‘Agências de publicidade não podem culpar a tecnologia’

A transição para o mundo digital e a competição com empresas de tecnologia têm feito o mercado de publicidade passar por dificuldades nos últimos anos. Mas, a culpa pelos problemas enfrentados pelo setor não deve ser atribuída apenas a essas mudanças. As agências têm sua parcela de culpa. “O mercado se tornou muito fragmentado, complexo e caro, o que fez com que os clientes buscassem outras alternativas”, diz John Seifert, presidente mundial da agência Ogilvy, que pertence ao grupo britânico WPP.
“É muito fácil culpar a tecnologia e as plataformas. Mas se você tem um bom produto, você tem aceitação”, completa Seifert, que esteve em São Paulo nesta semana e concedeu entrevista ao Valor.
Para o executivo, as agências precisam simplificar suas estruturas e mudar a forma de atuação, deixando de olhar apenas os objetivos tradicionais da comunicação e estar mais atreladas aos resultados dos clientes. “Por 20 anos o mercado cresceu com o mote de vender mais para o cliente. Mas eles não querem gastar mais. Você tem que vender melhor e de forma mais eficiente”.
Ele citou como o exemplo um de seus principais clientes, a Unilever. Na divulgação do balanço de 2017, em fevereiro, a Unilever informou que havia trazido para dentro da empresa a produção de parte de seus anúncios publicitários. Com isso, conseguiu reduzir em 30% seus gastos com agências.
No comando da Ogilvy desde 2016, Seifert vem adotando medidas que tentam colocar a agência nesse caminho. Cargos e funções, por exemplo, foram redefinidos para alinhar os negócios e evitar sobreposições. A ideia, segundo ele, é deixar a operação interna mais fluida.
De acordo com Seifert o processo de reestruturação, ou de refundação da agência, como ele tem chamado, caminha dentro do esperado. A expectativa é que esteja concluído em dois anos. “Na minha cabeça, sempre tive um horizonte de cinco anos, que costuma ser o prazo que um processo desse tipo leva para ser concluído”, diz. Ele diz esperar, no entanto, que o prazo seja mais curto. “Apesar de ser velho, ainda quero fazer muita coisa. Quero jogar golfe, ficar com meus netos”, brinca o executivo, que tem 60 anos.
Para ele, cinco dos principais mercados onde a companhia atua têm potencial para, sob a nova estrutura, “puxar” o crescimento da Ogilvy: Índia, China, Estados Unidos, Reino Unido, Austrália e Brasil.
A WPP, maior grupo de publicidade do mundo, não divulga os números individuais de suas operações. A estimativa é que a Ogilvy tenha uma receita anual na faixa de US$ 1 bilhão.
Ontem, a WPP divulgou os resultados do trimestre encerrado em setembro. A receita do terceiro trimestre caiu 1,5% e o mercado esperava um crescimento de 0,4%. O descompasso fez as ações negociadas na Bolsa de Londres despencarem. Acabaram fechando em queda de quase 14%. A WPP ainda revisou para baixo a perspectiva para o ano.
Questionado sobre o desempenho do novo presidente da WPP, Mark Read, que assumiu o posto em setembro deste ano depois da saída de Martin Sorrell, fundador do grupo, Seifert afirma que o executivo tem “um entendimento profundo” do que precisa ser feito, mas precisa de um pouco de tempo para colocar o grupo no caminho do crescimento sustentável. Read fez um mea culpa.
“Claramente tivemos um desempenho inferior ao dos concorrentes no trimestre. Não posso esconder a realidade”, disse Read, em teleconferência com analistas, segundo a Dow Jones. “Acredito que existam questões no mercado, mas as razões para isso são internas”, acrescentou.
O temor é que o plano de recuperação dos negócios apresentado por Read possa levar mais tempo que o esperado para apresentar resultados. Read disse acreditar que o grupo pode voltar a crescer mesmo diante de um cenário de competição acirrada, perda de contas e contratos de valores menores. Um dos passos nesse sentido é reduzir o tamanho da companhia, vendendo alguns de seus ativos. A WPP vai vender uma fatia da empresa de pesquisa Kantar, com valor de mercado estimado entre € 3 e € 4 bilhões.

https://www.valor.com.br/empresas/5950135/agencias-nao-podem-culpar-tecnologia#

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