Quem atirou primeiro foi a União Europeia. E disparou contra ninguém menos que o segundo PIB do planeta, a China. O motivo era bem simples: os chineses ficam com quase todos os contratos para fabricação de painéis solares. Isto é: 71% desses painéis produzidos no mundo são chineses. O setor está falindo na Europa por esta razão. Solução: acusar a China de dumping e impor tarifas altas para deter a chegada dos produtos chineses.
Quem mais está interessada em frear a chegada dos painéis é a França, que pressionou Bruxelas a impor as taxas. O revide de Pequim foi para valer: taxará, na mesma proporção, os vinhos europeus, especialmente os franceses. Vai doer: a China é o destino maior dos Bordeaux: 72 milhões de garrafas vendidas em 2012. E 48% dos vinhos importados pelos chineses são franceses. Nesta história, tem liberdade de comércio, além de painéis solares e vinhos.
Pequim escolheu a dedo o troco, como mostrou matéria de Gilles Lapouge no Estadão de 7 de junho, pg B7, porque além de mexer com o orgulho francês provocou a ira da Alemanha contra a pressão de Paris. A chanceler Angela Merkel rapidamente se desvinculou da decisão de Paris, porque os negócios alemães com os chineses são muito mais importantes do que as fábricas de painéis da França.
Pequim compra alta tecnologia das fábricas alemãs. Na prática, 60% das importações chinesas de alta e média tecnologia têm origem na Alemanha. Os franceses deveriam saber disso e Bruxelas, sede da burocracia da União Europeia, que tomou a decisão pressionada por Paris, também sabe disso.
Por que foi feito? Há uma briga feia de concepção sobre o que é livre comércio entre Paris e Berlim. Neste caso, os chineses só foram o cenário da briga. Parte da burocracia européia quer frear a chegada dos produtos chineses com tarifas e não com maior produtividade e melhor preço. Os alemães pensam o contrário: se produzimos melhor e mais barato ganhamos dos chineses. Esta briga pode agravar ainda mais a crise do euro. Os chineses sabem disso.