Os EUA e a China estão envolvidos em um exercício de confiança que poderá mostrar se as duas maiores economias do mundo conseguirão trabalhar juntas, compartilhando prioridades, apesar de suas profundas diferenças e uma tensa relação bilateral.
Washington e Pequim dividirão a presidência de um grupo de estudos do G-20 (das maiores economias do mundo) voltado aos riscos financeiros representados pelas mudanças climáticas. Trata-se de um passo cauteloso em uma área que oferece poucas recompensas.
Os dois países também discutem a possibilidade de realizar uma reunião de alto nível no Alasca, em uma tentativa de redefinir suas relações diplomáticas.
Segundo o jornal “South China Morning Post”, que revelou as negociações, a delegação chinesa pode ser liderada por Yang Jiechi, que costuma atuar como enviado especial do presidente Xi Jinping em questões internacionais. Ele seria acompanhado pelo ministro das Relações Exteriores, Wang Yi. A escolha dos dois diplomatas mais graduados da China, segundo o jornal, refletiria a importância que Pequim dá à reconstrução das relações com os EUA após a chegada do presidente Joe Biden ao poder.
“Os dois lados se aproximam gradualmente e tentam tornar a questão do clima uma via segura de comunicação”, diz John Podesta, fundador do centro de estudos Centro para o Progresso Americano, de Washington.
Os EUA veem a China como seu maior concorrente. Um novo documento estratégico do governo Biden classificou o país como o único rival potencialmente capaz de combinar poder econômico, diplomático, militar e tecnológico “a ponto de oferecer um desafio constante a um sistema internacional estável e aberto”.
A China vem tentando se livrar da dependência da tecnologia americana e deixar claro para o novo governo que não fará concessões envolvendo os direitos humanos e Taiwan, uma ilha autônoma e democrática que Pequim considera uma Província rebelde.
Mesmo assim, Pequim e o governo Biden vêm conversando sobre a urgência de enfrentar questões ligadas às mudanças climáticas e a necessidade de um trabalho conjunto nessa questão.
Em resposta a questionamentos, o Departamento de Estado citou as observações
feitas pelo secretário de Estado, Antony Blinken, na semana passada, dizendo que as relações dos EUA com a China devem ser “competitivas quando tiverem que ser, colaborativas quando puderem ser e antagônicas quando isso for necessário”. Porta- vozes do Departamento do Tesouro não quiseram comentar.
No domingo, o ministro Wang Yi descreveu as mudanças climáticas como uma causa comum que poderá ajudar a melhorar as relações entre os EUA e a China.
Recentemente, os EUA anunciaram seu retorno ao Acordo de Paris, embora ele seja criticado por ativistas do clima, que afirmam que os compromissos assumidos pelos países são insuficientes para limitar o aumento da temperatura mundial em 2oC – nível considerado crítico para evitar o pior cenário das mudanças climáticas.
Defensores do clima também se mostram preocupados com o compromisso de Pequim de combater as mudanças climáticas fora de seu território. Desde 2000, bancos concederam quase US$ 52 bilhões em empréstimos em apoio a projetos de exploração de carvão por meio da Iniciativa do Cinturão e da Rota (BRI, na sigla em inglês), segundo o Centro de Desenvolvimento de Políticas Globais da Universidade de Boston.
Em dezembro, pesquisadores do Ministério do Meio Ambiente da China e ativistas internacionais pediram critérios ambientais mais rígidos para os investimentos internacionais do governo chinês.
No mês passado, Pequim nomeou Xie Zhenhua, que atuou como embaixador do clima da China entre 2007 e 2018. Ele conhece o novo “czar” do clima dos EUA, John Kerry, das negociações que levaram ao Acordo de Paris.
Ao longo de 2020, Kerry, Xie e seus assessores se comunicaram regularmente, segundo pessoas a par do assunto, trocando ideias e sondando as posições um do outro, à medida que a possibilidade de uma vitória de Joe Biden na eleição americana ficava clara.
Desde então, os dois vêm mantendo contato direto, segundo disse o Ministério do Exterior da China no mês passado. Kerry elogiou Xie, classificando-o como um “defensor capaz”.
Não está claro quem os EUA nomearão como presidente adjunto do grupo de trabalho do G-20. Do lado da China, será Ma Jun, um veterano do Banco Mundial e ex-economista-chefe do Banco do Povo da China (o banco central chinês).
Ma, que confirmou sua nomeação em entrevista, disse que o Departamento do Tesouro dos EUA e o BC chinês propuseram – independentemente um do outro – a transformação do grupo de estudos em trabalho, que pode adotar recomendações concretas de políticas. O G-20 deverá aprovar a mudança, embora a agenda do grupo ainda não tenha sido estabelecida.