Guerra da energia começa entre Rússia e Europa

União Europeia (UE) e Rússia estão entrando numa perigosa guerra de energia. Ontem a Rússia cortou o fornecimento de gás a dois países da UE e ameaçou cortar dos demais. E ainda ontem a Alemanha abriu caminho para um embargo europeu ao petróleo russo. Esse confronto é uma continuação esperada do conflito militar na Ucrânia e deve abalar ainda mais as economias russa e europeia, além de trazer mais instabilidade aos mercados globais.

A Rússia escancarou ontem o uso da energia como arma ao cortar o fornecimento de gás à Polônia e à Bulgária, alegando que esses países não concordaram com a exigência russa de que o gás seja pago em rublos.

Não se sabe se e quantas empresas europeias aceitaram pagar em rublos pelo gás russo. Mas os principais países europeus, a começar pela Alemanha, disseram que vão continuar pagando em euros, como previstos nos contratos de fornecimento. 

Aparentemente Moscou usou dois mercados menores para mandar um alerta aos países maiores (e mais dependentes do gás da UE). E ontem o porta-voz do governo russo ameaçou cortar o fornecimento de outros países que se recusarem a pagar em rublos.

Não está claro porque a Rússia passou a exigir pagamento em sua própria moeda, mas poderia ser um meio de forçar empresas europeias a violarem sanções da UE que impedem transações com a Rússia, inclusive cambiais. 

Antes da guerra, a Rússia fornecia cerca de 45% do gás natural importado pela UE, o que responde por cerca de 40% do consumo europeu de gás. O maior comprador é a Alemanha, que depende da Rússia para 55% de suas importações de gás e cerca de 60% do seu consumo. Os países europeus vêm tentando reduzir o consumo e diversificar seus fornecedores, mas é muito difícil substituir todo esse volume de gás russo rapidamente. 

Já o vice-premiê e ministro da Economia alemão, Robert Habeck, disse ontem que seria “administrável” para a Alemanha um embargo ao petróleo da Rússia. Isso na prática abre caminho para a decisão política na UE de adotar um embargo ao petróleo russo. 

Autoridades europeias vêm dizendo nos últimos dias que um novo pacote de sanções à Rússia, o sexto da UE, está prestes a ser anunciado. Parece muito provável que ele incluirá um bloqueio às compras de petróleo russo. 

Antes da guerra, a Rússia respondia por quase 26% das importações de petróleo da UE. Assim como no caso do gás, o maior comprador é a Alemanha. Mas a dependência do petróleo russo é menor. Segundo Habeck, estaria agora em 12%, após um esforço do país para diversificar suas compras. 

EUA e Reino Unido já proibiram a compra de petróleo russo, mas nos dois casos o volume era bem menor do que o comprado pela UE e mais fácil de ser substituído. 

O preço do gás natural na Europa já subiu desde que a Rússia anunciou o corte do fornecimento à Polônia e à Bulgária, mas o petróleo vem caindo nos mercados internacionais, devido principalmente ao temor de desaceleração da economia na China, que é o segundo maior consumidor e importador de petróleo. 

Por trás dessa guerra da energia entre UE e Rússia está o acirramento do conflito militar na Ucrânia. Após mais de dois meses de guerra, as forças russas pouco avançaram no país e Moscou teve de desistir do ofensiva no norte, que possivelmente visava tomar a capital ucraniana, Kiev. 

Segundo disse um general russo na semana passada, o objetivo de Moscou agora é tomar o leste e o sul da Ucrânia, fazendo um corredor até a Transnístria – região separatista pró-Rússia na Moldova. 

Mas o crescente fornecimento de armas sofisticadas do Ocidente à Ucrânia está tornando o avanço russo cada vez mais difícil e mais custoso, tanto em termos materiais como de baixas entre as tropas. Os EUA estimam que cerca de 15 mil soldados russos já morreram na Ucrânia. 

Assim, a energia parece estar se tornando um novo capítulo nesta guerra. A Rússia poderá jogar a Europa numa recessão caso corte o fornecimento de gás, mesmo à custa de agravar sua própria crise interna. Já com o eventual embargo ao petróleo russo, a UE busca aumentar o custo para Moscou da guerra na Ucrânia e, eventualmente, forçar a Rússia a recuar. 

A guerra da energia indica assim um perigoso agravamento do conflito entre e Rússia e o Ocidente. E mostra que a Rússia está ficando com menos opções. Num sinal disso, o presidente Vladimir Putin ameaçou ontem abertamente usar armas nucleares neste conflito.

https://valor.globo.com/mundo/noticia/2022/04/28/guerra-da-energia-comeca-entre-russia-e-ue.ghtml

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