Biden quer focar na China, mas Putin não deixa

O presidente Joe Biden finalmente iniciou a “guinada para a Ásia”, um ajuste há muito buscado da política externa americana para melhor refletir a ascensão do concorrente militar e econômico mais significativo dos EUA: a China.

Mas a invasão da Ucrânia pela Rússia tornou esse complexo movimento ainda mais complicado. O governo da China vacilou entre a aceitação total e respostas mais comedidas enquanto o presidente russo, Vladimir Putin, seguia com a sua guerra, tornando as decisões para Biden muito mais complexas.

Resta ao governo Biden focar no Oriente e no Ocidente ao mesmo tempo, equilibrando não apenas imperativos econômicos como também imperativos militares.

“É difícil. É caro”, disse Kurt Campbell, coordenador de Assuntos Indo-Pacíficos do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, durante recente fórum, sobre a manutenção de um foco dos EUA de alto nível em duas regiões. “Mas também é essencial, e acho que ingressamos em um período em que é isso que será exigido dos EUA e desta geração de americanos.” 

Biden investiu profundamente em mobilizar a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e aliados ocidentais para responder à Rússia com sanções altamente prejudiciais, em fornecer à menor força militar ucraniana uma assistência militar de US$ 2 bilhões e ajuda para o país enfrentar uma crescente crise humanitária. 

Os aliados da Otan na frente oriental, incluindo Estônia, Letônia, Lituânia, Polônia e Romênia, deixaram claro ao governo Biden que querem que os EUA aumentem sua presença militar na região e façam mais para enfrentar a pior crise humanitária na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. 

Embora a guerra na Ucrânia tenha dominado o foco de Biden ultimamente, a Casa Branca insiste em dizer que não perdeu a China de vista, e que está observando a situação para ver como Xi vai agir. 

A equipe de segurança nacional de Biden ficou um tanto surpresa com a rápida movimentação dos parceiros do Pacífico – Austrália, Japão, Nova Zelândia, Cingapura e Coreia do Sul – para impor sanções à Rússia após a invasão, segundo uma autoridade bem-informada da Casa Branca. 

Segundo essa fonte, há um reconhecimento entre os aliados do Pacífico de que Pequim está observando como o mundo reage à Rússia, num momento em que a China calcula com que grau de agressividade pode se comportar com vizinhos de menor porte na região. Nas sanções de apoio, os países do Pacífico tentaram enviar um recado para Xi, na mesma medida que para Putin, acrescentou a fonte. 

A posição da China sobre a invasão russa causa preocupações em Washington. A Casa Branca já deixou claro a Pequim que lançar uma tábua de salvação para a economia em colapso da Rússia ou ajudar suas forças armadas seria perigoso para um país que se vê como a próxima grande potência mundial. A Casa Branca não especificou que ações pode tomar se a China ajudar a Rússia. 

“Não precisamos que a China esteja conosco. Só precisamos que não esteja contra nós”, disse Frank Jannuzi, presidente da Maureen and Mike Mansfield Foundation, cujo foco são as relações EUA-Ásia. 

Xi e Putin se encontraram no início de fevereiro, semanas antes da invasão, quando o líder russo foi a Pequim para a abertura dos Jogos Olímpicos de Inverno. Na ocasião, eles soltaram um comunicado em que declaravam uma “amizade” sem limites. 

Nos dias que se seguiram à invasão ordenada por Putin, o governo de Xi tentou se distanciar da ofensiva russa, mas evitou criticar Moscou. O governo chinês se ofereceu para atuar como mediador e condenou as sanções comerciais e financeiras contra a Rússia. Pequim também procurou usar o conflito para acentuar a ascendência chinesa e o declínio do Ocidente. 

Mas a China tem seus próprios problemas, como uma grande desaceleração econômica, dificuldades que as sanções contra a Rússia podem agravar. “A guerra na Ucrânia evoluiu de maneiras que a China não esperava, e a guerra não é favorável à ascensão ou ao desenvolvimento da China”, disse Xiong Zhiyong, professor de Relações Internacionais da Universidade de Relações Exteriores da China. 

Apesar disso, os temores de que a China possa ajudar a Rússia aumentaram na Casa Branca nos últimos dias. Ryan Hass, ex-diretor para China, Taiwan e Mongólia no Conselho de Segurança Nacional durante o governo de Barack Obama, disse que Pequim está diante de uma “decisão histórica” sobre se deve ou não ajudar a Rússia. “Se Xi decidir fazer isso] tenho dificuldade em perceber como o caminho poderá permanecer aberto para a China manter relações não hostis com os EUA e outros países no Ocidente”, disse Hass. 

https://valor.globo.com/mundo/noticia/2022/03/18/biden-quer-focar-na-china-mas-putin-nao-deixa.ghtml

Comentários estão desabilitados para essa publicação