A União Europeia está preparando uma importante cúpula com a China, em setembro, na Alemanha. Mudança do clima estará entre as prioridades da agenda. Se a estratégia de pesquisadores, ambientalistas e alguns governos europeus der certo, será a chance de aumentar a ambição da meta climática da China, o maior emissor de gases-estufa do mundo.
A aposta é que uma vez obtido esse compromisso, outros grandes emissores possam se animar a seguir o exemplo. Há, contudo, grandes desafios a serem contornados antes da cúpula.
A cúpula de Leipzig é uma oportunidade de repetir o sucesso do encontro entre Estados Unidos e China em 2014. O ex-presidente americano Barack Obama e o presidente chinês, Xi Jinping, costuraram um acordo climático bilateral que foi decisivo para pavimentar o Acordo de Paris, que a diplomacia francesa conseguiu fechar no ano seguinte acomodando os interesses do resto do mundo.
Os estudos científicos, contudo, apontam que as metas atuais de todos os países, no Acordo de Paris, conduzem a um aumento da temperatura de mais de 3o C no fim do século. O Acordo não é suficiente.
O ano de 2020 é crucial para as negociações climáticas internacionais. É quando o Acordo de Paris entra em vigor e também quando os países têm que aumentar sua ambição com novas metas de corte de gases-estufa, de adaptação e de financiamento climático.
A ideia, agora, é colocar o continente ambientalmente mais avançado do mundo, a Europa, conduzindo a China a ocupar o vácuo deixado pelos EUA. O presidente
americano, Donald Trump, já colocou em marcha a formalização da saída do Acordo de Paris.
O ponto auspicioso da cúpula UE-China é que Xi encontrará todos os chefes de governo europeus, e a presidência rotativa do bloco estará com a Alemanha, da premiê Angela Merkel.
O movimento chinês é o grande enigma das negociações climáticas. Em Pequim, houve uma grande reestruturação governamental, e o tema climático migrou da NDRC, a poderosa Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, para o Ministério do Meio Ambiente.
“Não diria que o tema perdeu prestígio”, diz o advogado Ranping Song, gerente de ação climática em países em desenvolvimento do World Resources Institute (WRI). Segundo ele, a pasta ambiental tem mais capacidade e recursos para implementar ações.
Entre 2005 e 2012, o consumo de carvão na China aumentou exponencialmente. Em 2013 teria atingido o topo, e começou a cair. Mas, nos últimos três anos, voltou a subir. Não alcançou os níveis históricos, mas reverteu a tendência e acendeu a luz amarela entre os pesquisadores.
O consumo de carvão respondia por mais de 70% da matriz energética chinesa e agora está perto de 58%, diz Song. A China fecha as minas velhas, que dão prejuízo, mas tem aberto outras.
“A minha opinião pessoal é que existe muito capital barato circulando e que tende a investir no que é antigo”, arrisca Song. Ele entende que o recente corte de subsídios às energias renováveis, que o país assumiu recentemente, “é um sinal de que o setor está maduro e tem que andar com as próprias mãos”.
Song conclui: “Em dois ou três anos a energia renovável será muito competitiva e barata.”
A tensão comercial entre EUA e China, segundo analistas ouvidos pelo Valor, é um dos motivos por trás da desaceleração da economia chinesa. O efeito colateral disso poderia ser algum retorno à decisão inercial de investir em carvão.
A China, já há alguns anos, estruturou nove províncias e montou um grande mercado de créditos de carbono doméstico e se prepara, portanto, para a nova economia.
“O país, contudo, ainda não se sente pronto para liderar a nova economia e ocupar o vácuo deixado pelos EUA. Ainda é um país em desenvolvimento”, diz um analista. “Mas tem plena consciência de que, se não participar do regime multilateral, as negociações climáticas irão colapsar”, diz a fonte.
Do lado europeu também há muitas questões em aberto. O Parlamento Europeu declarou emergência climática há poucos dias, às vésperas da CoP de Madri, o que coloca a Europa como o primeiro continente a reconhecer a urgência em agir.
O continente deve se tornar neutro em carbono em 2050. Isso será decidido nesta semana, pelo Conselho Europeu, em Bruxelas.
O mais complicado é fechar o ambicioso pacote climático do bloco antes de setembro, no encontro com a China. É o que de mais arrojado se terá à mesa de negociações na rodada de novembro de 2020, em Glasgow, na Escócia, durante a CoP 26.
O pacote climático europeu, segundo documento que vazou à imprensa, tem um ponto controverso: fazer com que o bloco se comprometa, em 2020, com uma redução de emissões de pelo menos 50% “e mais próxima de 55%” em 2030. A meta atual é de 40%.
Trata-se da peça-chave desse mosaico comandado pela nova presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e que deve ser votado em 2020. O cronograma tem que dar certo: se a votação ocorrer só em outubro, a Europa não terá nada muito forte para pressionar a China a embarcar no mesmo esforço.
França, Holanda, Suécia e Espanha têm pressionado para que o bloco adote a meta superior, de 55%. Alemanha e Polônia, contudo, temem que suas empresas não consigam cumprir o compromisso.
Para cortar as emissões pela metade em dez anos, a Europa terá que adotar novos padrões de emissão para os carros. O transporte de cargas terá que usar mais trens e hidrovias. Recursos financeiros em grande escala terão que ser investidos em infraestrutura limpa. Não é um passo trivial.
“Há muita expectativa neste encontro entre UE e China, de estas duas partes do mundo se engajarem na agenda climática”, diz Li Shuo, do Greenpeace.
“Mas é preciso lembrar que o encontro acontece em um momento de guerra comercial e de economia mais lenta”. Ele conclui: “É preciso que sejamos honestos: existe muita gente na China se perguntando se é o momento de se aumentar a meta climática do país agora.”
https://valor.globo.com/mundo/noticia/2019/12/09/ue-quer-aumentar-meta-climatica-da-china.ghtml