Apps de transporte tombam e levantam incertezas sobre o setor

As quedas acentuadas nas ações de duas das principais empresas de aplicativos de transporte do mundo: Lyft e Uber.  Ao longo do dia,  as companhias operaram com quedas de 30% e 4,65% no valor de suas ações, respectivamente. O tombo acontece após a divulgação dos balanços trimestrais das empresas, que demonstraram a dificuldade das companhias de gerar lucro e apontam para incerteza sobre o futuro do setor.  

A Lyft, principal rival da Uber nos Estados Unidos, puxou as quedas, causando impacto sobre todo o setor. As ações fecharam o dia com baixa de 30% após a companhia admitir que precisará aumentar suas despesas no próximo trimestre – ao longo do dia, os papéis recuaram 35%. 

Prevendo o efeito negativo dos números da Lyft no mercado, o Uber decidiu antecipar para a manhã desta quarta a divulgação do balanço do primeiro trimestre – inicialmente, a publicação seria ao final do fechamento do mercado. Apesar da situação um pouco mais favorável, a gigante dos apps de transporte também viu seus papéis serem comercializados em queda ao longo de todo o dia – chegou a cair 12%. 

Embora tenha demonstrado mais otimismo com o futuro (e garantido que não precisará aumentar investimentos) o Uber, mais uma vez, não conseguiu registrar lucro no trimestre, mesmo com aumento das receitas líquidas. O prejuízo no primeiro trimestre foi de US$ 5,9 bilhões.  

De acordo com Natan Epstein, da Catarina Capital, mais do que evidenciar os problemas individuais das empresas, a queda das ações registradas nesta quarta-feira apontam para um problema em todo o setor de aplicativos de transporte. “O mercado está questionando a capacidade dessas empresas de gerar caixa, em um ambiente de maior competição e com um grande número de situações sob as quais elas não detêm o controle, como a inflação”, explica. 

Na divulgação do balanço, a Lyft deixou claro que precisará gastar mais nos próximos três meses para continuar atraindo motoristas para a plataforma. A previsão de aumento dos investimentos fez a empresa ajustar o EBITDA (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) do próximo trimestre para um valor entre US$ 10 milhões e US$ 20 milhões, número muito abaixo dos US$ 54,8 milhões registrados nos primeiros três meses do ano. Analistas de mercado previam EBTIDA superior a US$ 82 milhões para o segundo trimestre do ano.  

Já o Uber registrou alta de 136% na receita em relação ao mesmo período do ano passado (quando o mundo ainda enfrentava picos de casos e mortes pela covid-19), mas o prejuízo da empresa ficou em US$ 5,9 bilhões (impulsionado por quedas no valor da participação da companhia em outras empresas, que apresentaram baixo desempenho). Assim, o Uber segue operando no vermelho apesar do crescimento das suas atividades. 

Diferenças mais aparentes do que reais 

Após a divulgação dos números, o Uber fez questão de se diferenciar da principal rival. De acordo com a agência Reuters, o presidente da companhia, Dara Khosrowshahi, disse aos acionistas que a base de motoristas da empresa está em alta no período pós-pandemia e que essa tendência deve continuar, independente do nível de investimentos, indicando um próximo trimestre mais otimista. 

Contudo, na avaliação de William Castro Alves, estrategista-chefe da Avenue Securities, a diferença entre as duas empresas (e a reação do mercado mais agressiva contra a Lyft) está relacionada muito mais com a forma que cada uma se expressou após o balanço do que com a realidade propriamente dita. “É uma questão semântica, porque enquanto o Uber disse que vai seguir fazendo investimentos – mas nada muito diferente dos níveis atuais -,  a Lyft deixou o prognóstico em aberto, dando a entender que precisará de novos incentivos”. 

Em relação ao desempenho abaixo da expectativa da Lyft, Epstein lembra que a companhia possui algumas desvantagens estruturais em comparação a concorrentes como o Uber, em especial, o fato de ter menos diversidade geográfica nas suas operações e de oferta de serviços. “Parte desse aumento no valor dos incentivos anunciados pela Lyft, por isso, tem mais a ver com uma questão de escalabilidade da empresa e não do mercado em si”, pontua Epstein.  

Fatores externos alimentam incerteza

Fatores como a elevação do preço dos combustíveis e o aumento da inflação global seguem gerando preocupações entre os analistas de mercado, que não descartam, por exemplo, o aumento no valor das tarifas de corrida dos apps de transporte. “Existe a dificuldade de fluxo de caixa operacional, então as empresas não podem ficar absorvendo todo o aumento de custo.  Em algum momento, é possível que elas tenham que repassar esses custos ao consumidor”, afirma Alves. 

Epstein segue a mesma linha e não descarta futuros aumentos no valor das corridas. “O preço do combustível alto é o principal fator, embora o Uber, no Brasil, tenha se antecipado, ao anunciar pacote de ajuda de R$ 100 milhões para diminuir o impacto da alta da gasolina no bolso dos motoristas e usuários, que já existe”. 

Por outro lado, a diminuição dos efeitos da pandemia no mundo também impacta positivamente os apps de transporte. O Uber, por exemplo, conseguiu ter no primeiro trimestre de 2022 o mesmo número de corridas que a empresa fazia em 2019, último ano antes da pandemia. Também foram 115 milhões de usuários mensais na plataforma no primeiro trimestre, um aumento de 17% em relação ao mesmo período do ano passado. 

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