Crise da dívida da Evergrande mostra bolha imobiliária na China

A crise da dívida da China Evergrande, a incorporadora imobiliária mais endividada do mundo, lançou uma nova luz sobre a saúde do mercado imobiliário chinês. 

De acordo com o Rushi Advanced Institute of Finance, os preços nos condomínios na cidade de Shenzhen, ao sul da China, são agora 57 vezes a renda média anual. Em Pequim, 55 vezes. Mesmo no auge da bolha econômica do Japão em 1990, os imóveis de Tóquio eram 18 vezes a renda média anual. 

Com as casas claramente fora do alcance das famílias médias, os investidores temem que o presidente chinês, Xi Jinping, possa tomar medidas para esvaziar a bolha, especialmente porque sua nova campanha de “prosperidade comum” prevê uma economia mais justa, na qual os frutos do desenvolvimento sejam mais amplamente compartilhados. 

Mas tais movimentos, como aconteceu no Japão, apresentam o risco de perfurar a bolha e desencadear uma espiral descendente, tornando um “pouso suave” imperativo. No entanto, isso pode ser mais fácil dizer do que fazer. O manejo incorreto da situação pode levar a economia chinesa a uma desaceleração econômica. 

No verão de 2020, o Banco do Povo da China (PBoC, na sigla em inglês) traçou três “linhas vermelhas” que as grandes incorporadoras imobiliárias precisavam observar em termos de sua situação financeira. Ao forçar as empresas imobiliárias a permanecer dentro de uma determinada relação dívidaativo, o banco central procurou dificultar que esses incorporadores aumentassem a alavancagem e despejassem dinheiro em um mercado imobiliário já aquecido. 

No mês passado, o governo Xi lançou uma campanha política com o tema “prosperidade comum” e com o objetivo de combater a desigualdade na China. Um dos principais elementos da desigualdade é o dinheiro que os ricos ganham com a especulação imobiliária. À medida que os investidores começaram a se preparar para um aperto do mercado, isso precipitou uma pressão descendente sobre os preços dos imóveis. 

Os investidores viram a enorme montanha de dívidas da Evergrande como algo talvez intransponível, o que levou a uma liquidação mais ampla do mercado de ações americano e japonês em setembro. 

A Evergrande agora está correndo para vender ativos e negócios. Mas mesmo que um colapso imediato seja evitado, a nuvem que paira sobre o mercado imobiliário chinês parece prestes a durar. 

Uma preocupação é que sinais semelhantes aos vistos antes do estouro da bolha no Japão, no início da década de 1990, são visíveis na China hoje. 

De acordo com o Banco de Compensações Internacionais (BIS), o crédito ao setor não financeiro da China cresceu dois dígitos nos últimos cinco anos e atualmente ultrapassa US$ 35 trilhões. 

Além disso, a proporção da dívida privada em aberto em comparação com o produto interno bruto (PIB) é agora de 220% na China, ultrapassando os 218% do Japão no auge de sua bolha. 

O setor imobiliário responde por pouco menos de 30% de todos os empréstimos pendentes na China, um número que é maior do que os 21% a 22% do Japão naquela época. 

Mas, ao contrário do Japão, onde o mercado de ações cresceu junto com o mercado imobiliário, a bolha da China está concentrada no setor imobiliário. Na década que antecedeu o final de 1989, quando o índice acionário Nikkei Average atingiu sua marca mais alta, os preços das ações subiram quase seis vezes. 

Na China, o SSE Composite Index aumentou apenas um fator de 1,5 em comparação com dez anos atrás. 

Uma vez que os preços dos imóveis começam a cair e o mito de que não importa quão altos os preços vão, sempre haverá compradores dispostos a pagar mais é destruído, tanto os indivíduos ricos que compraram casas com dinheiro emprestado quanto as empresas imobiliárias com estoque excedente devem vender rapidamente seus ativos. 

A queda dos preços vai apertar as empresas imobiliárias carregadas de dívidas, desacelerando o ritmo de construção de novas moradias. 

As novas habitações iniciadas na China caíram 1,7% no período de janeiro a agosto em comparação com o ano anterior. O Goldman Sachs estimou que um declínio de 30% nas novas construções em 2022 reduzirá o PIB real a 4,1%. 

No Japão, mais de 1.000 trilhões de ienes – o dobro do PIB do país – foram perdidos entre 1990 e 2005 em termos do valor total de terras e casas. 

O governo japonês optou por liquidar a inadimplência dos bancos por um longo período, mas com essa dívida continuando a se acumular, os bancos começaram a se recusar a emprestar, contraindo a economia. 

Em uma reunião do Politburo em julho, o Partido Comunista Chinês colocou por escrito a “estabilidade dos preços dos imóveis” como um de seus objetivos de política econômica. 

O governo não hesitará em intervir no mercado para evitar uma desaceleração repentina. No entanto, um ajuste no mercado imobiliário, como experimentou o Japão, poderia arrastar a economia da China para baixo, sobrecarregada pelo fardo dos empréstimos inadimplentes dos bancos. 

https://valor.globo.com/mundo/noticia/2021/09/27/crise-da-dvida-da-evergrande-joga-luz-sobre-bolha-imobiliria-na-china.ghtml

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