Trumbo – Lista Negra (Dir. Jay Roach, EUA, 2015)

Eduardo Benzatti

Filmes que retratam o Macarthismo (período entre o final dos anos 40 e meados dos 50 – do século passado -, nos EUA, em plena Guerra Fria, de intensa perseguição a qualquer pessoa ou atividade julgada anti-americana e/ou simpática ao comunismo) o cinema já produziu vários (como exemplo cito o bom “Boa noite, boa sorte” de 2005, dirigido por George Clooney. Até Woody Allen visitou esse período em “Testa de ferro por acaso (1976)).

Mas, “Trumbo – Lista Negra” é bem acima da média em relação aos outros. O filme nos apresenta a história (real) do roteirista Dalton Trumbo (Bryan Cranston) que foi acusado, perseguido e preso por conta da sua filiação ao Partido Comunista Americano (ainda quando esse estava na legalidade). Excelente escritor e roteirista – muito requisitado, na época, pelos estúdios e diretores de Hollywood (o homem ganhou – utilizando pseudônimos – os Oscar (ou Óscares) de Melhor História Original por “A Princesa e o Plebeu” (1953) e “Arenas Sangrentas” (1956). Ainda posteriormente teve seu nome acrescido aos créditos de “Exodus” (1960) e “Spartacus” (1960)), caiu em desgraça quando se recusou a cooperar com o Comitê de Atividades Antiamericanas do Congresso Americano.

Depois de um tempo na prisão, Trumbo começou a trabalhar em roteiros de filmes mais populares para poder sobreviver – sempre utilizando outros nomes – e criou uma complexa rede de escrita e distribuição dessas histórias para poder ajudar ($) seus outros colegas também perseguidos – parte desses formavam a tal “Lista Negra” que circulava pelos estúdios de Hollywood não permitindo que fossem contratados – encabeçando esse movimento de “caça aos comunistas” estavam os atores Ronald (Wilson) Reagan e John Wayne.

Trumbo era acusado de “comunista”, pois defendia certa justiça social, igualdade de direitos raciais e uma maior participação política dos roteiristas juntos aos estúdios – o que na época (Guerra Fria) não era tolerado pela “democracia” Americana – os Liberais se encontravam enfraquecidos e acuados perante uma divisão do mundo tão bipolar. Com receio da “ameaça comunista” (leia-se Stalinismo) os conservadores tinham a simpatia da maior parte da população.

A discussão político-ideológica (e suas sutilezas e matizes) foi resumida em “Pró-America” e “Anti-America”. Assim, Trumbo, um burguês rico e sofisticado em seus gostos (além de um amigo leal e solidário) foi visto como um “comunista radical” e, logo, uma ameaça ao sistema – ainda mais, por escrever as histórias que o povo assistiria nos cinemas -; parece que na época somente a direita mais conservadora percebeu o poderoso papel ideológico do cinema.

O filme acerta também ao focar mais na questão do protagonista e na relação com sua família e amigos mostrando como esse tipo de política que excluí o diferente até eliminá-lo social e individualmente foi responsável pela destruição da vida (em muitos casos, literalmente) de milhares de cidadãos norte-americanos para ao final, o Estado não provar a existência real de nenhuma ameaça ao modo de vida – ou a Democracia Liberal – daquele país. A paranoia de uma parcela política ultraconservadora destruiu boa parte da intelligentzia dos EUA – muitos intelectuais e artistas foram presos, ou acabaram na miséria desempregados, ou se suicidaram, ou deixaram o país (o caso mais célebre foi o de Charles Chaplin).

É estranho verificar que ainda hoje – mesmo com (praticamente) o fim das ideologias radicais de esquerda, algumas pessoas ainda vivam nessa mesma paranoia – fruto da desinformação política e da confusão ideológica dos nossos tempos – e confundam aqueles que lutam por um mundo mais justo, melhor e igualitário com “perigosos comunistas” e os descriminem. É… ainda há muitos Trumbos por aí.

(Em tempo: uma curiosidade sobre esse escritor/roteirista que o filme não informa. Ele escreveu o romance Johnny Vai à Guerra (1939), uma história pacifista que foi inspirada em um artigo que Trumbo leu sobre um soldado da Primeira Grande Guerra que ficou desfigurado. Em 1971 ele adaptou e dirigiu a história para o cinema – o roteiro de Papillon (dirigido por Franklin J. Schaffner) também é seu (escrito em parceria com Lorenzo Semple Jr.).

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