Cézar Veronese – Professor do CPV Vestibulares
No poema “Morte das Casas de Ouro Preto”, do livro CLARO ENIGMA, Drummond discorre sobre a passagem do tempo a partir do esfarelamento das casas de taipa. (A taipa é uma mistura de argila e cascalho muito usada no período colonial). O poeta constata a nobreza dos casarões, os casamentos das donzelas com os varões, a incomensurável riqueza do ouro… Um mundo de poder e riqueza que se finou com a passagem do tempo…
O tempo, essa categoria que desafia classificações, é, digamos, menos palpável que o espaço. Por isso suas transformações, são, em geral, imperceptíveis embora devastadoras. Esse é um dos temas por excelência da sermonística de Vieira e da grande poesia barroca espanhola. Brás Cubas, por sua vez, no seu esnobismo do capítulo em que elenca máximas que não caberão em seu livro, deixa, de lambuja, entre outras, esta máxima (“para escritores sem ideias”): “Matamos o tempo; o tempo nos enterra”.
Em outra chave, no feérico do mundo pós revoluções industriais, o acelerador é outro e o tempo já não se manifesta tanto à francesa E no Brasil, num curtíssimo período de tempo, estamos assistindo a “transformações” que desafiam as explicações filosóficas do tempo. Em um ano, as autoridades conseguem quase quebrar a maior estatal do país. E os políticos, cujas fichas sujas já destroem até arquivos magnéticos, são reeleitos para cargos da cúpula do governo (onde a memória, essa outra forma do tempo?).
A água fenece a olhos nus, os reservatórios coam-se como o café na frente do nariz das autoridades e elas o provam e querem mais. E aí abrimos o jornal no dia seguinte e somos informados de que os traficantes dos morros do Rio estão cobrando uma taxa de água para a população ter acesso a alguns precários baldes.
Nesse ritmo, numa suspeita tétrica, não demorará o tempo dos sequestros em troca de um copo de água. A água da manhã primeira, que matou a sede de Adão.
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