Parece uma livraria comum, mas não é

Na verdade, é um laboratório de testes da Amazon disfarçado de livraria. A loja, aberta há duas semanas, é o mais novo projeto-piloto da maior varejista de livros on-line do mundo. Parece uma livraria tradicional, mas não é. A livraria da Amazon, em Seatle, instalada em um pequeno shopping horizontal ao lado da University of Washington

A loja, pequena para padrões americanos, é acolhedora. Tem prateleiras em madeira clara e colunas de ferro preto, chão de tábua corrida e enormes vidraças, que deixam o sol e o verde da calçada entrar. Música clássica, em baixo volume, como mostrou matéria do Valor, assinada por Cynthia Malta, em 18/11, pg.B10.

São 10h30. Circulam pela loja de 15 a 20 pessoas. São jovens, com jeito de estudantes, casais idosos, mães com filhos de colo, homens e mulheres de meia idade falando em seus celulares, que perambulam por entre as prateleiras recheadas de revistas, livros de culinária, best-sellers, clássicos. Alguns circulam, bebendo café da Starbucks, outra grife famosa que nasceu em Seattle, ao lado de Amazon, Microsoft e Boeing. No fundo da loja há uma área reservada para crianças, equipada com mesas baixas, cadeirinhas, brinquedos.

Todos os livros são exibidos de frente, em vez de mostrar a lombada, para que o consumidor veja a capa do livro, que vem acompanhado de uma etiqueta, preta escrita em branco, com dados sobre a obra.

O acervo, de apenas uns 5 mil livros – uma fração do portfólio vendido pela Amazon na internet – pode decepcionar o leitor acostumado a frequentar livrarias de grande porte como as americanas Barnes & Noble e Strand ou mesmo as brasileiras Cultura e Livraria da Vila.

A vendedora não conseguiu localizar nenhum romance policial da minha lista de 13, escritos por Raymond Chandler, John Le Carré e Dashiell Hammett, que podem ser facilmente encontrados em livrarias de porte médio.

Também não é possível encomendar o livro na loja e buscá-lo depois. A recomendação é que você pegue o celular, entre no site da Amazon, faça a compra e receba a encomenda em casa, no Brasil, ou no hotel.

Nenhum livro ou revista exposto tem o preço impresso – ele muda ao ritmo dos valores cobrados pela empresa na web. Há equipamentos de leitura óptica espalhados na loja – o consumidor aproxima o código de barra estampado na contracapa e a máquina informa o preço.

Mesmo com um acervo que lembra o de uma livraria de aeroporto, ainda que mais parrudo, a loja tem atraído gente e a atenção da mídia. Quando foi aberta, formou-se longa fila na porta e foi assunto discutido por jornais e revistas nos Estados Unidos e em outras partes do mundo.

O shopping, um pequeno conjunto de lojas térreas, precisava de uma livraria e perguntou à Amazon se aceitaria abrir uma loja ali. A resposta da empresa foi “Por que não?”, contou uma porta-voz da Amazon ao Valor. Ela diz que a loja tem servido “para integrar a experiência de comprar na internet e perambular pelas prateleiras”.

O próprio Jeff Bezos, fundador e maior acionista da Amazon, disse em 2001 que gostava de zanzar por pequenas livrarias – algo cada vez mais difícil nos últimos anos. A Amazon, com seus preços baixos e entrega rápida, fez com que o mercado de livros fosse virado de cabeça para baixo, levando pequenas e grandes livrarias a encolherem ou fecharem as portas.

O Brasil é considerado um mercado importante para a Amazon. “Os brasileiros são leitores vorazes”, disse a porta- voz, uma afirmação que pode surpreender o comércio livreiro do Brasil. A companhia não informa qual é o tamanho do país no total de suas vendas. Mas para se ter uma ideia, enquanto o portfólio global reúne mais de 30 milhões de exemplares à venda, considerando obras em papel, digitais e áudio-livros; a oferta no Brasil é de 10 milhões de livros impressos (a maior parte em línguas estrangeiras) e cerca de 3,5 milhões em formato digital, sendo 60 mil em português.

No Kindle Unlimited, sistema pelo qual o consumidor paga R$ 19,90 por mês e tem acesso a mais de 1 milhão de livros, há 25 mil títulos em português.

Os aparatos que permitem ler, escrever, falar e comprar na internet como Kindles e celulares têm um lugar reservado no meio da livraria de Seattle, mas não chamam a atenção, sua exposição é discreta. Também não falta a tradicional caixinha de sugestões, pendurada em uma coluna de ferro.

A Amazon ainda não decidiu se terá mais livrarias desse tipo. A vice-presidente da Amazon Books, Jennifer Cast, disse ao jornal “The Seattle Times” que espera que esta não seja a única loja da empresa. O fato de a maior varejista on-line do mundo ter decidido investir em um espaço onde as pessoas podem entrar e sentir o toque macio do papel e o cheiro de um livro novo na mão, acende a esperança de que esse projeto-piloto dê frutos.

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