Guia politicamente incorreto de liderança

Rose Mary Almeida Lopes

Uma das formas mais fáceis de educação é a imitação. Imitando pessoas que sabem fazer aquela atividade, resolver aquele problema ou solucionar a situação.

Focalizando a liderança, o desenvolvimento do líder é muito influenciado pelos modelos que tem e teve, além de características pessoais e do próprio repertório.

Espelhamos mais facilmente os valores, as atitudes, os comportamentos e a forma de conduzir-se daqueles que admiramos e que encarnam o modelo pessoal, profissional e até o modo de vida desejados.

Entretanto, há um certo perigo de contágio, pois o ambiente cultural, o que vira norma, os muitos exemplos de descaminhos e até certa pressão para não destoar dos demais, podem encantar com caminhos mais fáceis de chegar ao que a pessoa escolheu como sucesso.

Cada vez que assisto a um episódio protagonizado por uma de nossas “lideranças” fico inspirada a escrever um guia politicamente incorreto de liderança. Seguem algumas pérolas!

Logo de início recomendamos que o líder negue qualquer responsabilidade pelas decisões tomadas quer pelo conselho que preside ou pelos resultados da sua empresa.

Afinal, você como líder não está lá para vigiar os atos dos executivos, tampouco para contestar pareceres e recomendações de consultorias ou de técnicos. Não se espera que você conheça os detalhes das operações propostas. Isto seria pedir demais!

Você está no alto da torre somente para ver a paisagem de mais alto e desfrutar o cenário que nenhum outro pode descortinar. Seu tempo deve ser empregado de outra forma: não se preocupe em conhecer os assuntos sobre os quais decidirá e que representam apenas alguns milhões ou bilhões de reais! Se você errar, de onde vem este dinheiro, virá muito mais!

Recentemente um ex-presidente de uma grande empresa brasileira declarou que era impossível detectar os mal-feitos dos funcionários. Garantiu que os atos de corrupção não poderiam ser captados por quaisquer processos ou procedimentos internos. Só externamente e com ajuda da polícia.

Levando esta recomendação ao pé da letra, então, não gaste à toa com auditorias internas, pois estas não conseguem mesmo levantar desvios, muito menos com auditorias externas. As áreas de compra também não podem saber os preços médios de mercado.

Também não peça para levantar dados sobre o comportamento dos funcionários, e nem observar os relacionamentos e mudança de padrão de consumo. Seria inútil tentar!

Outra dica: quando você estiver num evento público, abordando situação delicada, de crise mais ampla e institucional, não se espera dee você um discurso conciliatório. Espera-se que você bote mais lenha na fogueira, afirme saber brigar e ameace acenando recorrer a grupos fora do espectro legal da empresa ou organização. Sua liderança vai ficar mais forte!

Outra lição foi estrelada por um vice-governador em exercício. Ao saber-se incluído na lista de suspeitos da corte máxima da justiça, xingou em público com palavras de baixo calão os responsáveis por sua inclusão.

Achamos mesmo que ele está coberto de razão, o líder deve adotar postura de macho alfa. Bater no peito negando qualquer ato errado. Afinal, isto vai repercutir muito rápido, e você vai ganhar muitos minutos de fama e de popularidade.

Para fechar: se você ocupar posição em que se espera neutralidade, zelo pelo que não é seu e resistir à tentação de desfrutar das materialidades, que mal tem dar só uma voltinha com o que não lhe pertence? Ora, você é poderoso, pode até sumir com o processo, abrindo caminho para pegar um dinheirinho apreendido, não é mesmo?

Tudo isto seria cômico se não correspondesse ao que estamos assistindo das mais altas autoridades públicas do nosso país. Assim, mesmo aquelas que tinham um grande capital de liderança e de influência, o estão perdendo rapidamente por seguir estes (e outros mais) passos deste manual de como não ser líder.

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