Realidade e ficção nos robôs de ‘Guerra nas estrelas’

No mundo de hoje, é cada vez mais difícil separar realidade e ficção. Mas, muito além das fake news (notícias falsas) que se espalham pelas redes sociais atualmente, a arte continua a servir como fonte de inspiração para a vida real. E talvez nenhum campo seja mais prolífico neste sentido do que a ficção científica. Pensando nisso, Robin Murphy, professora de Ciências da Computação e Engenharia da Universidade Texas A&M, EUA, assina artigo de comentário na edição desta quarta-feira do periódico científico “Science Robotics” em que avalia como a “evolução” dos robôs nas histórias influenciou e influencia seu design e programação na vida real, tendo como foco os “adoráveis” R2D2 e BB-8, personagens da saga cinematográfica “Guerra nas estrelas”.
Murphy lembra que muito antes da estreia do primeiro filme da série criada por George Lucas, em 1977, os robôs já tinham invadido as telas. Seu papel, no entanto, era limitado, em geral o de “monstros” criados pela própria Humanidade que se tornariam agentes de sua destruição, ou apenas como indicativos de que a história se passava “em algum momento no futuro”, como Maria no clássico “Metropolis” (1927), Gort em “O dia em que a Terra parou” (1951) ou o assustador “pistoleiro” sem nome interpretado por Yul Brynner em “Westworld – Onde ninguém tem alma” (1973).
Exceções nesta lista, Robby de “Planeta proibido” (1956) e seu “primo” televisivo B9 de “Perdidos no espaço” (1965-1968) também não passavam de meros “alívios cômicos” com seu “literalismo” de máquinas. E todos eles tinham um desenho antropomórfico, isto é, eram parecidos com seres humanos, refletindo a tentativa e o sucesso, em maior ou menor grau, em disfarçar o ator vestido com a fantasia de robô.
Nas mãos de Lucas, porém, os robôs foram alçados ao papel equivalente ao dos protagonistas, também ganhando novos formatos, nos quais se destacaram os chamados “astromechs”: R2D2 desde a trilogia original e BB-8 na mais recente série de filmes da saga. Com isso, comenta Murphy, eles não só passaram a ajudar a sustentar a ciência por trás da ficção científica como o próprio enredo da história.
Sucesso de público, estas máquinas também atraíram a atenção de cientistas, que decidiram investigar o quanto há de realidade e ficção neles. Murphy cita como exemplo disso uma série de estudos liderados por Robin Read, roboticista da Universidade de Plymouth, no Reino Unido, em que ela mostra como o bipes e assobios usados por R2D2 e BB-8 para comunicar seus “estados mentais” e “emoções” nos filmes, como alegria e frustração, também podem ser usados em robôs reais para melhorar o engajamento de adultos, e especialmente crianças, com as máquinas.Por outro lado, a forma como BB-8 se movimenta, como um rolamento livre, e que tanto encantou as plateias nos cinemas, seria impraticável na vida real, principalmente nas areias dos “planetas desertos” que os personagens de “Guerra nas estrelas” parecem tanto frequentar, voluntária ou involuntariamente. Em testes, pesquisadores liderados por Daniel Goldman, professor da Escola de Física da Universidade Georgia Tech, também nos EUA, demonstraram que o pequeno robô facilmente atolaria nestas condições – como bem sabe qualquer motorista que já se aventurou a dirigir por uma praia.
Diante disso, os cientistas recomendam que o desenho dos verdadeiros robôs do futuro continue a se focar no biomimetismo, isto é, que imite a vida, como máquinas que se contorcem e arrastam como cobras e lagartos, ou com pernas, ecoando o antropomorfismo dos robôs clássicos do cinema.

https://oglobo.globo.com/sociedade/ciencia/realidade-ficcao-nos-robos-de-guerra-nas-estrelas-22419630

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