A União Europeia (UE) estuda redirecionar ao setor de defesa 93 bilhões de euros em fundos aprovados para a recuperação do pós-pandemia que acabaram não sendo usados como parte dos esforços para aumentar os investimentos e os gastos militares após o governo Donald Trump ter alertado para a possibilidade de retirada do apoio dos EUA à segurança do continente.
A presidente da Comissão Europeia (CE), Ursula von der Leyen, mencionou a opção do financiamento em reunião do Partido Popular Europeu, de centro-direita, na terça-feira (19), segundo quatro fontes a par das discussões.
A UE também poderia reorientar fundos destinados ao desenvolvimento regional, segundo Von der Leyen, que mencionou o “financiamento europeu comum” como outra opção em estudo, de acordo com uma das fontes.
Autoridades europeias discutem há alguns meses um plano para criar um mecanismo de financiamento intergovernamental para a defesa, que poderia incluir o Reino Unido e a Noruega, e não a UE como um todo. Essa opção permitiria contornar o veto de países da UE que são neutros ou aliados da Rússia e não apoiam o uso de dívida conjunta para fins militares.
A opção de uma captação europeia também poderia ser mais palatável em capitais como Berlim, onde a perspectiva de outra rodada de dívida conjunta da UE é altamente polêmica, em especial com as eleições federais alemãs marcadas para o domingo.
No Reino Unido, um grupo de especialistas propôs um “banco de rearmamento” nos mesmos moldes do Banco Europeu para a Reconstrução e Desenvolvimento (Berd), no qual os governos participantes entrariam com o capital (um montante sugerido de 100 bilhões de euros), mas pagariam apenas 10% antecipados. O banco captaria o restante nos mercados de capital, beneficiado por uma boa classificação de crédito.
Na ausência de um consenso sobre a opção de um novo endividamento conjunto, as capitais europeias têm pressionado a CE a usar todos os fundos sob seu controle que ficaram sem ser usados.
Os 93 bilhões de euros em capacidade de captação remanescente da Linha de Crédito de Recuperação e Resiliência (RRF, na sigla em inglês) representam a parte não usada de um total de 800 bilhões de euros em subsídios e empréstimos aprovados pela UE para serem levantados em conjunto com o fim de estimular as economias de seus países após a pandemia. Várias capitais, incluindo Berlim, só concordaram com o fundo pós-pandemia sob a condição de que o endividamento conjunto fosse um evento único.
Aproveitar o financiamento não usado da RRF exigiria mudanças nas regras do fundo, que precisariam ser aprovadas pela maioria dos países da UE e pelo Parlamento Europeu, segundo um porta-voz da CE.
Os fundos remanescentes, que seriam alocados como empréstimos, poderiam ser usados para investir em projetos de pesquisa e desenvolvimento, assim como em projetos de infraestrutura de “uso duplo”, com aplicações civis e militares, como aeroportos. Outra opção cogitada pela CE é redirecionar os chamados “fundos de coesão”, destinados a regiões menos desenvolvidas da UE.
“Com base na nova abordagem, além de investimentos de uso duplo, a política de coesão pode agora apoiar o setor de defesa, tratando-o, em grande parte, como qualquer outra indústria”, de acordo com uma nota do departamento de fundos regionais da CE, à qual o “Financial Times” teve acesso.
“Investimentos em pesquisa e desenvolvimento diretamente voltados para o desenvolvimento de novas tecnologias para o setor militar o […] investimentos que fortaleçam as capacidades de produção dedefesa, agora, poderiam ser usados para contribuir com o desenvolvimento regional”, segundo a nota.
No fim de semana, Von der Leyen anunciou na Conferência de Segurança de Munique que os países da UE também poderão elevar seus orçamentos nacionais de defesa sem sofrer sanções sob as regras fiscais do bloco.
Um porta-voz de Von der Leyen não respondeu de imediato a um pedido para comentar o assunto.