O mundo precisa se defender da possível tentativa do governo Donald Trump de implodir a Organização Mundial do Comércio (OMC) e estar preparado para uma OMC sem os EUA, afirma Pascal Lamy, ex-diretor-geral da entidade.
Após evento na Câmara Americana de Comércio (Amcham) ontem, em São Paulo, Lamy disse que é difícil saber se Trump busca vantagens comerciais específicas para os EUA ou se quer simplesmente acabar com a OMC e voltar a negociações bilaterais. Ele alerta que os outros países têm de se defender, como mostrou matéria do Valor de 17/04
“Pensar numa OMC sem os EUA talvez seja uma opção necessária para que não sejamos chantageados. Se a opção é ‘você faz isso ou eu saio’, então é preciso ter a contraopção ‘você sai, mas eu não'”.
Para o ex-diretor-geral da OMC é preciso estar preparado para dois cenários. O primeiro é negociar eventuais exigências dos EUA de novas regras, como para subsídios agrícolas. “O Brasil, nesse caso, adoraria ver a OMC regulamentando subsídios agrícolas dos EUA.”
O outro cenário é o de proteger a OMC da ofensiva dos EUA. “Se o cenário for o de minar a OMC, terá de haver uma séria coalizão para impedi-los. Se quiserem acabar com a OMC, não vamos aceitar, temos de mantê-la funcionando.”
Para Lamy, a decisão do Brasil de aceitar cotas de exportação de aço para os EUA, em troca de suspensão das sobretaxas até 30 de abril, mostra que o país já está aceitando o jogo imposto por Trump. “Se um país como o Brasil aceitou voluntariamente restrições, Trump conseguiu o que queria”, disse sobre o acordo costurado entre o secretário de Comércio dos EUA, Wilbur Ross, e o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Aloysio Nunes. “Aceitar restrições voluntárias é como voltar aos anos 1960”, criticou.
Para ele, aceitar as regras de Trump é deixar prevalecer um jogo bilateral em vez do multilateralismo conquistado nas últimas décadas. “Se Trump tentar acabar com a OMC e for bem-sucedido nisso, a OMC vai se tornar irrelevante. Não acredito que ele queira isso.”
Apesar da falta de clareza em relação aos planos de Trump, Lamy vê risco limitado de uma escalada para uma guerra comercial entre EUA e China. Isso porque, afirma, há forças dentro dos EUA que veem uma guerra comercial como potencialmente destruidora para a economia americana.
A segunda razão é porque os chineses são “extremamente racionais” e se comportarão de modo a não haver uma escalada. “A China será racional. Não buscará uma escalada, mas sim uma resposta proporcional”, disse.
Por outro lado, observou com entusiasmo, o presidente chinês, Xi Jinping, indicou no Fórum de Boao, na semana passada, maior abertura em algumas aéreas, como serviços financeiros e energia. “Se entendi bem, Trump viu isso de maneira positiva. Mas isso pode ter mudado. Não sei, porque eu não acompanho o Twitter a todo minuto.”