México e Canadá deixaram as diferenças de lado e formaram uma frente mais unida em sua tentativa para combater a ameaça do presidente dos EUA, Donald Trump, de impor altas tarifas sobre os produtos dos dois países, talvez, já a partir do próximo domingo (1° de fevereiro).
Desde sua vitória na eleição presidencial americana em novembro, Trump tem feitos repetidas ameaças de impor tarifas de 25% sobre todas as exportações aos EUA feitas por seus dois maiores parceiros comerciais, em retaliação ao que ele diz ser uma tendência de aumentos na imigração ilegal e no tráfico do opiáceo fentanil para o país. As tarifas poderiam entrar em vigor a partir de 1 de fevereiro, alertou Trump.
“Nesse tema, para Trump, é uma questão de preto ou branco”, disse uma fonte a par dos planos da equipe de Trump. “Nós te damos acesso ao mercado dos EUA, o que você está nos dando?”
O México e o Canadá estão vulneráveis às demandas de Washington, pois enviam 75% de suas exportações para os EUA, beneficiados por um tratado comercial trilateral, o acordo EUA-México-Canadá (USMCA, na sigla em inglês), assinado durante o governo anterior de Trump.
O México depende dos EUA para importar cerca de 70% de seu gás natural e há tempos é criticado por Trump pela imigração ilegal e pelo tráfico de drogas para os EUA.A câmara de comércio canadense estima que o Produto Interno Bruto (PIB) do país encolheria 2,6%, ou cerca de 78 bilhões dólares canadenses (US$ 54 bilhões), se Trump cumprir suas ameaças, o que custaria à população do Canadá cerca de 1,9 mil dólares canadenses por pessoa ao ano.
Apesar de serem alvo de uma ameaça em comum de Trump, México e Canadá viram sua relação se deteriorar em 2024, de início pelas preocupações levantadas pelo embaixador canadense sobre uma reforma da Justiça mexicana.
Em novembro, a relação piorou ainda mais, depois de o premiê canadense, Justin Trudeau, em uma tentativa de conquistar a simpatia do recém-eleito Trump, ter indicado que estaria aberto a excluir o México do USMCA e concordado que o investimento chinês no México era problemático.
Esses e outros comentários enfureceram o México, mas agora os dois países estão se aproximando diante das ameaças tarifárias de Trump. Segundo fontes, já promoveram uma série de conversas entre ministros nos últimos 30 dias.
“O ruído político pode ter causado atrasos e atrapalhado os juízos feitos em Ottawa, mas os canadenses enfim perceberam que uma melhor coordenação com o México é crucial”, disse Diego Marroquin Bitar, da cátedra Bersin-Foster para a América do Norte no centro de estudos Wilson Center.
Um dos principais objetivos da reaproximação tem sido alinhar as narrativas dos países sobre como todos sairiam perdendo com as tarifas dos EUA e como elas elevariam os preços para os consumidores nos três países.
“Trump anunciou que quer uma ‘era dourada’ para a economia americana”, disse Trudeau, na semana passada. “Isso significa que eles vão precisar de mais energia, mais minerais, mais aço e alumínio, mais madeira, mais concreto, mais das coisas que o Canadá já envia para eles.”
Canadá e México também elaboraram listas separadas de tarifas retaliatórias, ao mesmo tempo em que enviaram ofertas de paz, de forma pública e privada, para a equipe de Trump sobre a segurança nas fronteiras, segundo fontes.
O México prepara um esquema de tarifas conhecido no país como “carrossel”, que vai alternando os produtos impactados a cada tantos meses, tendo como alvo Estados republicanos importantes.
O Canadá também sinalizou estar preparando sanções de retaliação que causariam mais impacto nos EUA, com uma dose menor de sofrimento no Canadá, segundo o ministro de Energia e Recursos Naturais, Jonathan Wilkinson.
Uma revisão do USMCA, marcada para 2026, está em andamento e Trump pressiona por mudanças para reduzir a presença da China na região. Consultas públicas sobre a revisão começaram semana passada em Washington e o presidente pediu ao USTR (representante comercial dos EUA) para que envie suas recomendações sobre o futuro do pacto até 1° de abril.Canadá e México se preparam para sofrer pressões de Trump por uma renegociação mais ampla do USMCA (já renegociado uma vez durante seu primeiro governo, no que ele chamou de uma “vitória colossal para os trabalhadores americanos”), em vez de apenas a “revisão” já programada.
“Está em suas mãos jogar com isso, está em suas mãos remodelar isso”, disse Andrew Shoyer, ex-funcionário do Gabinete do USTR e advogado especializado na área na banca de advocacia Sidley Austin.
Segundo fontes a par dos planos da Casa Branca, os EUA defendem mudanças que limitem o conteúdo estrangeiro nos automóveis e reduzam os crescentes laços chineses com a economia mexicana. Trump também citou os altos déficits comerciais dos EUA com os dois parceiros do USMCA, alertando o Canadá que poderia usar sua “força econômica” para fazer dele o 51 Estado americano.
O Canadá “pode sempre se tornar um Estado, e se for um Estado, não teremos um déficit”, disse Trump em discurso no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na quinta-feira (23). “Não precisamos da madeira deles, porque temos nossas próprias florestas. Não precisamos do petróleo e gás deles. Temos mais do que qualquer um”, acrescentou.
Na verdade, os EUA importam cerca de 40% do petróleo que refinam, sendo 60% disso proveniente do Canadá e 11% do México. “Impor tarifas afetaria negativamente não só os consumidores americanos, mas também os interesses de segurança energética dos EUA”, disse Mark Scholz, CEO do grupo setorial Associação Canadense de Fornecedores de Energia.
O Canadá respondeu às exigências de Trump sobre as fronteiras, prometendo investir mais de US$ 1 bilhão em segurança com helicópteros, drones e aumento de pessoal — embora Trudeau tenha observado na quinta-feira (23) que apenas 1% dos migrantes ilegais e das drogas ilícitas que entram nos EUA têm como ponto de origem o Canadá. O México também intensificou a fiscalização da imigração e agora aceitará de volta os solicitantes de asilo que aguardam a decisão de seus casos nos EUA.
Trump ameaçou deslocar forças especiais dos EUA para o México para derrubar os cartéis de droga e disse, em Davos, que os EUA também vêm “lidando muito bem com o México”.
A abordagem de Trump vem tendo um impacto drástico no que normalmente são procedimentos rotineiros na maioria das operações de comércio exterior, segundo Shoyer. “Isso é máximo caos, choque e pavor […] ele está usando tudo isso como um trunfo”, disse.
