O mau uso do cartão de crédito tem “efeitos colaterais” tão graves quanto tomar remédio errado. A lógica do processo de endividamento – aliás, 40% dos endividados com os bancos têm menos de 29 anos – é assunto com diferentes conotações. O professor Pedro de Santi, da Psicologia da ESPM, sugeriu ao Nota Alta discussão sobre o tema a partir de texto publicado pela Folha em 15/08. A íntegra desse texto está abaixo.
Educação financeira evita que crédito comprometa orçamento
Samy Dana
Miguel Bandeira
Políticas de estímulo ao consumo via acesso ao crédito são usadas com sucesso desde o fim do governo Lula.
Hoje, com a Selic em seu mínimo histórico e a redução dos “spreads” bancários, podemos afirmar que o brasileiro nunca teve tantas facilidades de acesso ao crédito.
Contudo, os efeitos colaterais dessas políticas estão cada vez mais evidentes.
Segundo a ProTeste, as famílias brasileiras comprometem, em média, 42% da sua renda com o pagamento de dívidas. As linhas mais utilizadas são o cartão de crédito e o cheque especial, que em inúmeros casos ultrapassam a taxa de 200% ao ano.
Os números são alarmantes e devemos refletir sobre a principal causa desses resultados: a (falta de) educação.
Apesar de ser a sétima economia do mundo, o Brasil amarga o posto de 88º país no ranking de educação da Unesco, quase metade dos trabalhadores brasileiros sequer completam o ensino fundamental e cerca de 16% são analfabetos funcionais.
Tal precariedade faz com que muitos usem o crédito seguindo a “lógica da parcela no bolso”, ou seja, o brasileiro observa apenas se a parcela cabe na sua renda, sem se preocupar com juros abusivos e com o custo total.
Além disso, por permitir a aquisição de bens até então inacessíveis, o crédito causa uma espécie de deslumbramento que leva as pessoas a parcelar uma quantidade cada vez maior de compras.
A certa altura, são tantas as parcelas que fica até mesmo difícil de o consumidor se lembrar de todas, o que induz a uma espécie de “bola de neve”, pois muitas famílias contraem novos empréstimos com juros mais altos para pagar dívidas antigas.
O crédito é como um carro: pode melhorar as nossas vidas, mas, quando em mãos de pessoas que não sabem usá-lo, pode ser catastrófico.
Por isso, para manter a sustentabilidade do crédito no Brasil, é imprescindível investir em educação.
SAMY DANA é Ph.D em finanças e professor da EESP-FGV. MIGUEL BANDEIRA é graduando em economia pela EESP-FGV, consultor e conselheiro da CJE-FGV.