Pilhas de caixas de papelão servem como divisórias improvisadas no novo escritório da Mistletoe Inc., no sofisticado bairro de Aoyama, em Tóquio, onde “startups” se reúnem para trabalhar em seus projetos mais recentes.
O clima informal – bem diferente da rigidez dos escritórios corporativos japoneses – é algo que o fundador Taizo Son quer ver com mais frequência. Son, um empreendedor serial, é o irmão mais novo de Masayoshi Son, fundador do conglomerado SoftBank Group Corp.
“O Japão tem talentos e recursos, mas falta o ecossistema necessário para criar o seu próprio Vale do Silício, então é isso o que estamos tentando proporcionar”, diz ele, que descreve a Mistletoe como um programa para ajudar a abrir novas firmas, como mostrou artigo do The Wall Street Journal, assinado por Alexander Martin, publicado no Valor de 12/04
O país que criou o walkman e o trem-bala hoje vê sua outrora dominante indústria de tecnologia ficar para trás, enquanto startups chinesas como o Alibaba Group Holding Ltd. se tornam potências mundiais. Com todo o setor tecnológico do país em dificuldade, o Japão está contando com os empreendedores para reavivar sua estagnada economia.
O governo está se comprometendo a financiar startups e as principais universidades criaram incubadoras e fundos para investir em novatas. Mesmo os maiores e mais antigos conglomerados, como os grupos Mitsubishi e Mitsui, estão procurando estimular empreendedores.
Algumas startups se destacaram nos últimos anos. A Euglena Co., produtora de microalgas para fins alimentares e ambientais, que nasceu em 2005 e abriu seu capital em 2012, tem valor de mercado de mais de US$ 1 bilhão. A Mercari Inc., operadora de um aplicativo de compras que usa tecnologia de redes ponto a ponto, ou P2P, foi lançada em 2013 e levantou cerca de US$ 75 milhões em março, sendo avaliada em mais de US$ 1 bilhão. Mas os investimentos de capital de risco no Japão somaram apenas US$ 629 milhões em 2015, segundo a firma de pesquisa AVCJ Research, de Hong Kong, ante US$ 59,1 bilhões nos Estados Unidos, de acordo com Associação de Capital de Risco do país.
Muitos japoneses preferem trabalhar como empregados assalariados em uma empresa, o que resulta em menos pessoas escolhendo ser empreendedores, dizem os que atuam na indústria de tecnologia. Mesmo quando infortúnios como os das gigantes Toshiba Corp. e Sharp Corp. mostram que o tamanho da empresa necessariamente não é garantia de segurança, continua existindo uma reverência cultural fortemente enraizada em relação às grandes companhias.
Yoshiyuki Taguchi, por exemplo, que tem 22 anos e é estagiário na Slush Asia – promotora da versão japonesa de um popular evento finlandês que reúne empreendedores, talentos de tecnologia e investidores – quis continuar na firma depois que concluiu a faculdade. Sua família, porém, insistiu para que ele entrasse em uma empresa “com
ações em bolsa, famosa”. Após um mês de discussões, ele aceitou um emprego numa grande empresa de recursos humanos.
Antti Sonninen, diretor-presidente da Slush Asia, diz que o Japão precisa de mais empreendedores que se tornem investidores para servir de exemplo. “Esses caras podem dar o melhor conselho sobre como criar a próxima geração de empresas que podem mudar o mundo”, diz.
Isso é o que Son está tentando fazer por meio da Mistletoe, que apoia programas educacionais de startups e eventos – onde empreendedores tentam vender suas ideias a investidores -, enquanto trabalham em iniciativas para encontrar soluções de problemas em áreas que vão do transporte ao envelhecimento da população do Japão.
Son identifica a si mesmo como parte da primeira geração de empreendedores japoneses que lançaram startups durante o boom da internet, no fim dos anos 90. Captar recursos na época era um pesadelo, diz, pois havia muito menos dinheiro disponível para empreendedores e os bancos relutavam em emprestar a firmas desconhecidas.
Muita coisa mudou desde então. Os empreendedores de hoje podem apontar para o sucesso de algumas das empresas desconhecidas daquela época – como a companhia de comércio eletrônico Rakuten Inc. e a de operação de internet móvel DeNA Ltd., que se tornaram nomes de porte no Japão e até internacionalmente.
A quantidade de empresas abrindo capital atingiu o nível mais alto em oito anos no ano passado, chegando a 98, segundo o Japan Exchange Group. O sucesso de Son no mundo das startups inclui o Yahoo Japan, que ajudou a lançar em 1996, quando ainda era estudante na Universidade de Tóquio. A firma hoje é dona do maior portal de internet do Japão e da GungHo Online Entertainment Inc., que cria jogos de grande sucesso, como o Puzzle & Dragons.
Sua missão agora é retransmitir essa experiência para a nova geração de empreendedores. O estúdio de 1.300 metros quadrados ocupado pela Mistletoe oferece aos participantes espaço para trabalho e a assistência de uma equipe que inclui especialistas em áreas que vão de inteligência artificial a design industrial.
“Pode ser difícil atrair os talentos necessários para lançar uma startup, então nós trabalhamos com eles e oferecemos consultoria”, diz Son.
Entre as empresas abrigadas ali está a Fove Inc., que vem desenvolvendo um dispositivo de realidade virtual de rastreamento ocular. A Mistletoe está investindo em cerca de 20 startups.
O próximo passo seria o lançamento de um produto de sucesso. “Há grande apoio disponível no Japão para lançar startups, mas o importante é estabelecer estruturas para empresas venderem inovação”, diz Atsuko Nomura, pesquisador sênior do Instituto de Pesquisa do Japão. “É aí que as grandes empresas poderiam entrar, mas não estamos vendo muito isso.”
Com o surgimento da Internet das Coisas – rede de dispositivos conectados à internet -, Son diz que há um grande potencial para o Japão, um país que tradicionalmente tem se destacado na produção de hardware.
“As empresas japonesas grandes e já estabelecidas ainda abrigam muitas tecnologias poderosas e inovadoras, mas elas são avessas ao risco se comparadas a startups que não têm nada a perder”, diz ele. “O caminho para o Japão desenvolver seu próprio ecossistema único é ter ambas coexistindo e cooperando, e nós gostaríamos de ser essa ponte.”