Ainda não é hora do ‘réquiem’ para os PCs

Não é de hoje que se anuncia a morte do computador pessoal. A extinção dos PCs tem sido alardeada há anos, desde que smartphones e tablets começaram a assumir funções que pertenciam exclusivamente a esses equipamentos. Mas para a Dell – uma das três maiores fabricantes mundiais do setor – o fim não está próximo. Ao contrário, os aparelhos são parte essencial de uma nova frente de negócios da companhia americana: vender computadores como serviços.

Lançado recentemente, o modelo está voltado para o mercado empresarial. Em vez de adquirir um parque de máquinas novo – que terá de ser renovado mais cedo ou mais tarde – o cliente paga uma taxa mensal para usar os PCs, que vêm acompanhados de um pacote de serviços de manutenção e segurança cibernética, entre outros itens. O cliente pode encomendar aparelhos sob medida, além dos softwares de que precisa. Ao fim do contrato, a máquina é devolvida ao fabricante, como uma espécie de leasing com benefícios adicionais., como mostrou matéria do Valor, assinada por Rodrigo Carro, em 10/05.

“O PC continua a ser central dentro dos negócios da companhia”, assegurou o fundador Michael Dell, diante de uma plateia estimada em 13,5 mil pessoas, durante um evento organizado nesta semana pela Dell EMC na cidade de Las Vegas.

A competição não é fácil. Em um mercado que vinha encolhendo até recentemente, a Dell enfrenta a concorrência de rivais asiáticos dispostos a fisgar consumidores com preços mais baixos. Mesmo assim, Michael Dell – 38a pessoa mais rica do mundo, segundo a revista “Forbes”, com uma fortuna de US$ 20,4 bilhões – vê espaço para crescer no setor. “Para nós, os preços médios de venda de PCs têm aumentado, não baixado. E as receitas com PCs têm crescido, assim como a nossa participação de mercado”, disse o empresário.

Há 17 trimestres consecutivos a Dell vem aumentando sua fatia no mercado de PCs. A expectativa na companhia é que o resultado positivo se repita pelo 18o trimestre consecutivo.

“Há um espaço disponível de US$ 170 bilhões e estamos bem posicionados [para conquistá-lo]”, disse Dell, numa referência ao mercado sobre o qual a companhia ainda pode avançar. A estratégia de “roubar” espaço da concorrência é uma forma de compensar o enfraquecimento da demanda. Dados da consultoria IDC indicam crescimento tímido no mercado global de computadores pessoais, após anos seguidos de retração. No primeiro trimestre de 2017 houve expansão de 0,6% nas remessas de PCs em comparação com o mesmo período do ano anterior. Mesmo pequena, a variação positiva (em termos anuais) é a primeira registrada desde o primeiro trimestre de 2012. O desempenho leva em conta não só os equipamentos de mesa ou desktops como também os notebooks.

Criada em 1984, a Dell detinha, ao fim do primeiro trimestre deste ano, 15,9% do mercado global de PCs. Pelo critério de unidades enviadas para venda, a empresa ocupava a terceira posição nos rankings da IDC e do Gartner, atrás de HP e Lenovo.

Como outras gigantes que nasceram voltadas ao mercado de equipamentos, a Dell está tendo de se adaptar a um ambiente tecnológico no qual, cada vez mais, programas e dados podem ser acessados via internet, por meio da nuvem computacional, a partir de uma variedade de dispositivos móveis – e não apenas por meio do PC.

A estratégia de oferecer equipamentos como parte de um pacote de serviços é recente na Dell. “Esse ainda é um negócio em desenvolvimento”, afirmou Marc Stein, vice-presidente sênior e responsável pela área de relacionamento com o cliente da companhia. “É nossa habilidade de gerenciar todo o ciclo de vida do produto que nos torna únicos.”

Além do PC como serviço, a Dell passou a oferecer o chamado “PC virtual”. Trata-se, basicamente, de um teclado e um monitor, sem o cérebro do computador (a CPU). Os fabricantes já fizeram tentativas semelhantes de vender esse tipo de aparelho no passado – no que ficou conhecido como “thin client” ou terminal “burro”. A diferença, agora, é a facilidade que a nuvem proporciona aos usuários para que os dados sejam acessados via internet.

No Brasil, onde prevalece o modelo tradicional de venda de computadores, começa a haver interesse maior das empresas pela aquisição de pacotes de serviços associados ao PC, principalmente na área de segurança, disse Luís Gonçalves, vice- presidente da Dell no país. Há também uma procura maior por serviços de garantia estendida, com objetivo de aumentar a vida útil das máquinas, afirmou o executivo. “Se antes o cliente [empresarial] trocava de computador a cada três anos, agora espera quatro”, disse.

Atualmente, os três maiores fabricantes de PCs concentram 58% do mercado global. A tendência é que o segmento se consolide ainda mais, por conta da dificuldade que as companhias menores têm para atingir uma economia de escala semelhante à obtida por Dell, HP e Lenovo.

“Vemos esse processo [de concentração] se acelerando”, disse Stein ao Valor. “Se olharmos para a fatia de mercado que os cinco maiores fabricantes de PCs tinham dez anos atrás e compará-la à de cinco anos depois e à atual, a linha avança apenas numa direção: os maiores competidores tirando participação de mercado dos menores”.

Em meio a esse cenário de competição acirrada e mudanças tecnológicas aceleradas, Stein frisa, com bom humor, que não acredita na derrocada dos computadores pessoais: “Eu entrei para a Dell 13 anos atrás. E me lembro de alguns colegas comentarem na época: ‘Você está indo para Dell? Achei que os PCs estivessem morrendo!'”

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