Manifestações de 7 de Setembro, um depoimento e alguns conceitos jornalísticos

Por Tiago Pereira Andrade

1 – Depoimento: “Desci na estação de metrô da Consolação na Avenida Paulista, pois lá havia combinado de me encontrar com um grupo de estudantes indignados, assim como eu. Ao subir as escadas rolantes, mal dava pra ver o outro lado da avenida pois a multidão a tomava por completo, com gritos de ordem ou de revolta, misturando partidaristas políticos, anarquistas, gente assustada, gente bebendo cerveja, alguns paquerando, e um grupo com lenços nos rostos com vinagres nas mochilas, flanelas, socos ingleses e pedras.

Parecia que muitos nem sabiam o que estavam fazendo ali, e os grupos pouco se entendiam, pois enquanto alguns jovens jogavam pedras nas redes de lanchonetes e nas portas de vidro dos bancos, outras gritavam: “Sem violência!” . Foi quando chegou a tropa de choque, com bombas de efeito moral, gás lacrimogênio e balas de borracha, atacando e acertando quem estivesse em sua frente, independente de sexo, idade, se estava mascarado ou não. Alguns jornalistas da mídia independente foram presos e algumas pessoas ficavam cuidando dos ferimentos nas calçadas. Quando vi a cena de guerra, me retirei para a Alameda Santos para preservar minha integridade física.”

2 – Alguns conceitos jornalísticos: Ainda é recorrente a ideia de atribuir ao jornalismo, melhor dizendo, à mídia de massa em geral, a noção de Quarto Poder. Enquanto muitos associam esta ideia com uma manipulação midiática da sociedade, outros também colocam a imprensa como um vigilante social dos outros poderes. Teoricamente um dos pilares do jornalismo é o investigativo, baseado na denúncia quando há corrupção, deslizes, crimes e imoralidades. Outro conceito fundamental do jornalismo é o “Efeito do Real”, que de forma direta e objetiva nos conta que a representação da realidade é criada nos fatos que viram notícia. Se passou no Jornal Nacional, com certeza aconteceu! Além de jogar outros fatos não noticiados na obscuridade do esquecimento ou da dúvida, a notícia passa a impressão que a narração da realidade é imparcial ou neutra, como se o narrador, o editor, o repórter, o diretor, os patrocinadores, a história e a política não tivessem influência nem interesse no backstag.

Articulando as duas ideias é indutivo pensar que a conclusão dos raciocínios é: Estou querendo dizer que a mídia manipula as notícias das manifestações desde junho até na festa da Independência de 7 de Setembro. Poderia ser isso, não fossem algumas considerações: O primeiro depoimento narrado, ocorreu comigo no primeiro semestre de 1997 em uma manifestação contra o Decreto n. 2.208 baixado pelo governo federal que reformava o ensino profissionalizante, e que acabou se encontrando com outra passeata que pedia o calote da dívida externa com o Fundo Monetário Internacional – FMI e contra a associação do Brasil a Associação Livre de Comércio nas Américas – ALCA. Na minha concepção não há nada de novo nas manifestações ocorridas em junho de 2013, ou em 1997, ou em qualquer outra em que vivi, tanto pela pouca objetividade dos participantes, como pelo uso exacerbado da violência pela polícia, ou até o papel central da juventude neste processo.

Sendo assim, o que mudou para que as manifestações de junho ganhassem tanta ênfase? Porque houve tanto temor por parte de alguns com as manifestações que prometiam ser as maiores do Brasil em 7 de setembro? Aí entram os conceitos jornalísticos já aqui explicitados. O Quarto Poder também está sendo vigiado, pelos denunciantes das Redes Sociais. O Efeito do Real, agora não é só pautado pelo jornal da 20:00 ou pelo apresentador Datena, mas também por vídeos do youtube ou depoimentos nos facebook, e fingir que isso não existe seria dar um tiro no pé. Vídeos  podem ser feitos com celulares, mostrando tratamentos rudes contra civis que podem ser denunciados até para a Comissão Internacional de Direitos Humanos, além de também filmar estratégias policiais pouco inteligentes, como de quebrar o vidro da própria viatura para culpar manifestantes.

Foram estas denúncias feitas por pessoas ordinárias que transformaram as manifestações de centenas em manifestações de milhões em junho.

Mas o tempo passou, e a mídia de massa notou e compactuou com a opinião pública pautada nas redes sociais, assim como fizeram os políticos e até a polícia militar. Todos mudaram suas estratégias. Agora policiais que jogam spray de pimenta na multidão, tomam suspensão e são julgados. Os candidatos exaltam as manifestações dizendo que apoiam todas as causas. A mídia chegou ao ponto de transmitir as manifestações no programa da Ana Maria Braga em preto e branco ao som de “Alegria Alegria” de Caetano Veloso.

Mas e as manifestações de 7 de Setembro? Bem, meu amigo, eu sei, e se você viu o jogo da seleção brasileira, ou algum trecho de jornal nesse final de semana, você sabe que mesmo de forma fraca, elas continuam, assim como elas nunca deixaram de existir. Se antes eram muitos manifestantes, agora sobraram poucos, que, com uma tática de manifestação violenta pouco atraente – black blocs – acabam eliminando a possibilidade de interesse de novos ou velhos adeptos.

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