Nenhum evento do calendário politico de qualquer grande país apresenta a mesma mistura de expectativa e mistério que acompanha o congresso do Partido Comunista da China (PCC).
O principal propósito do evento – realizado a cada cinco anos – é a seleção de pessoal. Cerca de 70% dos 350 membros do Comitê Central, os 25 membros do Politburo e o Comitê Permanente do Politburo – que hoje tem sete membros – devem ser substituídos.
Poucas pessoas negariam a importância para a economia e os mercados financeiros de quem vai comandar a China pelos próximos cinco anos, mas descobrir quem será essa pessoa é outra história, como mostrou artigo de Gabriel Wildau, no Financial Times, publicado no Valor de 18/10.
Mesmo que uma lista do comitê permanente vazasse hoje, as implicações para a política permaneceriam bastante incertas. Chamar a interpretação do congresso de ciência inexata seria bondade.
Thomas Deng, diretor de investimentos da UBS Wealth Management em Hong Kong, diz: “Isso é mais um evento político do que um evento econômico. Embora a política domine a economia, levará tempo para que a doutrina e as diretrizes políticas se traduzam em políticas específicas”.
Os mercados financeiros chineses observarão atentamente o congresso do PCC, em busca de pistas sobre a política monetária, controles de capital e reforma das empresas estatais, entre outros temas.
Sejam quais forem as implicações de médio e longo prazo das mudanças ratificadas no congresso, os mercados da China continental deverão permanecer bastante estáveis durante o evento de uma semana de duração.
Assim como fizeram durante a turbulência no mercado de ações em 2015, as autoridades farão de tudo para neutralizar eventuais quedas embaraçosas nos grandes índices ou na taxa de câmbio do yuan, que poderiam romper com a imagem de força que o PCC quer projetar durante o evento.
No mercado de ações, uma “equipe nacional” de investidores estará em alerta, caso seja preciso erguer um escudo de proteção.
Em eventos anteriores, como a sessão anual do Parlamento, as autoridades reguladoras também emitiram orientações verbais a corretoras e fundos mútuos, instruindo-os a não vender ativos.
De modo parecido, o Banco do Povo da China, seu banco central, usará as operações no mercado aberto para assegurar uma ampla liquidez do interbancário e evitar qualquer sinal de aperto de caixa.
O banco central também estará pronto para usar as reservas internacionais, de US$ 3,1 trilhões do país, para apoiar o yuan se isso for necessário.
Mesmo depois do congresso, a maioria dos analistas espera uma continuação do modelo político desenvolvido nos últimos cinco anos, embora alguns acreditem numa melhora na implementação se Xi Jinping conseguir instalar quadros leais em posições chaves.
Arthur Kroeber, sócio da Gavekal Dragonomics, uma companhia de pesquisas de Pequim, escreveu: “Independentemente do resultado político, não espere nenhuma grande mudança na política econômica. As linhas gerais da política estão em vigor há algum tempo e deverão prosseguir”.
A melhora da eficiência das paquidérmicas empresas estatais da China tem sido uma prioridade declarada dos líderes do PCC há anos, mas até recentemente havia poucos sinais de ação. Agora, esse esforço parece estar se acelerando.
A privatização parcial da companhia de telecomunicações China Unicom é um sinal de que a chamada reforma do controle misto será um elemento cada vez mais importante da reforma das estatais, apesar das críticas de que as vendas parciais de participações seriam insuficientes para influenciar a governança corporativa.
Fortalecer as estatais por meio de fusões orquestradas pelo Estado é outra tendência, na medida em que o Pequim tenta criar campeãs nacionais globalmente competitivas em setores importantes.
A discussão da reestruturação das estatais poderá desencadear compras especulativas nos setores siderúrgico, elétrico, químico e outros onde fusões são esperadas.
Huang Xiaoming, sócio da Preston Asset Management, um fundo hedge de Xangai, diz que uma estratégia de investimentos simples, de comprar ações de empresas líderes de cada setor – a maior parte delas estatais – vem resultando em retornos acima da média desde o começo de 2016. “O forte desempenho dos líderes setoriais reflete em parte as forças do mercado, mas até certo ponto reflete também a precificação desses fatores políticos.”
Durante anos a China tentou obter um equilíbrio entre o apoio ao crescimento e a contenção do excesso de endividamento. Este ano, com a meta de crescimento anual já garantida, a ênfase mudou para a desalavancagem e o endividamento do país se estabilizou.
Mesmo assim, permanecem as incertezas sobre o grau de aperto monetário que as autoridades estão dispostas a perseguir, dado que no momento o crescimento parece estar desacelerando.
No congresso, indicações de uma postura mais radical – ou preocupações com a desaceleração do crescimento – poderão afetar as taxas de juro de curto prazo.
Mesmo assim, os analistas no geral ainda acreditam que as taxas do mercado de títulos de curto prazo permanecerão estáveis porque o teor da política monetária já foi bem comunicado.
“Qualquer tentativa de reduzir os juros de curto prazo despertará preocupações com o crescimento do crédito num momento em que os líderes chineses tentam evitar um aumento maior na taxa de alavancagem”, escreveu Song Yu, economista-chefe da Gao Hua Securities em Pequim, uma joint venture com o banco de investimentos Goldman Sachs. “Por outro lado, uma alta significativa dos juros de curto prazo despertaria preocupações com o crescimento.”