Países pedem a EUA e China que evitem guerra comercial

Um grupo de 38 países desenvolvidos e emergentes, incluindo o Brasil, apresentam hoje na Organização Mundial do Comércio (OMC) um comunicado conclamando os parceiros a evitar uma guerra comercial, que seria desastrosa para a economia global.
O documento, ao qual o Valor teve acesso, foi articulado pela Suíça, conhecida por seu perfil politicamente neutro, e coincide com crescente preocupação de confronto entre EUA e China, as duas maiores economias do mundo.
Os 38 países destacam que o sistema multilateral de comércio é de importância central para suas economias e para a estabilidade econômica global. Declaram-se encorajados pelas projeções de crescimento do comércio mundial, publicadas pela OMC. Mas se dizem inquietos com as “crescentes tensões comerciais e riscos para o sistema multilateral e o comércio mundial”.
O grupo pede para os membros da OMC se absterem de adotar medidas protecionistas e evitar riscos de escalada, e a resolver suas divergências através de diálogo e cooperação, utilizando por exemplo o Orgão de Solução de Controvérsias, espécie de corte suprema do comércio internacional.
Em encontro informal dos chefes de delegações ontem, a China declarou que “fará tudo” pelo avanço do comércio e acusou os EUA de adotarem “unilateralismo e protecionismo que colocam um estresse sem precedentes no sistema multilateral de comércio”, segundo relato de participantes.
Depois do fiasco de negociações entre Pequim e Washington, na semana passada, o representante comercial americano, Robert Lighthizer, disse que tarifas poderiam ser impostas já no dia 22 deste mês em importações originárias da China no valor de US$ 50 bilhões. Os chineses já retrucaram que vão responder com tarifas com similar montante contra produtos americanos, o que levou Donald Trump a ameaçar com alíquotas adicionais de US$ 100 bilhões sobre mercadorias chinesas.
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O governo Trump colocou a barra muito alta na negociação com a China. Primeiro, ao exigir de Pequim um corte de US$ 200 bilhões no superávit comercial chinês com os EUA até o fim de 2020. Isso significa reduzir cerca de 60% do saldo chinês em três anos, algo longe de ser aceito.
Mais irritante para os chineses é a demanda sobre sua política econômica. Trump quer que Pequim pare de dar subsídios via programa “Made in China 2025” para uma série de setores que o governo chinês identificou como estratégicos, desde robótica a veículos elétricos. A China tampouco está disposta a aceitar a demanda para que suas tarifas de importação não sejam mais elevadas que as alíquotas americanas aplicadas em produtos chineses. Tampouco se compromete em abrir seu mercado muito mais para investidores estrangeiros proximamente.
Hoje, a China atacará na OMC medidas unilaterais dos EUA: a medida da seção 232 com sobretaxas contra aço e alumínio, pela qual Pequim ameaça retaliar com sobretaxas valendo US$ 3 bilhões. Também criticará a decisão de Trump de impor sobretaxas como punição pelo que Washington vê como violação generalizada de direitos de propriedade intelectual. A China anunciou que retaliaria produtos americanos, incluindo soja, carros, químicos e aeronaves.
Por sua vez, o Brasil sugeriu ontem na OMC que os países explorem opções temporárias para evitar o risco de paralisia total do Orgão de Apelação.
A preocupação dos países aumenta com o impasse causado pelo bloqueio do governo de Donald Trump à nomeação de novos membros para o Orgão de Apelação. O diretor-geral da OMC, Roberto Azevêdo, já afirmou que a posição americana pode eliminar o papel da entidade como fórum para resolver disputas e levar a um efeito dominó de retaliações comerciais.
O Orgão de Apelação normalmente é formado por sete membros, mas só tem quatro atualmente operando, um a mais que o mínimo de três exigido para funcionar. Em setembro termina o mandato de outro juiz, Chekitan Servasing, das Ilhas Maurício.
Dezenas de países tem conclamado os EUA a enfim colocar na mesa o que desejam como reforma no Orgão de Apelação, em vez de minar gradualmente seu funcionamento, como vem fazendo na prática.
Em discurso ontem diante das outras delegações, o embaixador brasileiro Evandro Didonet considerou crucial lançar o processo de seleção para preencher as vagas, sem atraso, no Orgão de Apelação. O Brasil mesmo tem um candidato, o embaixador José Alfredo Graça Lima.
Em paralelo, o Brasil se diz pronto a discussões sobre qualquer questão específica sobre o funcionamento do mecanismo. E acredita que, diante de uma solução permanente que não virá tão cedo, opções temporárias devem ser examinadas com urgência.
Em meio a ameaças de guerra comercial, o representante brasileiro destacou que a preservação e reforço do sistema multilateral de comércio deve ser a prioridade imediata. Apesar de reconhecer circunstâncias desfavoráveis, o Brasil defende também a retomada do pilar negociador na OMC, com ênfase em agricultura, subsídios ao setor pesqueiro e questões de desenvolvimento.

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