Imagine-se dirigindo em uma rodovia tarde da noite, quando um caminhão enorme cola na traseira do seu carro. Você relaxa, porque ele está mantendo uma distância segura e aparentemente obedece ao limite de velocidade. Agora, imagine que este caminhão seja autônomo, isto é, que dispense um motorista. Apesar do entusiasmo do Vale do Silício pelos carros automáticos, talvez sejam necessários mais alguns anos para que os encontremos em grande número nas estradas. Mas uma startup aposta que, para os caminhões autônomos, esta realidade não esteja tão distante.
A startup Otto é chefiada por 15 ex-funcionários do Google e a equipe inclui profissionais destacados que antes trabalhavam em projetos de mapas e carros autônomos do gigante das buscas. No novo negócio, o time de engenheiros se dedica a estudar veículos que trafeguem por longos percursos – a parte mais importante do setor de transportes comerciais, como mostrou matéria do The New York Times, assinada pro John Markoff, publicada no Estadão de 20/05.
Os engenheiros acreditam que os caminhões autônomos – e não os carros de passageiros – se tornarão mais atraentes financeiramente e serão mais bem aceitos pelos órgãos reguladores. Nos Estados Unidos, os caminhões percorrem o equivalente a 5,6% de todas as rotas percorridas pelos veículos em geral e são responsáveis por 9,5% dos acidentes mortais nas rodovias, segundo dados do Departamento de Transportes do governo dos Estados Unidos.
A tecnologia da direção automática – pelo menos no seu estágio atual – aplicada aos carros de passageiros deve torná-los absurdamente caros para qualquer um que não tenha os recursos de um magnata do Vale do Silício. Até pouco tempo atrás, o sensor a laser usado no projeto de carro autônomo do Google custava US$ 75 mil. Essas cifras estão caindo, mas levará algum tempo antes que se chegue a um preço realista para os consumidores. Por outro lado, o sistema autônomo aplicado a um grande caminhão talvez chegue a cerca de US$ 150 mil, de modo que o seu custo talvez faça mais sentido.
Além do valor relativamente mais baixo, os sistemas autônomos poderão tornar o transporte de cargas mais eficiente, permitindo, por exemplo, que o motorista descanse na cabine enquanto o caminhão assume a direção.
Empregos. No entanto, os veículos comerciais autônomos geram controvérsia em todo o mundo, já que é possível que eles acabem com empregos no setor. Há mais de 3 milhões de caminhoneiros nos EUA, segundo a Associação dos Motoristas de Caminhão do país.
O temor é de que, se os caminhões comerciais se tornarem totalmente automatizados, possam provocar uma catástrofe econômica nas pequenas cidades americanas que vivem de oferecer apoio para os veículos que transitam percursos longos. “A saída dos caminhoneiros das rodovias terá consequências equivalentes às que as próprias rodovias produziram há dezenas de anos para as pequenas cidades que surgiram ao redor dos desvios”, escreveu o pesquisador independente Scott Santens, em seu blog, no ano passado.
Nos últimos anos, os veículos autônomos tornaram-se um dos projetos favoritos da indústria de tecnologia. O Uber os considera uma estratégia para não ter mais de lidar com seus motoristas inoportunos (leia box ao lado). A Tesla, fabricante de veículos elétricos, assim como outras montadoras, considera a tecnologia autônoma um importante recurso para a segurança dos motoristas de carne e osso. A Apple também pode estar trabalhando em um tipo de tecnologia para carros automáticos.
O Google, particularmente, tem defendido agressivamente a tecnologia e seus carros autônomos são vistos normalmente nas estradas próximas à sede da empresa, em Mountain View, na Califórnia. No início deste mês, a companhia anunciou também um acordo com a Fiat Chrysler para a instalação da sua tecnologia numa frota de minivans.
Desde que os veteranos do departamento de automóveis e de mapas do Google Anthony Levandowski e Lior Ron fundaram a Otto, em janeiro deste ano, a pequena empresa cresceu: hoje são 41 funcionários e a equipe testa três caminhões da Volvo. A empresa não revela quanto já recebeu em investimentos até agora.
Levandowski se tornou conhecido em 2004, quando era estudante de engenharia industrial na Universidade da Califórnia, em Berkeley. Ele projetou uma motocicleta autônoma, estabilizada por um giroscópio, que foi apresentada na primeira competição do Pentágono para veículos autônomos.
Ron, o outro fundador da Otto, também é um veterano engenheiro de software do Google. Com a experiência adquirida no serviço de inteligência do exército de Israel, ele foi engenheiro chefe do Google Maps.
A Otto funcionou inicialmente numa pequena garagem, mas suas novas instalações têm espaço suficiente para os três caminhões Volvo, equipados com câmeras, radares e sensores a laser. A nova empresa oferecerá sua tecnologia como uma atualização para proprietários de caminhões de grande porte.