Eduardo Benzatti
“O Clã” (do diretor Pablo Trapero – dos interessantes: “Família Rodante”, “Abutres” e “Elefante Branco”) é um filme impactante do início ao fim. Trata-se da história real dos “Puccios” – família que ficou muita conhecida na década de 1980, na Argentina, pelos seus crimes.
O pai da família, Arquímedes (Guillermo Francella), com a ajuda e cumplicidade de seus dois filhos, em especial, Alejandro (Peter Lanzani), assim como de alguns amigos, comandava uma espécie de um grupo paramilitar – mais de militares aposentados do que na ativa – que sequestrava e matava várias pessoas.
A história se passa entre os momentos agonizantes da terrível Ditadura Militar dos nossos vizinhos (Guerra das Malvinas) e o início do processo de redemocratização (a eleição de Raúl Ricardo Alfonsín que governou o país de 1983 a 1989, pela União Cívica Radical), ou seja, o grupo se aproveitava dos diferentes momentos políticos para atuar também da forma mais adequada: no início sequestrava – parentes de pessoas ricas – e atribuía a sua ação aos grupos de esquerda ligados à luta armada contra a Ditadura – e tinha a cumplicidade de setores das Forças Armadas (o patriarca do clã trabalhava no setor de Inteligência do Exército); com o fim do regime autoritário, o grupo começou a atuar de forma autônoma e sem apoio dos militares.
As interpretações são impressionantes (em especial, a postura fria, tranquila e ameaçadora do pai – o ator Guillermo Francela é um comediante!) – há um “naturalismo” nas atuações dos atores do cinema sul-americano que parece faltar nos nossos. A trama é bem construída – o filme tem “pitadas” de suspense, violência, trailer policial e político.
A família agia no seu cotidiano como se nada de extraordinário estivesse acontecendo, embora o cativeiro fosse em uma das dependências da casa! A mãe cozinhava para todos – inclusive para os sequestrados; os filhos ajudavam na limpeza do cativeiro, mas nada era claramente falado – o silêncio era parte de um “acordo implícito” entre os membros desse clã – ninguém sabia, mas todos sabiam que algo de errado se passava naquele ambiente familiar – onde não faltava amor, afeto, troca de carinho e atenção entre seus membros. Ninguém da família foi vítima, todos foram – de uma forma ou de outra – cúmplices.
Produzido por Pedro Almodóvar e Agustín Almodóvar, o filme deixa o espectador tenso do começo ao fim – até a última cena é surpreendente, assim como saber do destino de alguns dos personagens centrais através de pequenos textos ao final.
Bom, enquanto isso aqui no Brasil, nosso cinema continua oscilando entre a “estética da violência” e as “comediazinhas globais”.