Compra da Sky abre novos horizontes para Comcast

Foi pouco depois de 4 de julho do ano passado, quando os americanos comemoraram mais uma vez sua independência, que os executivos da Comcast começaram a pensar em fazer uma oferta de compra pela Sky.
Brian Roberts, diretor-presidente da Comcast, sabia que a empresa criada por
seu falecido pai Ralph tinha de reforçar a presença no exterior. A Comcast é a
maior operadora de TV a cabo e fornecedora de serviços de banda larga dos
Estados Unidos, mas não tem exposição internacional. Ocorre que o mercado
americano está ficando maduro. A penetração da TV paga nos EUA é muito
alta, ao contrário do que ocorre na Europa, e o “corte dos fios” – o
cancelamento das assinaturas de serviços a cabo e por satélite – tem desestabilizado os modelos de negócios no país.
A Sky, uma das poucas provedoras de TV paga e banda larga com escala em toda a Europa, parecia uma boa aposta. A empresa inaugurou a era da TV paga no Reino Unido, quase 30 anos atrás, quando foi lançada por Rupert Murdoch.
Os problemas financeiros iniciais quase levaram o magnata da mídia à falência. Mas a combinação de direitos esportivos exclusivos e filmes – além de acréscimos posteriores, como serviços móveis e de banda larga – transformaram a Sky em uma das mais valiosas empresas britânicas.
O dinheiro da Sky revolucionou a Premier League, transformando-a em uma marca mundial, e sua inovação tecnológica atraiu admiradores do outro lado do Atlântico. A expansão europeia, e a fusão com as operações da Sky na Itália e na Alemanha, deram à companhia sólida presença no continente.
O crescimento da Sky nos últimos anos conquistou uma multidão de admiradores, e quando Roberts e seus colegas começaram a pensar na compra da Sky, a empresa já era alvo de uma oferta de compra apresentada pela 21st Century Fox, de Murdoch. Ao ter fracassado, anos antes, em sua primeira oferta para comprar 100% da Sky, retirada em meio ao escândalo de um grampo telefônico envolvendo um de seus tabloides, Murdoch tentava pela última vez reconquistar o controle da empresa que abriu em 1989.
Mas a tentativa de Murdoch atolou em problemas regulatórios. A direção da Comcast começou a se perguntar, naquele terceiro trimestre de 2017, se a empresa poderia se tornar uma compradora alternativa.
Foram necessários meses para que esse interesse se cristalizasse. O catalisador ocorreu em novembro, quando Murdoch assombrou o mundo da mídia com um plano para desmembrar seu império de entretenimento, vendendo à Walt Disney seu estúdio de cinema, seus canais de TV a cabo e a participação de 39% que detinha na Sky.
Roberts, um competitivo jogador de squash, entrou em ação. Montou uma proposta concorrente pelos ativos da Fox, para depois retira-la e se concentrar unicamente na Sky.
Essa persistência rendeu frutos no fim de semana, quando, após três rodadas de lances, a Comcast foi declarada a vencedora de um leilão pela Sky, ao derrotar um lance concorrente, da Fox, apoiado pela Disney.
Roberts e seus principais assessores passaram o sábado numa sala de reuniões no hotel “The Stafford”, que fica a uma curta distância dos escritórios da Robey Warshaw, o banco de investimento que assessorou a Comcast.
O negócio recebeu lances da Comcast e da Disney-Fox por meio de um portal seguro na internet. Nas duas primeiras rodadas houve pouco movimentação, com as concorrentes oferecendo aumentos de “apenas” centavos sobre o preço das ações, de 14,75 libras esterlinas, de acordo com principal oferta feita pela Comcast no leilão, diz uma pessoa a par do processo. “Eles queriam manter seu poder de fogo para a rodada final”, disse outra pessoa.
E, naquela rodada final, quando os dois ofertantes fizeram suas ofertas melhores e derradeiras, o lance da Comcast, de 17,28 libras esterlinas por ação, venceu o da Disney-Fox, de 15,67 libras. A oferta da Disney surpreendeu alguns envolvidos, por ter sido feita abaixo do preço de mercado das ações da Sky, que haviam subido para 15,85 libras esterlinas nas semanas que antecederam o leilão.
Mas a Disney tinha uma cifra em mente e não estava preparada para superá-la ou para se sobrecarregar com excessos de dívidas na batalha pela Sky, de acordo com outra pessoa informada sobre a disputa.
Perder a disputa de lances significa uma sorte inesperada para a Disney, que vai receber uma participação na Sky como parte da aquisição, por US$ 71 bilhões, dos ativos de entretenimento de Rupert Murdoch – presumindo que Disney resolva vender a participação, como parece provável.
Entre os ativos da Fox que a Disney vai adquirir está uma participação de 39% na Sky que, ao preço de oferta da Comcast, valem atualmente 11,8 bilhões de libras esterlinas (US$ 15,3 bilhões). “A Disney terá de aceitar, como prêmio de consolação, que a posição da Fox na Sky acabe valendo muito mais do que quando a Disney concordou originalmente em comprá-la”, escreveu o analista Brian Wieser, da Pivotal Research, em nota.
O que a Comcast vai fazer com a Sky? A companhia americana tem um modelo de negócios semelhante ao da Sky, baseado tanto conteúdo quanto em distribuição. “A Comcast vai examinar a Sky e ver um negócio verticalmente integrada como o deles […]”, diz Mike Darcey, ex-diretor operacional da Sky.
Roberts não tem grandes planos de mudar a Sky e disse admirar o que Murdoch e o filho do bilionário, James, presidente do conselho de administração da Sky, conquistaram. “Eles construíram uma coisa magnífica”, disse o executivo ao “Financial Times”.
Mas a saída dos Murdoch da TV paga na Europa encerra uma era. A era Roberts na Sky está para começar.

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