A China fez duras críticas aos Estados Unidos e à Coreia do Sul, a quem advertiu a não provocar uma confrontação com a ditadura de Kim Jong-un na porção norte da península coreana.
Na véspera, o líder sul-coreano, Yoon Suk-yeol, foi recebido com honras de Estado por Joe Biden em Washington, e ambos elevaram o tom de ameaça à Coreia do Norte, que desde o ano passado acelerou o programa de mísseis e a retórica de usar armas nucleares contra o Sul, os EUA ou aliados como o Japão.
Biden e Yoon concordaram em montar um grupo para decisões conjuntas em caso de ataque norte-coreano, incluindo resposta com ogivas atômicas. Elas não serão, porém, posicionadas no território aliado, como ocorria até o fim da Guerra Fria, em 1991. O democrata ameaçou Kim com “o fim do regime” em caso de guerra.
A China tem em Pyongyang um parceiro difícil, mas armado com talvez 30 bombas nucleares e um sofisticado programa de mísseis balísticos, inclusive com modelos capazes de atingir os EUA.
“Todas as partes devem enfrentar o tema [da tensão coreana] e ter um papel construtivo para uma solução pacífica”, afirmou Mao Ning, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores. Ela disse que a China pede a Washington e a Seul que evitem “provocar uma confrontação e fazer ameaças”.
A fala chinesa mostra o que está em jogo além da disputa decorrente do congelamento da Guerra da Coreia (1950- 1953), em que americanos apoiaram o Sul capitalista, e sino-soviéticos, o Norte comunista.
Na Guerra Fria 2.0, ponteada por EUA e China, a península coreana é um dos campos de disputa globais, envolvendo regionalmente também a Rússia, maior aliada chinesa, e o Japão, do campo americano.
Enquanto a Guerra da Ucrânia concentra atenções mundiais na Europa, as potências todas se posicionam para a disputa no Indo-Pacífico, principal rota comercial marítima do mundo, além de ser uma região rica em recursos naturais. São todas engrenagens de uma máquina maior.
Com efeito, a porta-voz Mao disse que os EUA “ignoram a segurança regional e exploram o tema da península para criar tensão”. O acordo entre Biden e Yoon na prática joga fora as tentativas de negociação que tiveram alguma tração na gestão de Donald Trump, com três encontros entre o republicano e Kim em 2018 e 2019, sem efeito prático a não ser o reconhecimento do status de potência nuclear do Norte.
Tal situação é vital, no microcosmo norte-coreano, para a manutenção do poder da dinastia Kim, que está em sua terceira geração de um bizarro experimento social stalinista em pleno século 21. Sem a bomba, o regime perde seu escudo, mas se empregá-la, Biden está certo: sua aniquilação é inevitável.
Nesse sentido, é notável até aqui o silêncio de Pyongyang ante a renovada agressividade americana. Ou houve a compreensão de que era melhor a China assumir o lugar de crítica, ou alguma reação de natureza militar ou provocativa está sendo tramada.
Além do grupo para o caso de guerra, Seul e Washington vão ampliar a cooperação militar, e pela primeira vez desde os anos 1980 um submarino com mísseis nucleares americano fará uma visita técnica a um porto sul-coreano, para começar. Dada a praxe de Kim, é provável que o movimento seja respondido com mais testes de mísseis ou, como temem observadores, uma nova prova nuclear.