Em meio ao aumento das tensões na Ucrânia e ao temor de uma invasão russa, o estado das relações entre Rússia e Estados Unidos foi classificado como “muito lamentável” pelo Kremlin nesta segunda-feira (6), na véspera de uma reunião bilateral entre os presidentes Vladimir Putin e Joe Biden.
Autoridades americanas alertaram no último mês para uma movimentação incomum de tropas russas com 94 mil soldados próximo à fronteira com a Ucrânia, e manifestaram preocupação com uma possível ofensiva russa em janeiro que envolveria 175 mil homens —o que Moscou nega e chama de alarmismo. O governo Biden já disse que “prepara ações abrangentes e significativas” para ajudar Kiev em caso de invasão.
É nesse contexto que os dois presidentes vão se encontrar nesta terça (7), em reunião por vídeo chamada. “É claro que a agenda será sobre as relações bilaterais, que permanecem em um estado muito lamentável”, disse o porta-voz do governo russo, Dmitri Peskov.
Ele citou especificamente três tópicos da conversa: “A tensão em torno da Ucrânia, o tema do avanço da Otan sobre nossas fronteiras e as iniciativas do presidente Putin para garantir a segurança”, disse.
O Kremlin nega uma invasão iminente e afirma que as tropas estão posicionadas ao longo de seu próprio território por razões puramente de defesa. Para Moscou, o aumento da presença da Otan, coalizão militar de potências ocidentais, em torno de antigas repúblicas soviéticas, e a possibilidade de o grupo posicionar mísseis na Ucrânia mirando a Rússia, é “uma linha vermelha” que os EUA não poderão cruzar.
Putin demanda garantias de segurança de que a Otan não vai se expandir pela região e não vai posicionar armamentos próximo ao território russo, ao passo que Washington tem repetido que nenhum país pode vetar a aliança da Otan com a Ucrânia. “Eu não aceito linhas vermelhas de ninguém”, disse Biden na última sexta-feira.
Uma autoridade do governo americano disse a jornalistas nesta segunda que Biden deve alertar Putin das graves consequências econômicas que o país vai enfrentar se invadir a Ucrânia, e deve dizer que o país não deseja ter que usar a força na região.
Andrey Kortunov, chefe do Conselho de Relações Internacionais da Rússia, que é próximo ao Ministério das Relações Exteriores do país, afirma que Biden e Putin têm posições dificilmente conciliáveis.
“A única coisa na qual eles provavelmente podem concordar, se houver uma boa conversa, é que todo mundo direta ou indiretamente envolvido nessa situação deveria demonstrar contenção e compromisso em diminuir as tensões. Por outro lado, não vejo de que maneira Biden pode prometer a Putin que a Otan não vai avançar para o leste”, diz.
Analistas russos e americanos disseram que os dois líderes podem concordar em diminuir as tensões.
Os Estados Unidos ofereceram na última semana mediar negociações entre Moscou e Kiev para por fim aos conflitos que resultaram na deposição do governo ucraniano há quase oito anos, bem como negociar o fim do apoio russo a grupos separatistas. Sergei Lavrov, ministro das Relações Exteriores da Rússia, afirma que Moscou não tem objeções quanto a isso a princípio.
Para Vladimir Frolov, analista de política externa e ex-diplomata russo nos Estados Unidos, colocar Washington nessas negociações pode passar uma impressão de derrota para Moscou.
Em Kiev, o presidente Volodimir Zelenski disse que as forças armadas da Ucrânia são capazes de resistir a ataques russos. O país comemorou o dia nacional do exército nesta segunda com uma exibição de veículos blindados e barcos de patrulha dos EUA.
Nas ruas de Kiev, ucranianos se dividem sobre as negociações previstas para esta terça-feira. “Acreditamos que Biden é um grande amigo de nosso país. Até agora ele provou ser uma pessoa que deseja sinceramente ajudar a Ucrânia a sair dessa situação sem sentido”, disse Volodimir Pilipiuk, 71. Já o bartender Ruslan Lapuk, 28, vê poucas chances de sair do conflito. “Não temos ninguém com quem contar, a não ser nossas próprias forças”, disse.