Nova York, o laboratório da megacidade do futuro

Gregory Dobler é um astrofísico que deixou de registrar imagens espectrais de quasares e buracos negros para analisar o universo em expansão da cidade de Nova York. Durante dois anos, Dobler e seus colegas do observatório urbano da Universidade de Nova York vêm registrando um panorama de Manhattan a cada dez segundos. Eles estão gravando o pulso rítmico de uma cidade viva, da mesma forma que os astrônomos capturam a atividade de uma estrela variável.

“Em vez de tirar fotos do céu para ver o que acontece nas estrelas, estamos fotografando a cidade para ver se descobrimos como ela está funcionando”, diz Dobler, cientista do Centro para Ciência e Progresso Urbano da Universidade de Nova York.

Os pesquisadores podem analisar o uso de energia, qualidade do ar, poluição, calor, tráfego e padrões de sono em tempo real, prédio a prédio, em uma das cidades mais densamente povoadas do planeta, como mostrou material do The Wall Street Journal, assinada por Robert Lee Hotz, publicada no Valor de 15/12

Centenas de cidades têm adotado a tecnologia digital, mas poucas estão se movendo com a rapidez de Nova York na ligação de redes de computadores municipais, desenvolvendo novas aplicações, tornando dados digitais públicos ou instalando tantos sensores para monitorar a vida urbana – da qualidade e uso da água ao trânsito e até para detectar o som de tiros.

Os pesquisadores esperam transformar os dados gerados todos os dias pelos habitantes de Nova York em um projeto de vida sustentável que poderia ser um modelo para as cidades digitais do mundo todo.

Essas inovações estão sendo conduzidas por um explosivo crescimento urbano global. Especialistas da Organização das Nações Unidas preveem que quase todo o crescimento populacional do mundo durante os próximos 30 anos acontecerá em centros urbanos – um milhão a mais de pessoas vivendo em Nova York e um bilhão de novos habitantes só nas cidades da China. E, até 2050, sete entre dez pessoas na Terra viverão em uma área urbana – uma mudança demográfica global tão rápida que muitos consideram esse momento um novo limiar para a humanidade.

“Vamos construir mais infraestrutura urbana nas próximas décadas que em toda a história”, diz Luis Bettencourt, que estuda a dinâmica de cidades no Instituto Santa Fe, no Novo México.

Segundo vários indicadores sociais e econômicos – salários, fundos para pesquisas, novas patentes, campos de emprego -, quanto a maior a cidade, melhor. Trinta por cento da economia mundial e a maior parte da inovação estão concentradas em apenas 100 cidades, afirma o braço de pesquisa empresarial e econômica da McKinsey & Co.

“Com as cidades, nós aumentamos a possibilidade de mais interações entre as pessoas para criar a agitação da cidade, gerar mais ideias, mais riqueza. Essa é a atração da cidade e o motivo de elas terem tanto sucesso”, diz o físico teórico Geoffrey West, que trabalha com Bettencourt na análise do crescimento urbano.

Mas as populações urbanas estão crescendo mais rápido do que as cidades têm condições de acomodá-las. Para receber tantas pessoas, as cidades deverão, até 2050, criar 84 mil quilômetros quadrados de novos espaços habitacionais, o tamanho da Áustria. Com lavouras convertendo-se em ruas e prédios de apartamentos, essas megacidades estão criando suas próprias zonas climáticas, mais quentes que os arredores rurais, alterando o ritmo das chuvas e gerando mais gases de efeito estufa.

Além disso, pesquisas mostram que doenças respiratórias devem aumentar uma vez que a poluição torna mais potentes o pólen e outros alergênicos. Mais desinfetantes serão necessários para purificar a água e tratar o esgoto, ameaçando suprimentos de água potável.

Para lidar com esses problemas, cidades como Nova York estão se tornando tubos de ensaio para a administração municipal. Para tentar se tornar mais eficientes, seguras e sustentáveis, muitas estão fazendo experimentos com redes de sensores sem fio baratos, os quais oferecem uma visão sem precedentes dos lugares onde as pessoas vivem, divertem-se e trabalham.

Até 2020, o número de termostatos, medidores de pressão, acelerômetros, microfones acústicos, câmeras e outros microdispositivos eletromecânicos de medição ligados à internet deve chegar a 50 bilhões no mundo todo.

Eles incluem sistemas inteligentes de irrigação em Barcelona, luzes urbanas que se autorregulam em Glasgow, alertas de enchentes gerados por cidadãos em Jacarta e sensores em Santander, na Espanha, que monitoram desde a qualidade do ar até a disponibilidade de vagas nos estacionamentos.

“Quanto mais as cidades coletam esse tipo de dados, mais rica é a leitura sobre sua população, e ela revelará mais coisas sobre nós mesmos do que esperávamos”, diz Scott Peppet, professor de Direito da Universidade do Colorado que estuda a disseminação de dados de sensores.

Junto com a Microsoft Corp., o Departamento de Polícia de Nova York criou o que as autoridades da cidade chamam de maior rede de dados de segurança pública do país. Em novembro, esse sistema conectava 10 mil câmeras de vigilância públicas e privadas em Manhattan, mais de mil leitores de placas de carro e cerca de 600 monitores de radiação e produtos químicos. O sistema também é alimentado com registros de prisões, chamadas de emergência e outros arquivos policiais – tudo em tempo real.

No início do ano, a polícia começou a testar 300 sensores de ruído que foram programados para detectar tiros e instalados em telhados do Bronx e Brooklyn, numa área de 38 quilômetros quadrados. O sistema de US$ 1,5 bilhão, desenvolvido pela SSY Inc., pode identificar o local de um potencial disparo de arma de fogo num raio de 25 metros e alertar a polícia em um minuto se foi um tiro ou outro ruído qualquer, como o motor de um carro ou uma porta batendo.

O departamento também está gastando cerca de US$ 340 milhões para conectar todos os seus escritórios, veículos e policiais. Até março, todos os 34.500 agentes terão smartphones seguros. Em 270 quarteirões do centro de Manhattan, sensores de micro-ondas, câmeras de vídeo e leitores de pedágios monitoram o tráfego. Em Staten Island e no Bronx, sensores sem fio detectam a aproximação de ônibus e abrem os sinais para acelerar a passagem deles. Além disso, 817 mil leitores de água foram instalados para melhor administrar o uso de água e detectar vazamentos.

No início de 2016, Nova York dará seu próximo passo adiante. Um consórcio de empresas deve instalar o primeiro de 10 mil transmissores desenvolvidos para transformar o antiquado sistema de telefone pago de Nova York na maior e mais rápida rede municipal de Wi-Fi grátis.

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