ofertas de ações que fortaleceram o caixa de grupos, como o Mercado Livre, acabam mexendo com o mercado. 

Consultorias dizem que, ao longo de 2021, houve aumento, no mercado global, no custo por clique num ritmo superior à expansão no número de “clicadas” nos anúncios. 

O custo por clique é definido em leilões de palavras-chaves nos buscadores e é computado quando o consumidor clica no endereço apresentado. Aparecer com destaque depende de um cruzamento de dados como preço máximo oferecido e a qualidade dos anúncios. Não há tabela de preços padrão. 

Segundo relatório da agência e consultoria americana Tinuiti, enquanto o custo por clique pago pelas marcas subiu 18% no Google nos EUA, de outubro a dezembro de 2021 frente a mesmo período de 2020, o número de cliques cresceu 11%, levando a uma alta total de desembolsos de 30%. Isso vem afetando mercados maduros e emergentes. “É um resultado impressionante em comparação com as fortes bases do ano anterior. Antes da pandemia, o crescimento não ultrapassava 30% desde 2011”, escreveu a equipe. 

No Brasil, a velocidade é maior, mas trata-se de um mercado menos maduro. “Em dezembro, esse valor no Google estava cerca de 80% superior ao que víamos em janeiro, e chegando a 100% de aumento sobre o começo do ano se considerarmos datas fortes para o consumo, como Black Friday e o pré-Natal”, diz Aluysio Ferreira, gerente da LojaIntegrada, plataforma de serviços digitais. Procurado, o Google não comentou. 

Dados da empresa de pesquisas eMarketer mostram que essa pressão é maior no varejo mais fragmentado, de produtos para casa e moda. No terceiro trimestre de 2021, o custo por clique nos EUA subiu 41% no setor de beleza versus 2020, e no comércio de casa, jardim e animais de estimação, as altas foram de 33% e 27%, respectivamente. Em moda, o avanço foi de 24% e em eletrônicos, de 21%. 

Em 2021, esse gasto por clique foi de US$ 0,67, em média, no Google nos EUA, alta de 37% sobre 2020, segundo a AdStage. “Nesse cenário, temos orientado clientes a focar mais na retenção dos consumidores que formaram uma base interessante de compradores, e abandonar esse comportamento de ‘balde furado’. Porque você pode estar trazendo volume de pessoas, mas não necessariamente uma compra boa”, diz Ferreira. 

“Nossa orientação a clientes nesse cenário é buscar formas de ações de mídia direta, como o e-mail marketing, que ganhou uma nova vida desde que esses preços dispararam. Claro que Google e Face são muito estratégicos, mas achamos que o mercado deve reagir a esse aumento, buscando opções, e os preços podem cair um pouco em 2022”, afirma ele. 

Segundo a especialista em marketing Laura Reyes, em artigo publicado pela agência americana Pyxl, nos primeiros meses de pandemia, em 2020, os varejistas conseguiram trazer novos compradores que precisavam do on-line. Era um ambiente menos competitivo. Mas o jogo mudou. “As tendências de custo mudaram bastante no último ano e meio [..] provavelmente porque as lojas físicas foram reabertas”, o que voltou a elevar o ambiente de competição e os gastos. 

Marcelo Tripoli, fundador da agência de marketing digital Zmes, diz que “a transformação digital, especialmente na pandemia, gerou um aumento de demanda pela publicidade on-line, pressionando e, muitas vezes, inviabilizando o custo de aquisição de clientes (CAC)”. Segundo ele, “as empresas estão buscando consultorias para ajudar nisso, principalmente para equilibrar as vendas por mídia versus canais diretos como o WhatsApp”. 

Para mitigar a inflação da publicidade digital, a Raia Drogasil intensificou o contato direto com o consumidor em redes sociais e pelo próprio aplicativo. “O gestor pode encarar essa bronca e perder rentabilidade ou conversar diretamente com o consumidor”, diz Bertoncini. Outra estratégia é monitorar as plataformas on-line, de hora em hora, buscando formatos de mídia com melhores preços. 

A diversificação ajudou a rede de farmácias a reduzir o impacto do aumento nos preços por palavras, mantendo a verba de publicidade digital em plataformas como o Google. “Ainda assim é muito bom e rentável investir no Google”, diz o diretor da rede de farmácias. “É uma plataforma essencial para a estratégia de qualquer empresa que jogue no e-commerce”. 

Outro indicador que sobe é o custo por instalação (CPI) de aplicativos de comércio eletrônico. A empresa paga o CPI a cada download do seu “app”, ou seja, é o valor desembolsado para trazer novos usuários. No Brasil, CPI foi de US$ 2,39, em média, no primeiro trimestre de 2021, salto de 88% sobre 2020, segundo a AppsFlyer. 

“Os aplicativos desses setores tiveram um aumento de demanda muito grande durante a pandemia, o que eleva também a oferta e o custo de instalação”, diz Marlon Luft, diretor de marketing da AppsFlyer na América Latina. 

O diretor da AppsFlyer entende que o custo de campanhas on-line deve continuar subindo, acompanhando o avanço da audiência nestas plataformas. “O CPI no Brasil ainda é bem inferior ao de outros países como os EUA, onde chega a ser nove vezes maior”. 

Já sobre os custos por clique, há projeções de um crescimento menos acelerado nos preços. “Ainda tem gente com muito caixa, mas já vemos empresas repensando estratégias e investimento, desistindo de certas compras em leilões. São ajustes naturais de oferta e demanda”, diz Ferreira. 

Para especialistas, em ambientes com competição mais acirrada por espaço, as empresas são menos tolerantes a eventuais estratégias mais agressivas de rivais. Isso explicaria, dizem eles, o fato de o Magazine Luiza e a Via terem decidido se acionar, de forma mútua, na Justiça. Magazine acusa Via de haver comprado seu nome como palavra-chave para que o nome Via apareça em primeiro lugar mesmo se o consumidor digitar Magazine. E a Via faz a mesma coisa em relação ao Magazine, conforme publicou o Valor na semana passada. 

Na visão de Tripoli, um caminho para resolver impasses, de forma estrutural, seria a criação de um mecanismo que vincule a propriedade intelectual das marcas com a possibilidade de compra de palavra-chave. 

“As empresas investem anos em suas marcas e acabam pagando mais caro por elas com a compra de palavras pelos concorrentes”, o executivo. “O sistema de leilão acaba elevando os preços das palavras-chave dos próprios anunciantes”. 

O Google possui um mecanismo que bloqueia automaticamente o uso de palavras- chave de marcas registradas dentro do conteúdo dos anúncios de concorrentes. Mas a compra isolada de uma palavra-chave de um concorrente é liberada 

https://valor.globo.com/empresas/noticia/2022/02/03/inflacao-dos-cliques-entenda-como-ela-esta-afetando-o-gasto-das-empresas.ghtml

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