Com 4 gerações juntas, empresas buscam soluções

Pela primeira vez na história, quatro gerações dividem o mesmo ambiente de trabalho no mundo corporativo. E essa convivência nem sempre tem sido fácil. Ao mesmo tempo em que traz diversidade de ideias, essencial para o crescimento dos negócios, o choque de idades tem exigido que as empresas adotem estratégias e soluções para apaziguar o embate de culturas tão diferentes. De um lado, está o funcionário maduro, fiel e que prima pela estabilidade financeira e profissional. Do outro, jovens inquietos e empoderados, que buscam experiências nas relações pessoais e de trabalho, sem grande apego a compromissos.

Não conseguir o equilíbrio entre esses dois mundos pode resultar em prejuízos relevantes para as empresas. Um estudo feito pelas consultorias ASTD Workforce Development e VitalSmarts (hoje Aspectum) mostra que uma a cada três pessoas desperdiçam 5 horas ou mais por semana em conflitos entre colegas de diferentes gerações. Isso significa uma perda de 12% na produtividade do trabalho.

BABY BOOMER (1945 A 1964)

Surgiu após a Segunda Guerra Mundial. Acompanhou a evolução da TV. Costumam ficar anos numa mesma empresa, seguindo um plano de carreira. Gostam de acumular patrimônio, como compra de carro e casas.

GERAÇÃO X (DE 1965 A 1984)

Cresceu durante a Guerra Fria e foi a primeira a experimentar computadores, internet, celular e e-mail. Não ousa muito no trabalho e tem no aprendizado dos erros a forma de chegar ao sucesso.

GERAÇÃO Y (DE 1985 A 1999)

Cresceu em meio à era da informação e de avanços tecnológicos. Tem hábitos multitarefas, capacidade criativa e gosto por desafios. Precisa ser motivado e não hesita em trocar de emprego para ter novas experiências.

GERAÇÃO Z (DE 2000 A 2020)

É nativo digital. Nunca viu um mundo sem computadores, tablets e celulares. No trabalho, prefere ambientes com condições de igualdade. Busca propósito nas coisas, seja na empresa, seja em produtos para consumir.

A maior parte dos conflitos surge por causa da cultura de trabalho e das prioridades distintas entre os funcionários. A geração X, por exemplo, acredita na meritocracia e na hierarquia. As pessoas entraram no mercado de trabalho em busca do primeiro milhão e de reconhecimento. São motivadas pela lealdade e por metas e deadlines. Os millennials, ou Y, por outro lado, não gostam muito de hierarquia rígida, são mais informais e têm dificuldade de receber ordens. Já a geração Z, considerada nativa digital, tem dificuldade com interação presencial e é resistente à escuta ativa. Acreditam na ideia de experimentar várias profissões ao longo da vida.

Apesar de algumas empresas estarem avançadas na adoção de medidas para absorver os benefícios dessa diversidade de pensamentos, a maioria ainda parece perdida e em busca de mecanismos para superar o desafio. Muitas delas acabam se concentrando tanto em formas de retenção das gerações Y e Z que terminam reféns da situação, além de perder outros talentos.

“A maioria das empresas está perdida e não sabe como tratar esses conflitos. Os estímulos tradicionais não funcionam”, afirma o presidente da empresa de treinamento corporativo Revvo, Richard Uchoa. Segundo ele, o choque ocorre com os gestores e líderes que, muitas vezes, não sabem lidar com os jovens. “A entrega de um trabalho até o fim do dia, para o mais maduro, pode ser 18 horas, mas para os mais novos, pode ser 23 horas”, diz Uchoa.

Ele explica que esse tipo de conflito, por menor que seja, pode ser um motivo até de troca de emprego. A nova geração não tem apreço à posse e quer vivenciar experiências, o que se transforma num grande desafio para as empresas diminuírem a rotatividade. “Esse grupo é mais ligado ao propósito, não tem muita tolerância e se desestimula rapidamente.”

O diretor de Negócios Digitais da fabricante de equipamentos elétricos Weg, Carlos Bastos Grillo, diz que uma das estratégias da empresa é usar o Centro de Formação de Jovens para atrair talentos e moldá-los conforme as necessidades. Mas ele destaca que sempre há um pouco de conflito. As organizações têm padrões a serem seguidos. E, para alguns, há uma certa dificuldade de se adaptar a regras. “Nessa hora é preciso ter habilidade para flexibilizar alguns padrões.”

Dos 26 mil funcionários da Weg, 74% são da geração Y e Z, as mais jovens. Outros 25% são da geração X e 1%, baby boomers. Segundo o executivo, uma saída para amenizar o abismo entre as gerações tem sido incentivar o relacionamento entre elas. Uma forma encontrada pela empresa foi colocar profissionais seniores para trabalhar com startups, cuja visão de negócios é ágil e flexível. “A Weg cresce 20% ao ano e precisa sempre de gente nova. Então precisamos superar essa barreira.”

De acordo com o estudo das consultorias ASTD Workforce Development e VitalSmarts, os maiores conflitos ocorrem entre os baby boomers e millennials. E as maiores discussões estão relacionadas à rejeição de experiências passadas, falta de disciplina e foco, falta de respeito e resistência a mudanças ou falta de vontade de inovar. Mas também já se começa a perceber uma rixa entre a geração Y e Z. Não por acaso recentemente a geração Z apelidou a Y de “cringe”, que significa fora de moda, inadequado.

NOVAS POLÍTICAS PARA APROVEITAR A DIVERSIDADE

No banco Santander, essas duas gerações respondem por 65% dos 48 mil funcionários no País. O empregado mais jovem tem 19 anos e o mais velho, 74 anos. As características são muito diferentes e cabe às empresas saber contornar essa diversidade, diz a vice-presidente de pessoas da empresa, Elita Ariaz. Segundo ela, as pessoas têm vivido mais, estão produtivas por mais tempo e se aposentam mais tarde.

“Tentamos mostrar para os jovens que os mais velhos já passaram por várias crises e conseguiram encontrar caminhos para problemas complexos. As gerações Y e Z têm uma inquietude que traz um certo desconforto saudável. São questionadores e isso é muito rico”, explica Elita. A executiva afirma que a instituição tem começado agora as políticas para contornar esses conflitos. “Ainda não está pronto, mas estamos estudando programas de mentoria reversa, cursos e eventos para discutir o assunto.”

Como dependem muito dessa nova geração, as empresas apostam em treinamentos para ensinar as chamadas “soft skills”. “Nosso objetivo é abordar as novas habilidades e competências dos funcionários. As coisas foram tão disruptivas que forçaram todos a entenderem melhor isso”, diz o vice-presidente global de Gente e Cultura da empresa de serviços de tecnologia Stefanini, Rodrigo Pádua.

Ele explica que a empresa conta com uma plataforma de mentoria global e aberta para melhorar as habilidades das equipes. Os 30 mil colaboradores da Stefanini podem participar do programa, como mentor ou mentorado. O objetivo é fazer uma migração de um modelo antigo, de comando e controle, que não funciona mais, para um novo, com mais autonomia e responsabilidade. Segundo o executivo, numa empresa de tecnologia como a Stefanini, o “mindset” (mentalidade) não pode estar ligado à idade ou sexo. “Nossa ideia, desde o início, foi chamar todos para participar da transformação digital, por exemplo. Para isso, só era preciso aprender, desaprender e reaprender.”

Com as mudanças advindas da tecnologia, sobretudo após a pandemia, as empresas também estão tendo de reaprender e reorganizar suas estruturas. A área de tecnologia da informação, por exemplo, passou a ter métodos mais ágeis, o que exige mais colaboração e papéis menos rígidos. “São coisas que não tínhamos há cinco anos”, diz o diretor de Gente e Sustentabilidade da varejista Riachuelo, Mauro Mariz.

Segundo ele, a companhia tem procurado trabalhar com squads, um modelo organizacional que divide funcionários em grupos para desenvolver assuntos específicos. “Nesse esquema, procuramos incluir todas as gerações, pois a diversidade é necessária para atender aos anseios dos nossos clientes, que pertencem a várias gerações”, diz Mariz.

O executivo afirma que os estranhamentos acabam sendo naturais já que são pessoas completamente diferentes. “Com duas gerações, era mais fácil controlar a situação, pois cada um cedia um pouco. Agora, com quatro gerações, o meio termo não é uma solução. É preciso atender a todos.” A empresa tem procurado criar grupos de trabalho para discutir as diferenças. “Ao mesmo tempo, conseguimos ouvir as vozes dos trabalhadores.”

https://www.estadao.com.br/infograficos/economia,como-as-empresas-estao-lidando-com-a-diversidade-geracional,1251058

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