‘Nobel’ prega novo tributo para Google e Facebook

Forçar a divisão de empresas como Google e Facebook, como alguns especialistas e políticos vêm defendendo, pode não ser uma estratégia eficiente para reduzir o poderio das gigantes no mundo digital. O caminho para atingir esse objetivo passa pela criação de um imposto progressivo para a venda de publicidade que usa dados para atingir públicos específicos: quanto mais receita com essa atividade, maior a taxação.
A receita é de Paul Romer, ex-economista-chefe do Banco Mundial e prêmio Nobel de Economia em 2018. “O que isso faria é que uma empresa como o Google poderia avaliar que pagaria menos imposto se dividindo em dez companhias diferentes. E ainda se beneficiar de vender esses negócios”, disse Romer ao Valor, por telefone de Nova York, onde dá aulas na New York University. A tributação escalonada também evitaria que empresas iniciantes pagassem muito imposto, algo que poderia aumentar custos e restringir a inovação.
As críticas ao modelo de atuação das gigantes de tecnologia – as ‘big techs’ – vem ganhando força desde 2016 por conta da disseminação de notícias falsas e da interferência russa na eleição dos Estados Unidos. O coro contra o modelo de negócios dessas companhias abriga nomes como Romer, o investidor Roger McNamee (que foi mentor de Mark Zuckerberg nos primeiros anos do Facebook) e do cofundador do Facebook, Chris Hughes. “Converso com o Roger e com o Chris. Temos algumas discordâncias na forma como fazer isso, mas é importante que mais vozes falem sobre isso”, diz.
A senadora Elizabeth Warren, que luta para ser a candidata do Partido Democrata à Casa Branca na eleição de 2020, é uma dessas vozes. Ela defende desmembrar ‘big techs’ e conglomerados financeiros.
Romer trabalhou junto ao governo americano no acordo que determinou a divisão da Microsoft por conta de sua posição de domínio de mercado com o navegador Internet Explorer, em 1998. A tratativa acabou sendo derrubada na Justiça posteriormente, por isso o professor diz que repetir a estratégia talvez não seja o melhor caminho. Para ele, tributar a receita e não o lucro, país a país, funcionaria melhor porque é mais difícil atribuir o resultado das operações a uma determinada nação.
Romer avalia que a decisão final acabou controlando o poder da Microsoft, permitindo que o Google crescesse com o seu navegador, o Chrome. Mas o remédio fez com que o Google, controlado pela Alphabet, acabasse se tornando um “monopolista” – está praticamente sozinha no mercado de buscas pela internet. “Essas empresas se tornaram muito grandes para serem reguladas”, diz o professor.
Para ele, além da proteção dos cidadãos, um argumento que tende a fazer a discussão ganhar força é o da possibilidade de aumento de arrecadação por parte dos governos. “É dinheiro que está ficando na mesa”, diz.
Uma simulação do Conselho Francês de Análise Econômica, que assessora o governo francês, avaliou que a criação de um imposto sobre uma parcela dos lucros de multinacionais pelas vendas feitas em um país, proposta pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), não traria arrecadação adicional significativa e aumentaria a burocracia na França, Alemanha, EUA e China. A França, por exemplo, poderia tributar os gigantes do mundo da tecnologia, como Apple, Facebook e Google, mas perderia direitos sobre marcas de artigos de luxo como a LVMH.
Os governos, diz Romer, precisam atuar para que esse tipo de companhia gigante deixe de ser rentável e prejudicial à sociedade, para manter-se lucrativa, mas benéfica à população. Ele cita como exemplo medidas tomadas em relação ao clorofluorcarbono (CFC), gás que por mais de cinco décadas foi tido como benéfico e amplamente usado pela indústria de eletrodomésticos e em aerossóis. Mas, na década de 1970, estudos mostraram que o CFC era responsável pela criação de um gigantesco buraco na camada de ozônio, o que levou a seu banimento no fim dos anos de 1980.
“É preciso inovação e regulação para que a sociedade avance”, diz Romer, que dedicou parte de sua carreira para estudar urbanização. Neste ano o professor participou do Burning Man, um festival que acontece desde os anos 1980 no deserto de Nevada, nos Estados Unidos. O evento, segundo Romer, é um exemplo vivo de como pessoas podem se organizar para trabalharem juntas. “É interessante ver como em três dias 80 mil pessoas aparecem e criam uma cidade. Dá um otimismo sobre como novas cidades pode funcionar se forem bem gerenciadas”, diz.
Romer e William Nordhaus receberam o Nobel de Economia no ano passado por trabalhos que ajudaram a melhorar a compreensão do que leva ao crescimento sustentável no longo prazo e ao bem-estar da população mundial. Romer destacou a importância da inovação para o crescimento econômico, enquanto Nordhaus foi pioneiro ao considerar as mudanças climáticas na análise macroeconômica.

https://valor.globo.com/empresas/noticia/2019/11/21/nobel-prega-novo-tributo-para-google-e-facebook.ghtml

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