Em um dos momentos mais delicados para a Ucrânia nos últimos meses da invasão russa de seu território, as forças de Moscou fecharam o cerco a uma cidade-chave no leste do país, enquanto a Otan, a aliança militar liderada pelos EUA, debate a natureza da ajuda militar a Kiev.
Unidades do Exército russo e do grupo mercenário Wagner, a serviço do Kremlin, tomaram posições em torno de Bakhmut que parecem ter inviabilizado a defesa da cidade, considerada um trampolim para a conquista do restante da província de Donetsk, que, com Lugansk já sob controle russo, forma o Donbass.
Essa área, no leste ucraniano, era um dos poucos objetivos declarados de Vladimir Putin quando o russo surpreendeu o mundo e invadiu o vizinho, ação que completará um ano daqui a dez dias. Ela foi anexada ilegalmente por Moscou em setembro, mesmo sem o controle total dos russos.
Analistas divergem sobre a importância de Bakhmut, dado que é uma cidade menor comparada com a capital homônima da província, sob controle de separatistas russos desde a guerra civil iniciada em 2014, e de Kramatorsk, sede do governo ucraniano sobre os cerca de 50% restantes da região em poder de Kiev.
Para Michael Kofman, do americano CNA (Centro de Análises Navais), o “moedor de carne” estabelecido nos últimos meses na região não compensará uma eventual vitória russa. Não há dados oficiais disponíveis, mas governos ocidentais estimam que a maior taxa de baixas de Moscou na guerra ocorre naquela frente, em especial entre os mercenários.
Já o analista russo Ivan Barabanov, que escreve para publicações de defesa, aponta que os reforços da convocação de 320 mil reservistas por Putin no final do ano passado têm garantido a escalada das últimas semanas. “Infelizmente, isso é a guerra. Mas nosso lado tem mais soldados”, afirmou.
Tal assertiva já foi feita pelo governo ucraniano de Volodimir Zelenski e pela Otan, cujos ministros da Defesa estão reunidos nestas terça (14) e quarta-feira (15) em Bruxelas para discutir temas relativos à guerra. No centro do debate, o fornecimento de armas para Kiev.
Após ter assegurado a promessa de cerca de 140 tanques de guerra alemães de diversos países, algo que vinha sendo negado porque a aliança militar temia melindrar o Kremlin com uma arma mais poderosa, Zelenski está em campanha aberta para recompor sua Força Aérea com caças ocidentais.
A Otan já deixou claro que, mesmo que tome essa decisão, algo difícil, pois aumentaria o risco de ver Kiev usar suas armas contra o território russo, ela não seria imediata. “Defesa aérea foi um foco, e agora armamento pesado, [blindados] Strykers e Bradleys, veículos de combate de infantaria, morteiros da Alemanha e tanques de guerra”, afirmou o norueguês Jens Stoltenberg, secretário-geral da Otan.
“Como vocês têm visto na mídia, há uma discussão em curso agora sobre a questão dos aviões, e eu espero que isso seja discutido amanhã. Mas uma coisa é velocidade, urgência. Porque qualquer opinião que você tenha sobre [a entrega dos] aviões, ela levará tempo. Minha prioridade é assegurar que as promessas dos aliados para blindados e tanques sejam cumpridas assim que possível”, disse.
Mesmo os tanques demandam tratativas complexas. Já há cerca de 1.200 soldados ucranianos treinando a operação do modelo Leopard-2 na Alemanha, mas a entrega dos blindados deve ser espaçada. Nesta terça, a Noruega se uniu ao pool de países a fornecer o modelo, dizendo que irá ceder oito a Kiev.
Em entrevista coletiva, Stoltenberg também cedeu à realidade no caso da adesão de Suécia e Finlândia à aliança —a Turquia resiste ao pedido pela dificuldade em conseguir dos suecos a extradição de rivais exilados no país escandinavo ou a condenação de grupos que vê como terroristas. Ele afirmou que o mais importante é que ambos ingressem na aliança, não necessariamente ao mesmo tempo, como requisitado.
Em campo, os russos prosseguiram também com ataques a alvos de infraestrutura energética em pontos da Ucrânia, sem repetir a grande onda de mísseis que lançam regularmente desde outubro contra o país.