China “esquece” reformas e decide voltar a crescer

Os líderes da China deixaram claro que estão priorizando o crescimento sobre a reestruturação neste ano. Por outro lado, eles indicaram que vão tentar evitar a expansão do endividamento ou a criação de bolhas de ativos, ainda que estejam injetando volumes expressivos de dinheiro na economia.

O anúncio de uma meta de crescimento entre 6,5% e 7% para 2016, feito pelo governo durante o fim de semana, no início do Congresso Nacional do Povo, veio com o reconhecimento sutil de que alguns de seus esforços para fortalecer a desacelerada economia do país falharam, não conseguindo estimular os principais setores produtivos, como mostrou material do The Wall Street Journal, assinada por Mark Magnier e Lingling Wei, publicada no Valor de 07/03.

Em seu depoimento na sessão legislativa anual, que começou no sábado, o primeiro-ministro Li Keqiang prometeu cortes de impostos que podem deixar as empresas com mais dinheiro para investir. E, pela primeira vez, o governo chinês definiu o chamado financiamento social total – uma medida ampla de crédito que inclui empréstimos bancários e empréstimos não bancários – como uma métrica para ajudar na formulação das políticas monetárias.

No passado, os líderes diziam somente que o financiamento social total devia ser mantido em um nível apropriado, ao mesmo tempo em que definiam metas claras para o meio de pagamento M2, que inclui todo o dinheiro em circulação e a maioria dos depósitos bancários.

As duas medidas aumentaram muito nos últimos meses. Mas a medida dos meios de pagamento não consegue capturar como os bancos e as instituições financeiras usam os fundos. Por exemplo, o M2 saltou 13,3% no ano passado, enquanto o financiamento social total cresceu 12,4%, segundo dados oficiais. A discrepância indica que nem todos os depósitos foram usados pelos bancos para fazer empréstimos para as empresas. Em vez disso, alguns dos fundos foram utilizados para propósitos como empréstimos de margem para especular no mercado de ações.

Neste ano, as duas metas estão niveladas, com estimativas de crescimento de 13%.

“O governo está tentando mostrar de forma mais precisa para onde o dinheiro está indo, e se o crédito está sendo usado para apoiar a economia real”, diz Sheng Songcheng, diretor do departamento de pesquisa e estatística do banco central, numa entrevista ao “The Wall Street Journal”.

Os esforços anteriores da China para direcionar o crédito para empreendedores e outros setores desejados da economia fracassaram. E sua política monetária frouxa arrisca dar às empresas ineficientes mais espaço para que possam escapar de serem fechadas ou reformadas.

Parcela significativa do crescimento vertiginoso das últimas duas décadas foi impulsionada por investimentos e dívida por parte do governo. Preocupações com o aumento do crédito cresceram com a freada da economia.

Os passivos financeiros das empresas agora somam 160% do Produto Interno Bruto, ante 98% em 2008, segundo estimativas da empresa de classificação de risco Standard & Poor’s Financial Services LLC. A proporção se compara a cerca de 70% para as empresas americanas.

Empréstimos inadimplentes atingiram 1,67% da carteira dos bancos no fim de 2015, o maior nível desde junho de 2009. Analistas acreditam que o número não transmite a real dimensão do problema. Na semana passada, a empresa de classificação de risco Moody’s Investors Service rebaixou sua perspectiva para a dívida do governo da China, junto com a de outras 25 instituições financeiras e 38 estatais do país.

Xu Shaoshi, diretor da agência de planejamento da China, minimizou tanto a preocupação da Moody’s com o crescimento da dívida quanto os temores de demissões em massa, dizendo que algumas empresas reduziram a carga horária dos trabalhadores e os salários, mas mantiveram os funcionários na folha, e que novos empregos estão sendo criados no setor de serviços e por empresas privadas. “Todas as projeções de uma aterrissagem forçada não se concretizarão”, disse ele a repórteres nos bastidores do congresso.

A China afirma que precisa registrar pelo menos um crescimento de 6,5% até 2020 para dobrar a renda per capita em relação aos níveis de 2010 em tempo para o aniversário de 100 anos do Partido Comunista, em 2021.
Zhang Liqun, pesquisador do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento do Conselho de Estado, diz que a China pode conquistar um crescimento de 6,5% ao ano sem prejudicar as mudanças na economia. “O crescimento econômico e a reestruturação não são contraditórias”, diz ele.

Mas os planos da China para reestruturar as estatais são vagos, indicando que muitas das gigantes endividadas manterão acesso preferencial aos mercados e a financiamento barato, deixando em desvantagens os empreendedores com quem a China está contando para fortalecer a economia enquanto a manufatura, o comércio exterior e os investimentos enfraquecem.

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