PIB cresce, mas China ainda tem dificuldades

Com o mercado imobiliário, que por muito tempo alimentou o crescimento, atolado em uma longa recessão, a economia da China engatou uma marcha mais lenta. 

A economia do país, em dificuldades, deu alguns sinais de vida nesta quarta-feira, com o fortalecimento das vendas no varejo tendo contribuído para levar o crescimento a registrar um crescimento de 4,9%, mais acelerado do que o previsto, no terceiro trimestre. 

Os dados sugerem que as recentes medidas de incentivo, como as reduções das taxas de juros e iniciativas destinadas a estimular as vendas de residências, ajudaram a estabilizar a economia, colocando-a em condições de alcançar a meta de crescimento oficial do governo chinês, de cerca de 5%, neste ano. O resultado amainou, pelo menos temporariamente, temores de um agravamento da crise econômica.page2image1767023760

Nas últimas semanas, um grupo de economistas rebaixou suas estimativas para a trajetória de crescimento de mais longo prazo da China, apesar de ter elevado suas previsões de mais curto prazo. 

A empresa de pesquisa britânica Oxford Economics revisou na semana passada suas expectativas de crescimento da China para os próximos cinco anos para cerca de 4%, em comparação aos 4,5% anteriores. O Morgan Stanley se revelou ainda mais pessimista. Em relatório divulgado no mês passado, seus economistas disseram prever que o crescimento da China desacelerará nos próximos anos, e cairá para 3% até 2030. 

A trajetória de crescimento do país, em acelerada deterioração, tem implicações sobre uma das metas políticas há muito acalentadas por seu presidente, Xi Jinping – ver a economia chinesa superar a dos EUA em magnitude total. Para muitos economistas, a hipótese de a economia chinesa ultrapassar a dos EUA é, há muito, uma questão de quando, e não de se. Há pouco, em 2021, quando o enfoque linha-dura adotado pela China para conter a pandemia de covid-19 lhe permitiu usufruir de uma retomada, muitos economistas adiantaram seus cronogramas de quando a China poderia sobrepujar os EUA. 

Agora, muitos economistas voltaram a atrasar seus cronogramas – e muitos deixaram de considerar que a China, em algum momento, chegará sequer a eclipsar os EUA. 

Os economistas apontaram para uma série de fatores, entre os quais um longo período de ressaca para se livrar dos efeitos das políticas de covid-zero adotadas por Xi Jinping, as crescentes tensões geopolíticas com os EUA e os atrasos das autoridades chinesas em enfrentar parte dos desequilíbrios estruturais do país. 

Um dos fatores mais importantes, no entanto, é o esgarçamento do setor imobiliário que alimenta o crescimento do país há décadas. Economistas estimaram que o setor imobiliário chegou, em determinado momento, a responder por cerca de 25% do Produto Interno Bruto (PIB) chinês. 

As vendas de imóveis residenciais continuam estagnadas apesar de os governos provinciais e municipais terem abrandado as restrições e implementado políticas favoráveis de outra natureza para atrair compradores. No longo prazo, uma população em processo de envelhecimento e o já elevado contingente de proprietários de casa própria poderão solapar a demanda. 

As enormes incorporadoras imobiliárias do país, que constituíram por muito tempo o centro desse modelo de crescimento, revelaram novos sinais de desgaste. Ontem, a Country Garden, no passado considerada uma das incorporadoras mais estáveis do país, descumpriu o prazo final para pagar juros sobre um bônus em dólar. 

Como parte do PIB, os recursos fiscais dos governos municipais e provinciais chineses – que dependem intensivamente das vendas de residências – deterioraram para seu nível mais baixo de mais de dez anos, segundo Adam Wolfe, economista de mercados emergentes da Absolute Strategy Research. Ele argumenta que, em decorrência disso, os governos municipais e provinciais poderão ser obrigados a desacelerar seus investimentos em projetos de infraestrutura e a reduzir os subsídios setoriais. 

“O enfraquecimento total do crescimento pode ser mais grave no ano que vem”, disse Wolfe, que prevê que o crescimento chinês poderá despencar para 3% ou menos nos próximos anos, num momento em que Pequim tenta reduzir o papel exagerado do setor imobiliário como impulsionador do crescimento. 

Tem despontado um consenso entre economistas de que outro fator significativo no obscurecimento das perspectivas chinesas é o impacto residual dos rígidos lockdowns anti-covid. Alguns começam a questionar se a economia da China chegará algum dia a voltar aos níveis de atividade registrados antes da pandemia. 

Vários indicadores mostram que as atividades econômicas chinesas, entre as quais investimentos e produção industrial, se estabilizaram em níveis cerca de 5% inferiores aos da tendência pré-pandemia, segundo Louise Loo, economista-chefe da Oxford Economics. “Tudo isso sugere uma perda permanente de produção maior que a prevista, para a economia [chinesa], provavelmente devido à mudança estrutural dos padrões de gastos e de investimentos”, observou ela em relatório divulgado na semana passada. 

No longo prazo, a China também se defronta com problemas estruturais profundos. O crescimento de sua produtividade se estagnou, sua população está envelhecendo e seus níveis de endividamento, aumentando. 

As restrições sobre exportações de tecnologia e as reduções aos investimentos na China, adotados pelos EUA, associados ao enfraquecimento dos investimentos privados, limitarão os aumentos de produtividade, observou Shuang Ding, economista-chefe para a China do Standard Chartered. 

“Na ausência de grandes reformas de política pública, a taxa potencial de crescimento da China manterá sua tendência de queda no longo prazo”, disse ele. 

https://valor.globo.com/mundo/noticia/2023/10/18/economia-da-china-vai-enfrentar-srios-problemas-nos-prximos-anos.ghtml

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