“Votei em José Antonio Kast”, afirma Edgar Casanova, um venezuelano de 31 anos com direito a voto no segundo turno das eleições presidenciais do Chile. Muitos outros venezuelanos farão o mesmo, embora Kast afirme que todos os imigrantes em situação irregular — a maioria venezuelanos — devem deixar o país ou serão deportados. Essa decisão se deve, em parte, ao fato de a alternativa ser Jeannette Jara, do Partido Comunista. “Sinto pena das pessoas que estão sem documentos”, diz Casanova, “mas os comunistas me assustam mil vezes mais”.
O tom moderado e a imprecisão calculada de Kast também ajudam a acalmar os temores. Ele declarou à revista The Economist que aqueles que entraram ilegalmente no Chile têm uma escolha: podem partir agora com seus pertences ou mais tarde sem eles. Ele evita, de forma ostensiva, mencionar deportações diretamente. “Todos têm que tomar suas próprias decisões livremente”, diz ele. “Sei que é difícil, mas temos que fazer cumprir a lei”.
A vitória de Kast é impulsionada principalmente pelo medo da população em relação ao crime e à imigração. O presidente atual, Gabriel Boric, tem sido o líder mais à esquerda do Chile desde o retorno à democracia em 1990; Kast seria o mais à direita. Ele promete deportações, prisões de segurança máxima e cortes de gastos. Em outros países, tais políticas frequentemente prenunciaram a erosão da democracia e do Estado de Direito. Kast promete provar que esse não precisa ser o caso.
O Chile está saindo de um período de instabilidade política. Em 2019, eclodiram enormes protestos de rua, provocados pelo aumento das passagens do metrô e sustentados pela revolta contra a desigualdade. Isso impulsionou Boric à vitória em 2021, com a promessa de “refundar” o Chile por meio de uma nova constituição. Uma assembleia constituinte produziu um projeto tão utópico que os chilenos o rejeitaram de maneira contundente. Uma segunda tentativa, liderada por conservadores, também foi rejeitada.
Enquanto isso, a imigração, a criminalidade e uma economia lenta empurraram os eleitores para a direita. Entre os 20 milhões de habitantes do Chile, há 2 milhões de imigrantes. Cerca de 337.000, quase todos chegados a partir de 2018, não tem autorização legal.
A criminalidade aumentou drasticamente, especialmente os crimes violentos cometidos por gangues. Isso gerou nos chilenos um medo desproporcional da violência em comparação a quase qualquer outro lugar do mundo. Em uma pesquisa com 144 países, o Chile ocupa o sexto lugar em medo de andar sozinho à noite, muito acima de mexicanos ou até de malineses, que vivem em meio a uma guerra civil. Estatisticamente, o Chile é tão seguro quanto os Estados Unidos, com homicídios concentrados em alguns municípios e taxas caindo. Ainda assim, os imigrantes são frequentemente culpados — sem muitas evidências — pelo aumento da criminalidade.
Esta é a terceira candidatura presidencial de Kast. Ele mantém laços com líderes de direita em todo o mundo, mas permanece distintamente chileno. Seu conservadorismo é típico de uma parte da elite do país: é contra o aborto sem exceções e opôs-se ao uso de métodos contraceptivos por sua esposa. Certa vez, declarou que Augusto Pinochet, ex-ditador militar do Chile, “votaria em mim se estivesse vivo”. Seus instintos de livre mercado são classicamente chilenos. No entanto, na questão da imigração, ele segue a cartilha de Donald Trump.
Ele promete um “governo de emergência” focado não em seus valores sociais (a “pauta de costumes”), mas na imigração, no crime e na economia. Pode-se esperar o uso de soldados e drones para tentar fechar a fronteira a imigrantes irregulares; os deportados provavelmente serão fotografados sendo levados à força para aviões.
A Venezuela recusa-se a receber deportados do Chile. A menos que Trump consiga derrubar Nicolás Maduro, o ditador entrincheirado no poder, é improvável que isso mude. Kast insiste que o cenário mudará. Mesmo que esse obstáculo seja superado, a logística de deportar tanta gente será complexa. Em 2024, o Chile emitiu mais de 12.000 ordens de expulsão, mas conseguiu deportar apenas 1.100 pessoas — cerca de três por dia. Mesmo que Kast consiga aumentar em dez vezes esse ritmo, ainda levaria 30 anos para deportar todos os 337.000 irregulares. Ele sugere que muitos partirão antes de sua posse, facilitando a tarefa. Talvez.
Kast minimiza o uso da força nas deportações: “Nossa abordagem é muito clara: sem violência, apenas aplicando a lei. Não preciso sair armado para procurar ninguém: vocês virão até mim”. A lógica é que, ao tentarem usar serviços públicos, os imigrantes ilegais serão identificados e detidos — e, supostamente, se entregarão pacificamente. Seu plano de governo diz que eles ficarão em campos de detenção enquanto aguardam a deportação, uma proposta cara. Especialistas acreditam que Kast terá de regularizar a situação de alguns imigrantes para reduzir a dimensão do problema, algo que ele insiste que não fará.
Seus planos de segurança resumem-se à política de mano dura (mão de ferro): sentenças mais severas e prisões de segurança máxima, com isolamento para criminosos perigosos. Novas prisões são necessárias, já que as atuais operam com cerca de 140% da capacidade. Contudo, a taxa de encarceramento do Chile já é a terceira maior da América do Sul e uma das mais altas do mundo. Kast também propõe enviar soldados para fechar a fronteira e patrulhar redutos de gangues. A medida é controvertida, dado o histórico da ditadura militar no país.
As preocupações dos chilenos com a segurança podem, assim, diminuir. Mas uma redução sustentada da criminalidade exige políticas mais sofisticadas, às quais Kast dedica menos atenção: melhor inteligência policial sobre as gangues, programas para impedir o recrutamento de jovens vulneráveis e reintegração social de ex-detentos.
Na economia, sua plataforma é vigorosamente pró-mercado. “O Estado não cria empregos e riqueza. O Estado destrói”, diz seu manifesto. Uma de suas prioridades mais sensatas é a desburocratização. Outra é a redução de impostos corporativos. Ele propõe cortar os gastos públicos em US$ 6 bilhões — o equivalente a 7% do orçamento anual — nos primeiros 18 meses de governo, sem tocar na previdência social.
Muitos economistas consideram a meta extremamente otimista. O governo gastou mais do que arrecadou durante anos, então cortes podem ser prudentes. Mas, como a dívida chilena ainda é relativamente baixa, questiona-se a sensatez de cortes tão profundos, que provavelmente desacelerariam o crescimento. Ainda assim, Kast afirma que, sob suas políticas, a economia poderia crescer 4% ao ano, bem acima da previsão de 2,4% para 2025. “Não ouvi nada que sugira que eles poderiam mudar a taxa de crescimento [dessa forma]”, diz Andrés Velasco, ex-ministro da Fazenda de centro-esquerda.
Jorge Quiroz, assessor econômico de Kast, é o favorito para assumir o Ministério da Fazenda. Ele apresenta ideias para todos os setores. Embora interessado em reduzir a burocracia, parece mais um consultor de gestão do que um ideólogo do livre mercado. Ele nega inspirar-se em Javier Milei, presidente da Argentina. “O problema do governo é a gestão”, afirma.
Kast não terá maioria no Congresso. Provavelmente obterá apoio para muitos de seus planos sobre imigração e segurança, mas os legisladores chilenos tendem a ser indisciplinados e podem rebelar-se contra suas políticas mais radicais, como a expansão do papel do exército.
Há preocupação sobre como ele reagiria a contratempos. Sua estratégia é “invalidar opiniões diferentes, ridicularizá-las, estigmatizá-las e desqualificá-las”, diz Carolina Tohá, importante política de centro-esquerda cuja candidatura presidencial fracassou. “É assim que a democracia começa a se deteriorar.” Kast afirma que pode ser duro com o crime e a imigração e, ainda assim, ser um democrata. Ele agora terá a chance de provar isso.
