Os gigantes da tecnologia e da mídia estão partindo para a guerra, ao injetar bilhões de dólares em serviços de streaming concorrentes. A Apple e a Disney estão prestes a ingressar nesse mercado, desafiando participantes consagradas, como a Netflix e a Amazon.
No ano que vem, haverá ainda mais ingressantes. No meio da gritaria, os espectadores poderão lastimar o dia em que seus pacotes de TV convencional e a cabo foram “desamarrados”.
Os gastos são gigantescos. A Apple empenhou mais de US$ 6 bilhões em conteúdo original, incluindo filmes e séries como “The Morning Show”, estrelado por Jennifer Aniston, Reese Witherspoon e Steve Carell.
Nesta onerosa guinada em direção ao segmento de vídeo, a fabricante do iPhone se apressa para alcançar a Netflix, que já gasta US$ 15 bilhões ao ano em conteúdo, quantia que inclui os US$ 500 milhões que acaba de injetar em “Seinfeld”, seriado cômico que está há 30 anos no ar.
Alguns investidores estão preocupados. No setor há 12 anos, a Netflix conquistou uma fatia bastante impressionante da população mundial – mas ainda não gera fluxo de caixa livre positivo.
Agora a líder do mercado está perdendo parte de seu melhor conteúdo, num momento em que novas concorrentes, como a Disney, reservam suas produções para seus próprios serviços. Por outro lado, a Apple pode se dar ao luxo de gastar mais do que qualquer outra empresa e oferecer um preço vantajoso em relação às rivais: o serviço Apple TV Plus custa apenas US$ 4,99 ao mês. Todos nesse mercado estão sujeitos a perder rios de dinheiro.
A reação mais óbvia dos investidores veio para a AT&T. A gestora de fundos Elliott Management assumiu uma participação no grupo de telecomunicações e orientou-o a deixar de desperdiçar dinheiro em fusões e aquisições no vão esforço de rejuvenescer.
Incluída na aquisição da TimeWarner pela AT&T, por US$ 80 bilhões no ano passado, está a HBO, que lançará seu serviço de streaming no ano que vem.
Mas mesmo os céticos podem não estar preocupados o suficiente. O perigo não é apenas a possibilidade de os esforços concorrentes se neutralizarem mutuamente. É o de que os públicos mais jovens tenham interesse zero nas estrelas da década de 90, que os executivos ansiaram tanto em contratar.
Muitos espectadores mais jovens pouco ligam para conteúdo premium, seja ele qual for. Estão fixados, em vez disso, em clipes curtos de material feito em casa e consumido por meio de canais como YouTube, Snapchat e TikTok.
A Netflix ostenta 152 milhões de assinantes. No YouTube, uma única personalidade, PewDiePie, tem 101 milhões de assinantes que assistem a seu conteúdo barato e discutível.
Alguns acham que essa é uma moda passageira. Mesmo Evan Spiegel, executivo- chefe da Snap, dona do Snapchat, uma beneficiária do surto de crescimento de conteúdo gerado pelos usuários, está apostando em sua queda.
Spiegel disse recentemente que “parte do conteúdo que as pessoas estão consumindo hoje nas redes sociais poderá, na verdade, ser menos interessante do que mais conteúdo premium no futuro próximo”. Mas ele foi um dos que acharam que todos estaríamos usando óculos computadorizados hoje.
Com grau de miopia semelhante estava o Twitter, que adquiriu a Vine, uma líder de primeira hora na área de vídeos curtos, gerados por usuários, em 2012. Nas palavras pronunciadas, com emocionante entusiasmo, pelo então diretor financeiro Anthony Noto: “É uma experiência incrível… Realmente tem sucesso com uma faixa mais jovem da população. E não poderíamos estar mais felizes de ter essa marca, esse ativo e essa experiência do usuário em vídeo”.
Quatro anos após a aquisição, o Twitter fechou a Vine em um movimento de corte de custos.
Tudo isso beneficia a ByteDance, da China, dona da TikTok, e a Alphabet dos Estados Unidos, dona do YouTube. De fato, numa época em que quase todos estão correndo para oferecer o streaming pago, o YouTube cancelou seu próprio produto premium. As duas campeãs do conteúdo gerado pelos usuários poderão se recostar e assistir tranquilas à queima de dinheiro promovida por suas concorrentes premium, no vão esforço de vencer a guerra do streaming.
https://valor.globo.com/empresas/noticia/2019/09/23/a-disputa-bilionaria-para-ser-uma-netflix.ghtml