O “corte” ficou para depois. Apesar de todas as ameaças, o governo da França apresentou seu projeto de lei de orçamento para 2015 desafiando a União Europeia. Na prática, Paris estipulou os próprios prazos para reequilíbrio das contas públicas. Pelo texto, a meta de déficit, de 4,4% neste ano, cai apenas para 4,3% em 2015 antes de chegar a 2,8% em 2017, alcançando a meta fixada por Bruxelas com dois anos de atraso. Berlim, que apresenta os melhores resultados em contas públicas, já zerou o déficit com a austeridade fiscal, que Paris recusa.
As despesas totais do poder público central cairão de € 316,4 bilhões até o fim de 2014 para € 313,9 bilhões em 2015, o que provaria o esforço do governo de François Hollande para reequilibrar as contas públicas. Estaria prevista ainda uma economia de € 1,4 bilhão na massa salarial e a redução do quadro de funcionários em 1,2 mil vagas. Vendas de prédios e bens públicos e otimização das compras públicas também estão nos planos para 2015, como mostrou matéria do Estadão de 2/10, pg B13.
A apresentação do orçamento também foi a oportunidade de o governo fazer novas críticas à política de austeridade adotada por Bruxelas, a pedido do governo da chanceler da Alemanha, Angela Merkel. Paris, portanto, terá de explicar a Bruxelas por que suas metas fiscais, que deveriam ser atingidas em 2015, só o serão em 2017, violando o Tratado de Maastricht, que fixa um máximo de 3% de déficit. Há 20 dias a Comissão Europeia já havia pedido a Paris que acentue a redução de suas despesas e acelere o reequilíbrio fiscal.
Na semana passada, o primeiro-ministro francês, Manuel Valls, foi a Berlim em visita oficial na qual destacou as reformas econômicas que vêm sendo implementadas por Paris. Angela Merkel, porém, não têm se mostrado sensível às justificativas de outros governos para adiar o equilíbrio fiscal. “Manter as promessas deve enfim se tornar a marca registrada da zona do euro”, disse a chanceler. “O financiamento da economia pelo crédito deve acabar.”
Um elemento que complica a imagem da França é a quebra de palavra, já que o governo de Hollande havia prometido reduzir o déficit à casa de 3% em 2015. Outro é o símbolo. Nesta semana, a dívida pública do país superou os € 2 trilhões, chegando a 95,3% do PIB. Pelos cálculos oficiais, a perspectiva é de que o endividamento continue crescente até 2016, quando entrará em trajetória de queda.