Big Data, agora, ajuda até a compor música

Já faz algum tempo que empresas de diversos setores usam o Big Data – o enorme volume de dados proporcionado pelas novas tecnologias – para melhorar seus negócios. Pode ser um sistema que analisa os hábitos do usuário para sugerir filmes ou livros ou um programa que identifica tudo que consumidor põe em seu carrinho de supermercado. Agora, porém, a Oracle decidiu empregar o Big Data em algo inusitado: fazer música.
A companhia americana de software recorreu a algumas das principais redes sociais – Facebook, Twitter, Instagram e LinkedIn – para perguntar ao público que instrumentos, ritmos e até palavras gostaria de ouvir na nova versão da música “El Perdedor”, do cantor colombiano Maluma. Em pouco menos de um mês, alcançou 54,3 milhões de pessoas na América Latina, com 8 milhões delas respondendo às perguntas, como mostrou matéria de João Luiz Rosa, publicada no Valor de 9/06.
Os brasileiros foram maioria, com 40,7% dos comentários, seguidos dos venezuelanos (38,5%) e colombianos (7,3%). Desde que a experiência teve início, o total de pessoas envolvidas na web ultrapassa 61 milhões, com mais de 9 milhões de mensagens enviadas. No Twitter, o tema chegou a entrar nos “trend topics” global, a lista dos dez assuntos mais discutidos do mundo.
“Fiquei impressionado com o resultado”, diz o músico e produtor Dudu Borges, responsável pela nova versão da música, que tem participação da dupla brasileira Bruninho e Davi e é cantada em espanhol e português. Desde seu lançamento, no dia 30 de maio, o clipe acumula mais de 4,5 milhões de visualizações no site de vídeos Vevo.
A experiência continua. No estúdio do produtor, em São Paulo, duas grandes telas mostram, em tempo real, as interações das pessoas. É possível obter detalhes sobre cada mensagem – idade do internauta, sexo, região onde vive etc. “É uma coisa viva”, afirma Borges. “Mais importante que obter respostas é entender por que as pessoas pensam daquela maneira.”
Os internautas escolheram o pop como o ritmo mais identificado aos latino-americanos. Em seguida veio o rock. O samba apareceu em um distante terceiro lugar. O instrumento favorito, para surpresa de muitos, foi a bateria, à frente do violão e do piano. Ficou de fora a sanfona, quase indissociável de duplas sertanejas como a de Bruninho e Davi, convidada para o projeto.
O resultado musical reflete essas preferências – a nova versão da canção é mais pop, com ênfase na bateria. Dá para perceber a diferença em relação à gravação original, que é influenciada pelo reaggaeton, uma mistura de reggae com hip hop e música eletrônica. Maluma é um dos principais nomes dessa tendência, que explodiu com o porto-riquenho Luis Fonsi, autor de “Despacito”, primeira música latina a chegar ao primeiro lugar na Billboard em 20 anos. O antecessor foi “Macarena”, sucesso do fim dos anos 90.
No projeto foi usado um software de “social listening”. A tradução literal – escuta social – não dá conta da complexidade da tecnologia, que varre as redes sociais e os fóruns de discussão na internet para identificar palavras e assuntos que sejam de interesse de uma corporação, mesmo sem uma menção direta à marca ou nome da companhia. “O programa faz uma análise do sentimento que é exposto na rede e consegue mensurar se um comentário é neutro, positivo ou negativo”, diz Carmela Borst, vice-presidente de marketing da Oracle na América Latina.
No ano passado, o mercado latino-americano de Big Data e programas analíticos – softwares que ajudam a tomar decisões de negócios depois de analisar as montanhas de dados – movimentou US$ 2,48 bilhões, segundo a consultoria Frost & Sullivan. O Brasil representou a maior parte do bolo, com US$ 1,16 bilhão ou 46,8% do total. A projeção é que os negócios na América Latina cheguem a US$ 7,41 bilhões até 2022.
A Oracle não está sozinha nesse mercado. Disputa espaço com rivais como IBM, SAP e SAS. Com o projeto musical, que envolveu a agência de marketing Momentum, afiliada do grupo McCann-Erickson, e a Vevo, a Oracle tenta provar que os softwares de negócios estão mais fáceis de usar e podem ser adotados por muito mais empresas. É um cenário diferente dos primeiros tempos, quando os programas eram complexos e sua implantação ficava restrita a grandes companhias.
Um dos principais agentes dessa mudança, diz Carmela, é a nuvem, o modelo pelo qual o cliente não precisa implantar o software em suas máquinas. O pagamento é feito na forma de serviço, como se fosse uma conta de água ou luz.
Borges diz não ter encontrado muita dificuldade para aprender a usar a tecnologia. No princípio, conta, houve um certo receio de que o software pudesse tornar mais frio o ato de compor – uma tarefa semanal para ele e diária para sua equipe. Em pouco tempo, porém, o medo passou. “Este é um mundo que dá mais segurança para que você faça o que já sabe fazer”, afirma o produtor. “No campo da arte, a tecnologia não faz nada sozinha.”

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