Há interesse em evitar guerra no Oriente Médio, mas risco cresceu

Há décadas, qualquer lista de riscos geopolíticos globais tem um “ataque a instalações de petróleo da Arábia Saudita” perto do topo. Agora isso aconteceu.
A boa notícia é que o mundo está hoje menos vulnerável a um choque do petróleo do que na década de 70, quando o embargo da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) causou turbulências na economia mundial. Também é verdade que todas as potências envolvidas – Arábia Saudita, Irã e EUA – têm fortes incentivos para evitar um conflito.
Mas a má notícia é que os principais líderes neste drama – Donald Trump, o presidente dos EUA, Mohammed bin Salman, o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, e a liderança do Irã – são obstinados e propensos a assumir riscos.
É provável que, se os EUA mantiverem a acusação de que o Irã está por trás do ataque , isso levará a uma resposta militar. Se e quando ela ocorrer, haverá o risco de uma escalada maior. Como o ataque do fim de semana já causou um aumento de 15% no preço do petróleo, é óbvio o potencial de mais confusão nos mercados.
A importância do petróleo do Golfo Pérsico para o mundo está na memória coletiva do Ocidente desde que a Opep impôs o embargo de 1973. Isso quadruplicou os preços do petróleo, causando sérios danos aos mercados e à economia mundial. A lição aprendida – de que a estabilidade do fornecimento de petróleo pelos países do Golfo é crucial para a economia global – ajudou a conduzir a resposta dura do Ocidente à invasão do Kuait pelo Iraque em 1990.
Quase 30 anos depois da primeira Guerra do Golfo, as economias ocidentais estão consideravelmente menos vulneráveis a uma ruptura do fornecimento de petróleo. O aumento da produção nos EUA significa que as importações de petróleo da Arábia Saudita pelos americanos são hoje apenas um terço do que eram em 2003.
Mas menos vulnerável não quer dizer invulnerável. Ainda há um preço global para o petróleo, e a Arábia Saudita continua sendo o maior exportador do mundo. Portanto, se o fornecimento saudita for interrompido, consumidores e indústrias do mundo todo rapidamente sentirão o impacto.
A vulnerabilidade das instalações petrolíferas sauditas a ataques também ficou clara. Se o ataque foi realizado por drones, como noticiado inicialmente, é chocante o quanto instalações industriais avançadas estão vulneráveis a ataques que usam novas tecnologias baratas e amplamente disponíveis. Os sauditas têm ainda motivos para se preocupar com a segurança de seu suprimento de água. O país obtém cerca de metade da água potável que consome de usinas de dessalinização, uma das quais foi alvo de ataque de míssil em junho.
A consciência de sua vulnerabilidade a novos ataques deveria deixar os sauditas mais atentos à escalada do conflito. A estabilidade social e política do país é outra
questão. A família real há muito teme a ameaça de distúrbios internos de sua maior minoria, os xiitas.
Apesar dos grandes gastos militares, a Arábia Saudita não vem conseguindo prevalecer numa guerra brutal no Iêmen – que é um problema muito menos intimidador que o Irã. Portanto, mesmo apoiando fortemente a política de “pressão máxima” de Trump com o Irã, os sauditas têm pouco interesse numa guerra de fato.
O Irã também tem interesse em evitar uma guerra, que exporia o país ao poder de fogo de seus bem armados vizinhos e, sobretudo, a um ataque dos EUA. Nos últimos meses, os iranianos fizeram uma série de provocações, como a apreensão de petroleiros ocidentais no Golfo e (provavelmente) encorajar seus aliados huthis no Iêmen a atacar alvos fáceis na Arábia Saudita.
Mas esse tipo de atitude temerária do Irã é interpretada pela maioria dos observadores ocidentais como um esforço para mostrar que Teerã não está impotente diante das sanções americanas. O país busca ainda reforçar sua posição antes de uma possível retomadas das negociações com os EUA.
Quanto a Trump, apesar de sua retórica beligerante, suas atitudes mais recentes têm mostrado que ele quer avançar na diplomacia com o Irã. Um motivo importante de Trump ter demitido John Bolton na semana passada é que seu ex-assessor de segurança nacional era radical demais e se opunha a sugestões de que as sanções americanas ao Irã deveriam ser amenizadas para dar início a negociações.
Portanto, todos os lados têm interesses econômicos e estratégicos para se afastar da beira do precipício. Infelizmente, todos eles vêm se mostrando instáveis, emotivos e propensos a erros de cálculo.
O príncipe Mohammed vem demonstrando sua propensão a erros de cálculo graves com sua conduta na guerra do Iêmen e por aparentemente ter autorizado o assassinato horripilante do jornalista Jamal Khashoggi. Os iranianos, se de fato autorizaram o ataque às instalações sauditas, assumiram um risco enorme, com consequência que eles não podem controlar.

https://valor.globo.com/mundo/noticia/2019/09/17/ha-interesse-em-evitar-uma-guerra-mas-risco-cresceu.ghtml

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