Por quatro décadas os impostos corporativos globais mergulharam numa “corrida para baixo”, que permitiu às grandes multinacionais reduzir suas cargas tributárias, canalizando seus lucros para jurisdições de baixa taxação. O acordo desse fim de semana entre os ministros das Finanças dos países do G-7 oferece uma oportunidade de mudar o jogo para reverter esse processo – e assegurar que as empresas estarão visivelmente dando uma contribuição justa à recuperação no pós-pandemia. Para ele ser bem-sucedido, as maiores economias do mundo precisarão aderir de uma forma mais ampla. Mas isso é do interesse delas.
O acordo subverte um século de prática tributária em que os lucros são taxados só onde as empresas têm presença física. Em vez disso, qualquer país onde as maiores e mais lucrativas empresas do mundo realizarem vendas terá o direito de tributá-las em “pelo menos 20% do lucro que exceder uma margem de 10%”. Os ministros das Finanças também se comprometeram com um imposto mínimo global de ao menos 15%, numa base país a país.
O acordo representa ainda uma retomada da cooperação multilateral e da liderança construtiva dos EUA depois dos anos Trump – mesmo que isso se encaixe nos esforços do governo Biden de bancar seus planos de gastos, elevando os impostos corporativos internos. Sem ele, porém, empresas americanas poderiam se movimentar mais em direção a paraísos fiscais. Se implementado, o acordo remove a ameaça de tarifas dos EUA contra países europeus que planejam taxar unilateralmente as gigantes de tecnologia americanas.
Qualquer compromisso traz imperfeições e decepções. A realocação de lucros com propósitos fiscais será confinada às cem maiores empresas globais e àquelas que realizarem “superlucros”. Mas mesmo esse alcance limitado capturará muitas das gigantes tecnológicas americanas visadas pelos europeus. A margem de 10% exigirá regras complexas. O um quinto dos lucros acima desse nível aberto à tributação internacional será relativamente pequeno, embora seja uma melhora em relação à situação atual. E o importante é que a mudança permite a taxação por países onde as empresas têm vendas, e não só onde elas estão baseadas. Mais coisas poderão ser erguidas sobre essa fundação no futuro.
O imposto mínimo global de 15% está bem abaixo dos 21% que o governo Biden propôs em abril. Grupos ativistas dizem que é baixo demais. Mas a formulação “pelo menos” permite aos países adotarem alíquotas maiores. Muito importante, também, é o acordo para aplicá-lo “numa base país a país”.
Isso significa que as empresas não poderão pagar uma taxa mínima média encaminhando parte dos lucros para países que cobram mais impostos e parte para regimes que cobram menos ou nenhum imposto. Em vez disso, se uma empresa pagou menos que o mínimo em qualquer país individualmente, seu país de origem poderá compensar a diferença para chegar ao piso global ou àquele que esse país implementou.
Se um número suficiente de países grandes concordar em fazer o mesmo, não haverá incentivos para as empresas transferirem lucros para locais que cobram impostos baixos. Os paraísos fiscais não terão poder efetivo de veto, e o modelo de negócios de imposto zero entrará em colapso. Um acordo no âmbito do G-20 poderá bastar para isso – mas a cláusula “país a país” terá de permanecer no acordo.
Faz sentido essas regras serem abraçadas pelas grandes economias, incluindo as duas maiores. A China poderá relutar em ter suas multinacionais pagando impostos em outros países. Mas é de seu interesse receber receitas de, digamos, uma empresa como a Apple, e ter um sistema fiscal global estável.
Para os EUA, abrir mão de alguma receita fiscal de empresas americanas presentes em outros países poderá abrir caminho para o recolhimento de muito mais.
Ninguém ganha com um sistema tributário do tipo “Velho Oeste”, em que todos tentam ganhar à custa dos outros. A chance de mudar isso não deveria ser perdida.